O quinto discute-se assim. – Parece que o pecador deve corrigir o delinquente.
1. – Pois, ninguém, por causa do pecado que cometeu, fica escusado de cumprir o preceito. Ora, a correção fraterna é objeto de preceito, como se disse Logo, por causa do pecado cometido não se deve preterir essa correção.
2. Demais. – A esmola espiritual vale mais que a corporal. Ora, quem está em pecado não deve por isso deixar de dar esmola corporal. Logo e com maior razão, não deve deixar, por um pecado precedente, de corrigir o delinquente.
3. Demais. – A Escritura diz: Se dissermos que estamos sem pecado, nós mesmos nos enganamos. Se pois por causa do pecado, ficamos impedidos da correção fraterna, não haverá ninguém que possa corrigir o delinquente. Ora, isto é inconveniente. Logo, também o é a primeira suposição.
Mas, em contrário, Isidoro diz. Não deve corrigir os vícios dos outros o que esta sujeito a vícios; e o Apóstolo. No mesmo em que julgar a outro, a ti mesmo te condenas, porque fazer essas mesmas coisas que julgas.
SOLUÇÃO. – Como já dissemos, a correção do delinquente incumbe a quem está no juízo reto da razão. Ora, o pecado, conforme ficou demonstrado, não priva do bem da natureza, de modo tal que o pecador perca o bom uso desse juízo. E sendo assim, pode-lhe caber a repreensão de outrem.
Contudo o pecado precedente põe um obstáculo a essa correção por três razões. - A primeira: o pecado precedente torna o pecador indigno de corrigir a outrem. E sobretudo, se cometeu um pecado maior, não é digno de corrigir a quem o cometeu menor. Por isso, aquilo do Evangelho: - Porque vês tu a aresta, etc. diz Jerônimo: Refere-se aqueles que, tendo incorrido em crime mortal, não permitem pecados menores nos irmãos. Segundo, torna-se indevida a correção por causa do escândalo dela resultante, se o pecado do corredor for manifesto; porque é claro, então, que quem corrige não o faz com caridade, mas antes, por ostentação. Por isso, àquilo do Evangelho Como dizes a teu irmão, etc, - explica Crisóstomo. Com que propósito? Por ventura para salvares o teu próximo, com caridade? Não, porque antes te salvarias a ti. Logo queres, não salvar os outros, mas, com a boa doutrina, ocultar os teus maus atos e receber dos homens o elogio da tua ciência.
Terceiro, por causa da soberba de quem corrige que, tendo em pouco os pecados próprios, se prefere, no seu coração, a si mesmo, como se fosse justo, ao próximo, julgando-lhe o pecado com austera severidade. Por isso, diz Agostinho: Acusar os vícios é dever dos varões bons e benévolos; pois, quando os maus o praticam, fazem o papel daqueles, E por isso, ele próprio ainda o diz, no mesmo lugar: Quando a necessidade nos obrigar a repreender alguém, reflitamos, se se trata de um vício tal que nunca tivemos, que somos homem e poderíamos tê-lo tido. Ou que é um vicio tal que já tivemos e, de presente, não temos; e então, não percamos a memória da comum fragilidade, para fazermos a correção, não com ádio, mas com misericórdia. Se porém, nos encontrarmos no mesmo vício, não repreendamos, mas gemamos juntamente e convidemos o pecador à penitência comum.
Ora, daqui se conclui claramente, que se o pecador corrigir com humildade o delinquente, não peca, nem se expõe à nova condenação; salvo se, agindo assim, pareça condenável à consciência do irmão, ou pelo menos, à sua, quanto a pecado passado.
Donde se conclui clara a RESPOSTA ÀS OBJEÇÕES.