O quinto discute- se assim. ─ Parece que outrora era lícito ter concubina.
1. Pois, assim como ter uma só esposa, assim também não ter concubina é uma exigência da lei natural. Ora, outrora era permitido ter várias mulheres. Logo, também ter concubina.
2. Demais. ─ Não pode uma ser ao mesmo tempo escrava e mulher; donde o determinar a Lei; que o casamento de uma escrava por si mesmo a libertava. Ora, de certos homens amicíssimos de Deus, como Abraão e Jacó, refere a Escritura que tinham como concubinas, escravas. Logo, essas não lhes eram esposas. Portanto, antigamente era lícito ter concubinas.
3. Demais. ─ A mulher tomada como esposa não pode ser deitada fora, e o seu filho deve participar da herança. Ora, Abraão deitou fora Agar, e o filho dela não foi herdeiro. Logo, não era esposa de Abraão.
Mas, em contrário. ─ Atos contrários aos preceitos do Decálogo nunca foram lícitos. Ora, ter concubina é contra o preceito do Decálogo, que dispõe: não cometerás adultério. Logo, nunca foi lícito.
2. Demais. ─ Ambrósio diz: ao marido não é lícito o que não o é à mulher. Ora, nunca foi lícito a mulher separando-se do seu marido legítimo, ter relações com outro homem. Logo, também nunca e foi ao marido ter uma concubina.
SOLUÇÃO. ─ Ensina Rabi Moisés, que antes do tempo da lei, não era pecado a fornicação; e o conclui do fato de ter Judas tido congresso com Tamar. ─ Mas esta razão não é cogente. Pois, não é preciso que os filhos de Jacó sejam escusados de pecado mortal, eles que foram perante o pai acusados de um crime péssimo e consentiram na morte ou venda de José. Devemos, pois, pensar que, sendo contra a lei da natureza ter uma concubina, não ligada por matrimônio em nenhum tempo foi isso lícito, em si mesmo considerado, nem por dispensa. Pois, como do sobredito se colhe, o concúbito com mulher a que o homem não está unido pelo matrimônio não é um ato conveniente ao bem da prole, fim principal do matrimônio. Colide portanto com os princípios primários da lei natural, que não são susceptíveis de dispensa. Por onde, sempre que o Antigo Testamento refere, de certos que tinham concubinas, ficando contudo escusados de pecado mortal devemos entender que estavam unidos em matrimônio com mulheres chamadas contudo concubinas, porque eram em parte esposas e, em parte, concubinas. Pois, por isso mesmo que o matrimônio se ordena ao bem da prole, que é o seu fim principal, a mulher fica ligada ao marido por uma união perpétua, ou ao menos diuturna, como do sobredito se colhe; e nenhuma dispensa sofre esse vínculo. Mas pelo fim secundário do matrimônio, que é a manutenção da família e a assistência mútua, a mulher está unida do marido como companheira. O que não se dava com essas chamadas concubinas. Pois, esse fim secundário do matrimônio era susceptível de dispensa. Por isso, por participarem de certo modo da natureza da concubina, concubinas se chamavam.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Ter várias mulheres não colide com os preceitos primários da lei da natureza, como colide ter concubina. Por onde, a razão não colhe.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Os antigos Patriarcas, tendo dispensa para casar com várias mulheres, tinham vida com as escravas, com afeto marital. Pois, eram esposas, quanto ao fim primário do matrimônio; mas não quanto à outra união atinente ao fim secundário, a que se opõe a condição servil, pois não pode uma ser ao mesmo tempo companheira e escrava.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Assim como a lei de Moisés, por dispensa, permitia mandar libelo de repúdio, para evitar o uxoricídio, como diremos, assim, em virtude dessa mesma dispensa, foi lícito a Abraão deitar fora a Agar, para significar o mistério, a que o Apóstolo alude. Onde também diz que constitui um mistério o não lhe ser herdeiro dele o filho dela. Como também constitui mistério o fato de não ter sido herdeiro de Esaú o filho que teve com uma livre. E ainda, só como mistério se explica que fossem herdeiros de Jacó os filhos que teve de escravas e de livres, como ensina, Agostinho; porque a Cristo lhe nascem, pelo batismo, filhos, tanto pelos bons, que as livres significavam, como pelos maus ministros, simbolizados pelas escravas.