(I Sent., dist. XL, q. 1, a. 1).
O segundo discute-se assim. — Parece que a predestinação algo atribui ao predestinado.
1. — Pois, toda ação produz uma paixão. Logo, se a predestinação é, em Deus, ação, deve ser nos predestinados, paixão.
2. Demais. — Orígenes comentando aquilo de S. Paulo (Rm 1, 4) - O que é predestinado, etc., diz: A predestinação concerne ao que não existe, mas a destinação, ao que existe. E Agostinho: A predestinação é a destinação de um ser que existe. Logo, a predestinação só é própria a algum ser que existe; e, portanto, atribui uma realidade ao predestinado.
3. Demais. — A preparação é uma realidade no preparado. Ora, a predestinação é a preparação dos benefícios de Deus, como diz Agostinho. Logo, a predestinação é uma realidade nos predestinados.
4. Demais. — O temporal não entra na definição do eterno. Ora, a graça, que é algo de temporal, entra na definição da predestinação; pois dizemos que a predestinação é a preparação da graça, nesta vida, e a da glória na outra. Logo, a predestinação nada tem de eterno. Portanto e necessariamente, não existe em Deus, em quem tudo é eterno, mas nos predestinados.
Mas, em contrário, diz Agostinho, que a predestinação é a presciência dos benefícios de Deus. Ora, a presciência não está no seu objeto, mas no presciente. Logo, também a predestinação não está nos predestinados, mas no predestinador.
Solução. — A predestinação não é uma realidade nos predestinados, mas somente no predestinador. Pois, como dissemos, faz parte da providência. Ora, a providência não está nas coisas que constituem o seu objeto, mas é uma razão existente no intelecto do provisor, segundo ficou estabelecido. Mas, a execução da providência, a que se chama governo, passivamente está nos governados e ativamente, no governador. Por onde, é manifesto, que a predestinação é uma certa razão da ordem de determinados seres para a salvação eterna, existente na mente divina. Porém, a execução dessa ordem incumbe aos predestinados, passivamente, e a Deus, ativamente. Pois, a execução da predestinação se chama vocação e glorificação, conforme a Escritura (Rm 8, 30): E aos que predestinou, a estes também chamou; e aos que chamou, a estes também glorificou.
Donde a resposta à primeira objeção. — As ações transeuntes à matéria exterior produzem uma paixão; assim, a calefação e a ação de cortar. Não porém as ações imanentes no agente, como inteligir e querer, segundo dissemos. E tal ação é a predestinação. Por onde, nada atribui aos predestinados; mas, a execução dela, transeunte às coisas exteriores, produz neles algum efeito.
Resposta à segunda. — Às vezes, a destinação é tomada como a missão real de alguém para um termo e neste sentido só tem destinação o que existe. Outras vezes, tem o sentido de missão, concebida mentalmente; e então se diz, que destinamos aquilo que com firmeza mentalmente propomos. E nesta acepção, diz a Escritura (2 Mc 6, 20): Eleazar resolveu (destinou) não admitir coisas ilícitas por amor da vida. E assim a destinação pode se referir ao que não existe. Contudo, a predestinação, em virtude da precedência, que importa, pode convir ao não existente como quer que deste se compreenda a destinação.
Resposta à terceira. — Há dupla preparação. Uma, a do paciente para sofrer, e essa, está no preparado. Outra, a do agente para agir, e essa está no agente. E tal é a predestinação, pela qual dizemos que um agente dotado de inteligência se prepara a agir, preconcebendo a razão da obra a realizar. E assim, Deus, concebendo a razão da ordem de alguns para a salvação, desde a eternidade preparou, predestinando.
Resposta à quarta. — Não é como existente, por essência, que a graça entra na definição da predestinação. Mas enquanto esta diz respeito à graça, como a causa ao efeito e o ato ao objeto. Donde não se conclui que a predestinação seja algo de temporal.