O terceiro discute-se assim. ─ Parece que a lei de Moisés permitia repudiar a mulher.
1. Pois, um modo de consentirmos é não impedir o que poderíamos impedir. Logo, não tendo Moisés proibido o repúdio da esposa, sem pecar, assim procedendo, porque a lei é santa, na expressão do Apóstolo ─ parece que permitiu o repúdio.
2. Demais, ─ Os profetas falavam por inspiração do Espírito Santo, como diz a Escritura. Ora, esta também diz: Quando tu lhe vieres a cobrar aversão, despede-a. Logo, como o Espírito Santo não inspira nada de ilícito, parece que o repúdio da mulher nem sempre foi ilícito.
3. Demais. ─ Crisóstomo diz, que assim como os Apóstolos permitiram as segundas núpcias, assim Moisés permitiu o libelo de repúdio. Ora, as segundas núpcias não são pecado. Logo, nem o repúdio da mulher, sob a lei de Moisés.
Mas, em contrário, diz o Senhor, que o libelo de repúdio foi dado aos judeus por Moisés, por causa da dureza do coração deles. Ora, essa dureza de coração não os escusava de pecado. Logo, nem a lei sobre o libelo de repúdio.
2. Demais. - Crisóstomo diz: Moisés, concedendo o libelo de repúdio, não quis revelar as exigências da justiça divina, mas tirar do pecado a culpa que ele implica, a fim de procedendo os judeus de acordo com a lei, por assim dizer, o pecado deles não fosse considerado tal.
SOLUÇÃO. ─ Nesta matéria duas são as opiniões. Uns dizem que aqueles que repudiavam; de acordo com a lei de Moisés, a esposa, depois de lhe ser mandado o libelo de repúdio, não ficavam isentos de pecado, embora ficassem escusados da pena a lhes ser infligida, segundo essa lei. Por isso se diz que Moisés permitiu o libelo de repúdio. E assim, distinguem quatro modos de permissão. O primeiro consiste em não ordenar; pois, quando não se ordena um bem maior entende-se permitido o menor; assim o Apóstolo, não prescrevendo a virgindade, permitiu o casamento. O segundo consiste na ausência de proibição; assim consideram-se permitidos os pecados veniais, quando não foram proibidos. O terceiro, na ausência de coibição; assim, todos os pecados se consideram permitidos por Deus se os não proibiu podendo fazê-lo. O quarto, na ausência de punição; e assim o libelo de repúdio foi permitido pela lei de Moisés; não a fim de ser conseguido um maior bem, como no caso da dispensa para casar com várias mulheres, mas a fim de coibir o maior mal do uxoricídio, a que os judeus eram inclinados pela depravação da potência concupiscível. Assim também lhes foi permitido exercer a usura para com os estrangeiros, pela corrupção da sua potência concupiscível, a fim de não na praticarem para com os próprios irmãos. E ainda, por causa da desordem que a suspeita introduz na parte racional, foi-lhes permitido o sacrifício do espírito de zelos, a fim de que uma simples suspeita não lhes alterasse o juízo.
Mas a Lei Velha, embora não conferisse a graça, contudo foi dada com o fim de fazer conhecer o pecado, como os Santos Padres geralmente o ensinavam. Por isso outros pensam que se, repudiando a esposa pecassem, ao menos deveriam disso ser advertidos pela lei e pelos profetas, segundo aquilo da Escritura: Anuncia ao meu povo as suas maldades. Do contrário, pareceriam demasiado negligentes, se nunca lhes anunciassem o necessário à salvação, deles ignorando o que não se pode admitir, porque pela justiça da lei, observada no tempo para que foi dada, mereciam a vida eterna. Por isso ensinam que, embora repudiar a esposa seja em si mesmo um mal, lícito contudo se tornava por divina permissão. E isso o confirma a autoridade de Crisóstomo, quando diz que o legislador, permitindo o repúdio, quis tirar ao pecado a culpa que ele implica. Mas, embora esta opinião seja provável, contudo a primeira é mais comumente defendida. Por onde, passamos a responder às objeções.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Quem pode proibir não peca, abstendo-se de fazê-lo por não esperar correção; ao contrário, julgando resultar um maior mal, procedente dessa proibição. Talo que se deu com Moisés. Por isso, apoiado na autoridade divina, não proibiu o libelo de repúdio.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Os profetas, inspirados pelo Espírito Santo, não disseram que a esposa podia ser repudiada por uma como ordem do Espírito Santo, mas como tendo-o este apenas permitido, a fim de evitar maiores males.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Crisóstomo não assimila sob todas suas formas essas duas permissões, mas só quanto à causa delas; pois ambas foram feita para impedir uma vergonhosa desordem.
RESPOSTA À QUARTA. ─ Embora a dureza de coração pão os escusasse do pecado, contudo os escusava a permissão fundada nessa dureza. Assim certas coisas se proíbem aos sãos, que se permitem aos doentes, sem que contudo estes pequem usando de tal permissão.
RESPOSTA À QUlNTA. ─ Um bem pode ser preterido de dois modos. ─ Primeiro, para se conseguir um maior bem, então a preterição do primeiro bem houve a sua honestidade no bem maior colimado, assim foi honestamente dispensado Jacó da lei que obrigara a uma só esposa, por causa do bem, que são os filhos. ─ De outro modo, um bem pode ser preferido para evitar um mal maior. E então, se quem assim proceder tinha autoridade para fazê-la, a preterição desse bem não implica nenhum modo, embora ainda não se torne por isso honesta. Assim a indissolubilidade do casamento foi preterida pela lei de Moisés para evitar o mal do uxoricídio. Por isso diz Crisóstomo, que Moisés quis tirar do pecado a culpa que ele implica. Pois embora o repúdio continuasse a ser uma desordem, pelo que, se chama pecado, não tinha contudo o reato da pena temporal nem eterna, por ser permitido por dispensa divina. E assim ficava isento de culpa. Por isso Crisóstomo acrescenta, no mesmo lugar, que foi permitido o repúdio, um mal por certo, contudo licito, Mas os defensores da primeira opinião não querem entender essas palavras então como significando, que não havia no repúdio o reato da pena temporal.