O segundo discute–se assim. – Parece que o homem no estado de inocência era passível.
1. Pois, sentir é de certo modo sofrer. Ora, o homem no estado de inocência, era sensível. Logo, também passível.
2. Demais. – O sono é uma paixão. Ora, o homem no estado de inocência dormia, segundo a Escritura: Infundia pois o Senhor Deus, um profundo sono a Adão. Logo, era passível.
3. Demais. – A mesma Escritura acrescenta que tirou uma das suas costelas, Logo, era passível, ao menos pela ablação de uma das suas partes.
4. Demais. – O corpo do homem era mole, que é passivo, em relação ao duro. Ora, o corpo do primeiro homem sofreria se lhe viesse de encontro algum corpo duro. E, portanto, o primeiro homem era passível.
Mas, em contrário, se fosse passível seria corruptível, pois, a paixão, aumentada, altera a substância.
SOLUÇÃO. – Paixão tem duplo sentido. – Um próprio; e então se diz que sofre aquilo que é removido da sua disposição natural. Pois, a paixão é efeito da ação: ora, nas coisas naturais, os contrários agem e sofrem, entre si, removendo um ao outro, da disposição natural. – Noutro sentido, a paixão é tomada em comum, relativamente a qualquer imutação, mesmo que esta diga respeito à perfeição da natureza: assim, inteligir ou sentir é de certo modo sofrer. Ora, neste segundo sentido, o homem no estado de inocência era passível e sofria, tanto na alma como no corpo. Ao passo que no primeiro sentido da paixão era impassível, na alma e no corpo, e ainda, imortal. E podia, se persistisse sem pecado, livrar–se da paixão e da morte.
Donde se deduzem as RESPOSTAS ÀS DUAS PRIMEIRAS OBJEÇÕES. – Pois, sentir e dormir não tiram ao homem a sua disposição natural; mas ordenam–se para o bem da natureza.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Como já se disse antes, a referida costela estava em Adão, como princípio do gênero humano; assim como o sêmen nele está como princípio, pela geração. Assim pois como a emissão do sêmen não é acompanhada de paixão, que remova o homem da sua disposição natural, o mesmo se deve dizer da ablação da referida costela.
RESPOSTA À QUARTA. – O corpo do homem, no estado de inocência, podia ser preservado de modo a não sofrer nenhuma lesão proveniente de qualquer corpo duro. E isso, em parte, pela própria razão pela qual podia evitar as causas nocivas; e, em parte, pela divina providência, que o defendia de tal modo, que nada lhe ocorresse de improviso, que o ferisse.