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Art. 3 — Se o batismo de João conferia a graça.

 O terceiro discute-se assim. — Parece que o batismo de João conferia a graça. 

1. — Pois, diz o Evangelho: Estava João batizando no deserto e pregando o batismo de penitência para a remissão de pecados. Ora, a penitência e a remissão dos pecados só é possível pela graça. Logo, o batismo de João conferia a graça.
 
2. Demais. — Os que iam ser batizados por João confessavam os seus pecados como se lê no Evangelho. Ora, a confissão dos pecados tem por fim a remissão deles, que se opera pela graça. Logo, o batismo de João conferia a graça.
 
3. Demais. — O batismo de João se aproximava do de Cristo, mais que a circuncisão. Ora, a circuncisão remetia o pecado original. Pois, como diz Beda, na vigência da lei antiga, a circuncisão era o mesmo remédio salutar contra o ferimento do pecado original, que o batismo costuma ser no regime da lei da graça. Logo, com maior razão, o batismo de João conferia a remissão dos pecados. O que não pode dar-se sem a graça.
 
Mas, em contrário, o Evangelho: Eu na verdade vos batizo em água para vos trazer à penitência. Lugar que Gregório assim explica numa homília: João batiza não pelo espírito mas pela água, porque não podia perdoar os pecados. Ora, a graça, pela qual o pecado é delido, vem do Espírito Santo. Logo, o batismo de João não conferia a graça.
 
SOLUÇÃO. — Como dissemos, toda a doutrina e ação de João era preparatória para a de Cristo; assim como é próprio de um ministro ou de um artífice inferior preparar a matéria para a forma a ser infundida pelo artífice principal. Ora, a graça devia ser conferida aos homens por Cristo, segundo àquilo do Evangelho: A graça e a verdade foi trazida por Jesus Cristo. Logo, o batismo de João não conferia a graça, mas só preparava para ela, de três modos. Primeiro, pela sua doutrina João induzia os ouvintes à fé de Cristo. Segundo, acostumava-os ao rito do batismo. Terceiro, pela penitência, preparava os homens a receberem o efeito do batismo de Cristo.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. Por essas palavras de Beda pode entender-se um duplo batismo. Um, que João conferia, chamado batismo de penitência, porque de certo modo induzia à penitência e era uma como afirmação pela qual os homens confessavam que haviam de fazer penitência. Outro é o batismo de Cristo, pelo qual os pecados são perdoados; esse, João não o podia ministrar, mas apenas o pregava quando dizia; Ele vos batizará no Espírito Santo.  Ou pode dizer-se que pregava o batismo da penitência, isto é, inducente à penitência, a qual leva os homens ao perdão dos pecados.  Ou pode dizer-se, que pelo batismo de Cristo, como explica Jerônimo, é dada a graça pela qual os pecados são gratuitamente perdoados; o que porém se consuma pelo Esposo é iniciado pelo paraninfo, isto é, por João. Por isso, diz que batizará e pregará o batismo de penitência para a remissão de pecados; não que ele próprio o consumasse, mas porque começava, preparando.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Essa confissão dos pecados não se fazia com o fim de o perdão deles ser logo conferido pelo batismo de João; mas de ser conseguido pela penitência consequente, e pelo batismo de Cristo, para o qual essa penitência preparava.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — A circuncisão foi instituída como remédio do pecado original. Mas para tal não foi instituído o batismo de João, que era só preparatório para o batismo de Cristo, como se disse. Ora, os sacramentos produzem o seu efeito de acordo com a força da sua instituição. 
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