O sexto discute–se assim. – Parece que os outros seis preceitos do decálogo estão inconvenientemente formulados.
1. –– Pois, não basta, para a salvação, deixarmos de fazer mal ao próximo; mas é preciso pagarmos o que lhes devemos, conforme aquilo do Apóstolo: Pagai a todos o que lhes é devido. Ora, os seis últimos preceitos só proíbem fazer mal ao próximo. Logo, os referidos preceitos foram inconvenientemente formulados.
2. Demais. – Os referidos preceitos proíbem homicídio, o adultério, o furto e o falso testemunho. Ora, podemos causar ao próximo muitos outros males, como está claro no que já foi estabelecido. Logo, parece que esses preceitos foram mal formulados.
3. Demais. – A concupiscência pode ser compreendida em dois sentidos, Como um ato da vontade, no sentido da Escritura: O desejo da sabedoria conduz ao reino eterno. Ou como um ato da sensualidade, no sentido de um outro lugar da Escritura. Donde veem ás guerras e contendas entre vós? Não veem elas das vossas concupiscências, que combatem em vossos membros? Ora, nenhum preceito do decálogo proíbe a concupiscência da sensualidade. porque, se o fizesse, os nossos primeiros movimentos, que contrariam um preceito do decálogo, seriam pecados mortais. E também nenhum proíbe a concupiscência da vontade, porque esta em todos se acha incluída. Logo, entre os preceitos do decálogo inconvenientemente foram formulados certos, proibitivos da concupiscência.
4. Demais. – O homicídio é mais grave pecado que o adultério ou o furto. Ora, não foi feito nenhum preceito proibitivo do desejo de homicídio. Logo, também inconvenientemente se fizeram certos preceitos proibitivos do desejo de furto ou de adultério.
Mas, em contrário, a autoridade da Sagrada Escritura.
Solução. – As partes da justiça nos mandam pagar as dívidas, que devemos a certas e determinadas pessoas, a que nos obrigamos por alguma especial razão. Assim também a justiça propriamente dita nos manda pagar o que em geral devemos a todos. Por isso, depois dos três preceitos relativos à religião, que nos mandam cumprir os nossos deveres para com Deus; e depois do quarto preceito, o da piedade filial, pelo qual cumprimos o nosso dever para com os pais e que inclui todas as obrigações fundadas em alguma razão especial, era necessário, por consequência, que se estabelecessem certos preceitos concernentes à justiça propriamente dita, que nos manda cumprir os nossos deveres em geral para com todos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Estamos sujeitos ao dever geral de não fazermos mal a ninguém. Por isso, os preceitos negativos, que nos proíbem os males gerais, que poderíamos causar ao próximo, deviam estar entre os preceitos do decálogo. Quanto, porém às coisas que devemos fazer aos próximos, são diversas e concernem a diversos. Por isso, os decálogo não se deviam incluir preceitos afirmativos, nessa matéria.
RESPOSTA À SEGUNDA. – Todos os males que podemos causar ao próximo podem se reduzir aos proibidos pelo preceito em questão, como aos que são mais comuns e mais principais. Pois, entende–se que todos os danos, que podemos causar à pessoa do próximo, estão proibidos pela proibição do homicídio, como o mais principal. Os que, porém fizermos a uma pessoa chegada, e sobretudo de modo libidinoso, entendem–se como proibidos simultaneamente com o adultério. Quanto aos danos feitos contra os bens. entendem–se proibidos simultaneamente com o furto. E os pecados da língua, como a detração, a blasfémia e outros, entendem–se proibidos com a proibição do falso testemunho, que contraria mais diretamente à justiça.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Pelos preceitos proibitivos da concupiscência não se entende proibido o primeiro movimento delas, circunscrito nos limites ela sensibilidade. Mas entende–se proibido diretamente o consentimento da vontade num ato ou num prazer.
RESPOSTA À QUARTA. – O homicídio, em si mesmo, não move a concupiscência, mas antes lhe repugna, porque não tem em si nenhum bem . Ao passo que o adultério implica o bem deleitável: como o furto, o útil. Ora, por si mesmo, o bem é desejável. Por isso, havia necessidade do um preceito especial proibitivo do desejo do homicídio.