O quarto discute-se assim. ─ Parece que o fogo do juízo final purificará também os céus superiores.
1. ─ Pois, a Escritura diz: Os céus são obras das tuas mãos; eles perecerão, mas tu permaneces. Ora, também os céus superiores são obras das mãos de Deus. Logo, perecerão na conflagração final do mundo.
2. Demais. ─ A Escritura diz: Os céus ardentes se desfarão e os elementos com o ardor do fogo se fundirão. Ora, os céus distintos dos elementos são os céus superiores, onde estão fixas as estrelas. Logo, parece que também eles serão purificados pelo fogo do juízo.
3. Demais. ─ A ação desse fogo consistirá em remover dos corpos a indisposição para a glória. Ora, no céu superior há uma indisposição causada tanto pela culpa ─ pois aí pecou o diabo ─ como por uma deficiência natural. Assim, aquilo do Apóstolo ─ Sabemos que todas as criaturas gemem e estão com dores de parto até agora ─ diz a Glosa: Todos os elementos exercem laboriosamente as suas funções; assim como o sol e a lua não é sem custo que ocupam os espaços que lhes foram demarcados. Logo, também os céus superiores serão purificados pelo fogo do juízo.
Mas, em contrário, os corpos celestes não são susceptíveis de nenhuma impressão estranha.
2. Demais. ─ Aquilo do Apóstolo ─ Em chama de fogo para tomar vingança ─ diz a Glosa: O fogo precursor da vinda do Supremo Juiz abrasará o mundo e ocupará o mesmo espaço aéreo ocupado pelas águas do dilúvio. Ora, as águas do dilúvio não subiram até os céus superiores, mas só quinze côvados acima do cume dos montes, como lemos na Escritura. Logo, os céus superiores não serão purificados pelo fogo do juízo final.
SOLUÇÃO. ─ A purificação do mundo terá por fim remover dos corpos a imperfeição contrária à perfeição da glória, que será a perfeição última deles. E essa disposição todos os corpos a tem, mas cada um a seu modo. Assim, certos tem uma disposição de alguma maneira inerente à sua substância; tal os corpos terrestres que, misturando-se uns com os outros, perdem a pureza própria. Outros corpos porém tem uma disposição em nada inerente à substância deles; tais os corpos celestes, que nada tem de repugnante à perfeição última do universo, senão o movimento, que é uma via para a perfeição. Nem é o movimento deles qualquer, mas só o movimento local, que não lhes introduz nenhuma alteração intrínseca, como a da substância, da quantidade ou da qualidade; mas só a mudança local, que é extrínseca. Por onde, a substância do céu superior não precisa ser privada de nada, bastando apenas cessar-lhe o movimento. Ora, a cessação do movimento local não se faz por ação de nenhum agente contrário, mas só por cessar o movimento do motor. Portanto, os corpos celestes não serão purificados nem pelo fogo nem pela ação de nenhuma criatura; mas, em lugar de purificação, apenas cessarão de mover-se por assim o determinar a vontade divina.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Como expõe Agostinho, as palavras do salmo citado devem entender-se dos céus aéreos, a serem purificados pelo fogo da última conflagração. ─ Ou devemos responder que, aplicadas aos céus superiores, significam que perecem, quanto ao movimento que atualmente executam.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Pedro explica a que céu se refere. Pois, antes tinha dito: Os céus e a terra, agora existentes, purificados antes pela água, serão de novo, por decreto do mesmo Verbo divino, purgados pelo fogo no dia de juízo. Logo, aqueles céus serão purificados pelo fogo, que antes o foram pelas águas do dilúvio; e esses são os céus aéreos.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Essa pena e essa servidão da criatura, atribuídas por Ambrósio aos corpos celestes, não são mais que as vicissitudes dos movimentos, que os tornam sujeitos ao tempo, e a privação da perfeição última, que finalmente hão de ter. Demais, o céu empíreo em nada ficou contaminado com a culpa dos demônios, pois daí foram expulsos logo depois do pecado.