O sexto discute–se assim. – Parece mais louvável e meritório fazer lima obra sem voto do que por voto.
1. – Pois, diz Próspero: Devemos nos abster ou jejuar de modo que não nos sujeitemos à necessidade de jejuar a fim de não virmos a praticar um ato voluntário, sem devoção e obrigadamente. Ora, quem faz voto de jejuar sujeita–se a fazê–Io necessariamente. Logo, seria melhor jejuasse sem voto.
2, Demais. – O Apóstolo diz: Cada um como propôs no seu coração, não com tristeza, nem como por força; porque Deus ama ao que dá com alegria. Ora, certos cumprem com tristeza o voto que fizeram, o que parece ,resultar da obrigação que ele impõe, pois, a obrigação contrista, como diz o Filósofo. Logo, é melhor fazer obras sem voto do que por voto.
3. Demais. – O voto é necessário para nos confirmar a vontade na coisa prometida, como já se estabeleceu. Ora, nada é mais capaz de nos confirmar a praticar um ato do que a prática atual dele. Logo, não é melhor fazer um ato por voto do que sem ele.
Mas, em contrário, àquilo da Escritura Fazei votos e cumpri–os, diz a Glosa: Fazer voto é conselho da vontade. Ora, o conselho tem por objeto um bem melhor. Logo, é melhor fazer uma obra por voto do que sem ele. Porque quem a faz sem voto, cumpre apenas o conselho de a fazer e quem a faz com voto, cumpre dois – o de fazer voto e o de o cumprir.
SOLUÇÃO. – Por três razões fazer uma obra por voto é mais meritório do que fazê–Ia sem voto. – Primeiro, porque fazer voto é ato de latria, como se disse, que é a principal dentre as virtudes morais. Ora, o ato de virtude mais nobre é melhor e mais meritório. Por onde, o ato de uma virtude interior é melhor e mais meritório por ser imperado por uma virtude superior, cujo ato se realiza pelo império; assim ato de fé ou de esperança é melhor quando imperado pela caridade. Por onde, os atos das virtudes morais, como jejuar, que é um ato de abstinência, e conter–se, que é um ato de castidade, são melhores e mais meritórios quando praticados por voto. Porque, então, sendo como que sacrifícios a Deus, já pertencem ao culto divino. Por isso Agostinho diz; a virgindade, que a continência da piedade favorece e conserva, é honrada, não como virgindade, mas enquanto dedicada a Deus. – Segundo, porque quem faz um voto e o cumpre, sujeita–se mais a Deus, que quem apenas age, sem voto; pois, se lhe sujeita, agir, porque renuncia à faculdade de proceder de outro modo. Assim como daria mais quem desse uma árvore com os frutos, do que quem desse só os frutos, conforme diz Anselmo (Eadmero). Por onde, dão–se graças também aos que prometem, segundo dissemos. – Terceiro, porque pelo voto a vontade se confirma imovelmente no bem. Ora, praticar um ato com a vontade confirmada no bem, nisso consiste a perfeição da virtude, como está claro no Filósofo; do mesmo modo que pecar com espírito obstinado agrava o pecado, que se chama então pecado contra o Espírito Santo, como dissemos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – O lugar citado deve ser entendido da necessidade de coação, que causa o involuntário e exclui a devoção. Por isso O autor diz sinaladamente: A fim de não virmos a praticar um ato voluntário, sem devoção e obrigada/mente. Ora, a necessidade do voto vem da imutabilidade da vontade; por isso, confirma a vontade e aumenta a devoção. Portanto, a objecção não coíbe.
RESPOSTA À SEGUNDA. – A necessidade de coação, enquanto contrária à vontade, causa a tristeza, segundo o Filósofo. Mas, a necessidade imposta pelo voto, naqueles que estão bem dispostos, por terem a vontade confirmada no bem, não causa a tristeza, mas, a alegria. Por isso diz Agostinho: Não te arrependas de teres feito voto, antes, alegra–te por já não te ser lícito o que t' o seria em detrimento teu. Contudo, se uma obra, em si mesma considerada, nós a praticassemos triste e involuntariamente, por nos termos ligado pelo voto, ainda assim, contanto que conservemos a vontade de o cumprir, a obra é mais meritória do que se a fizéssemos sem ele. Porque o cumprimento do voto é um ato de religião, virtude superior à abstinência, cujo ato é o jejum.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Quem pratica uma obra, sem voto, fica com a vontade imobilizada em relação a essa obra particular, e no momento mesmo em que a faz; mas a vontade não lhe fica completamente confirmada, para o futuro, como a do que fez o voto. Pois, este impôs à sua vontade a obrigação de fazer um ato já antes de o fazer e, talvez, a fazê–lo várias vezes.