O primeiro discute–se – assim. – Parece que a prodigalidade não se opõe à avareza.
1. – Pois, os contrários não podem coexistir num mesmo sujeito. Ora, certos são ao mesmo tempo pródigos e avarentos. Logo, a prodigalidade não se opõe à avareza.
2. Demais. – Os contrários se referem a um mesmo objeto. Ora, a avareza, enquanto oposta liberalidade, tem por objeto certas paixões que nos fazem afeiçoados ao dinheiro. Mas, parece que a prodigalidade não tem por objeto nenhuma das paixões da alma; assim, não faz ter amor ao dinheiro nem a nada de semelhante. Logo, a prodigalidade não se opõe à avareza.
3. Demais. – O pecado se especifica principalmente pelo fim como se estabeleceu. Ora, parece que a prodigalidade sempre se ordena a algum fim ilícito com o qual nos faz gastar os nossos bens, e sobretudo com os prazeres, e por isso diz o Evangelho: Dissipou toda a sua fazenda, vivendo dissolutamente. Logo, parece que a prodigalidade mais se opõe à temperança e à insensibilidade do que à avareza e à liberalidade.
Mas, em contrário, o Filósofo considera a prodigalidade oposta à iliberalidade, a qual aqui chamamos avareza.
SOLUÇÃO. – Na ordem moral consideramos a oposição dos vícios entre si e à virtude, conforme o excesso e o defeito. Ora, a avareza e a prodigalidade diferem por excesso e por defeito, de diversos modos. Assim, o avarento peca por excesso amando as riquezas mais do que devia; ao contrário, peca o pródigo por defeito cuidando delas com menor solicitude do que devia. Quanto aos bens externos, é próprio da prodigalidade exagerar os dons e pecar por defeito no adquirir e conservar; ao contrário, é próprio da avareza pecar por defeito ao dar, e por excesso, no adquirir e conservar. Por onde, é claro que a prodigalidade se opõe à avareza.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Nada impede os contrários terem o mesmo sujeito, mas em pontos de vista diversos. Pois, uma coisa recebe a sua denominação, sobretudo do que tem de principal. Ora, assim como o que tem de principal a liberalidade, a qual ocupa o meio termo, é o dar, a que se ordenam o adquirir e o conservar, assim também, na avareza e na prodigalidade o que sobretudo se leva em conta é o dar. Por isso, o que é excessivo em dar se chama pródigo; e o que peca por defeito ao fazê–lo, avarento. Mas, pode acontecer que um, às vezes, peque por defeito ao dar, sem, contudo ser excessivo em adquirir, como ensina o Filósofo. Do mesmo modo, também pode acontecer que dê excessivamente, sendo por isso pródigo, e ao mesmo tempo peque por excesso no adquirir. Quer levado de alguma necessidade, por lhe faltarem bens próprios, por causa do exagero com que dá, e ser assim obrigado a adquirir indebitamente – o que constitui a avareza; ou também por causa da desordem da alma, pois, não dando em vista do bem, não lhe importa, por um como desprezo da virtude, donde e de que modo adquira. Por isso, não é pródigo e avarento, pela mesma razão.
RESPOSTA À SEGUNDA. – A prodigalidade diz respeito às paixões do dinheiro, não por excesso delas, mas, por defeito.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Os pródigos nem sempre são excessivos em dar, por prazer, o que é o objeto da intemperança; mas às vezes tem uma tal disposição que os leva a não se importarem com as riquezas; e outras vezes, por outros motivos. Mas, como frequentemente caem na intemperança, quer por não temerem, já que gostam superfluamente com outras cousas, gastar também com os prazeres, aos quais inclina sobretudo a concupiscência da carne; quer também porque, não achando o prazer no bem das virtudes, entregam–se aos prazeres do corpo. E por isso o Filósofo diz, que dos pródigos, muitos se tornam intemperantes.