O primeiro discute-se assim. ─ Parece que não se devem distinguir várias ordens.
1. ─ Pois, quanto mais nobre é uma virtude tanto menos multiplicada é. Ora, o sacramento da ordem é mais nobre que os outros, porque constitui os que recebem em grau superior aos demais. Logo, como os outros sacramentos não se dividem em vários, que tenham uma denominação comum, também o da ordem não deve ser dividido em vários.
2. Demais. ─ Se se dividisse a ordem em várias, esta divisão seria ou a de um todo em suas partes integrantes ou em partes subjetivas. Ora, não em partes integrantes, porque então não receberiam elas a denominação do todo. Logo, será a divisão em partes subjetivas. Ora, as partes subjetivas recebem a sua denominação genérica no plural, tanto a do gênero próximo como a do remoto; assim, dizemos do homem e do asno, que são duas espécies de animais e de corpos animados. Logo, sendo o sacramento um como gênero, de que as ordens são as espécies, o sacerdócio e o diaconato, sendo ordens diferentes, são também sacramentos diferentes.
3. Demais. ─ Segundo o Filósofo, o regime em que um só governa é mais nobre que a aristocracia, na qual as várias funções públicas são desempenhadas por diversos. Ora, o governo da Igreja deve ser o mais nobre de todos. Logo, não devia haver nela distinção de ordens relativamente às diversas atividades delas, mas o poder deveria residir totalmente em um só sujeito. E assim, deveria ser a ordem uma só.
Mas, em contrário. ─ A Igreja é o corpo místico de Cristo, semelhante a um corpo natural, segundo o Apóstolo. Ora, os vários membros de um corpo natural tem cada qual a sua função. Logo, na Igreja deve haver diversas ordens.
2. Demais. ─ O Ministério do Testamento Novo é mais nobre que o do Velho, como diz o Apóstolo. Ora, no Testamento Velho, não só os sacerdotes, mas também os levitas, seus ministros, eram santificados. Logo, também não somente os sacerdotes do Testamento Novo, mas também os seus ministros, devem ser consagrados pelo sacramento da ordem.
SOLUÇÃO. ─ A variedade das ordens foi introduzida na Igreja por três razões. ─ Primeiro, para mostrar a sabedoria de Deus, que esplende sobretudo na ordenada variedade dos seres, tanto na ordem natural como na espiritual. Eis porque o texto sagrado refere, que a rainha de Sabá, vendo a ordem reinante entre os oficiais de Salomão, estava toda transportada, não cabendo em si de admiração pela sua sabedoria. ─ Segundo, para obviar à fraqueza humana; porque uma só ordem não poderia exercer sem grande gravame, tudo o concernente aos divinos mistérios. Por isso, são várias as ordens, correspondentes a ofícios diversos. O que é corroborado pelo fato de ter o Senhor dado como coadjutores a Moisés setenta anciãos os do povo. ─ Terceiro, para facilitar aos homens os meios do aperfeiçoamento espiritual, sendo vários os que exercem funções diversas de modo a serem todos cooperadores de Deus, não havendo ministério mais divino que esse, na expressão de Dionísio.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Os outros sacramentos são conferidos para deles colherem certos efeitos; ao passo que este nos é ministrado principalmente em vista de praticarmos certos atos. Por onde, o sacramento da ordem há de dividir-se conforme a diversidade dos atos, assim como pelos atos se diversificam as potências.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ A divisão, no caso vertente, não é a de um todo nas suas partes integrantes, nem a de um todo universal, mas a de um todo potencial. E da natureza deste é estar na sua essência total em uma das partes, tendo as outras uma certa participação dela. Ora, o mesmo se dá aqui. Pois, a plenitude total deste sacramento tem-na uma das ordens ─ o sacerdócio; as outras são participações dele. Tal o significado das palavras do Senhor ─ Tirarei do teu espírito e lh'o darei a eles para que sustentem comigo a carga do povo. Por onde, todas as ordens são um só sacramento.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Num reino, embora o poder na sua plenitude total resida no rei, não ficam porém excluídos os poderes dos ministros, que são umas participações do poder real. O mesmo se dá com a ordem. Ao passo que na aristocracia, a plenitude do poder não reside em ninguém, mas em todos.