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Art. 1 ─ Se a satisfação há de dar-se por obras penais.

O primeiro discute-se assim. Parece que a satisfação não há de dar-se por obras penais.
 
1. ─ Pois, a satisfação há de ser uma compensação pela ofensa a Deus. Ora, nenhuma compensação pode dar-se por meio de obras penais, porque Deus não se deleita com os nossos males. Logo, não é por obras penais que se há de dar satisfação.
 
2. Demais. Quanto maior a caridade donde procede uma obra, tanto menos penal ela é, pois, na caridade não há temor, como diz a Escritura. Se portanto, as obras satisfatórias hão de ser penais, quanto mais se inspirarem na caridade tanto menos satisfatórias serão. O que é falso.
 
3. Demais. Satisfazer, como diz Anselmo, é dar a honra devida a Deus. Ora, isso pode ser feito de outro modo que não por obras penais. Logo, a satisfação não há de fazer-se por obras penais.
 
Mas, em contrário, diz Gregório: Justo é que o pecador chore tanto mais os seus pecados pela penitência, quanto maior se fez mal a si mesmo por eles.
 
2. Demais. A satisfação deve curar perfeitamente a chaga do pecado. Ora, as penas são o remédio dos pecados. Logo, pelas obras penais é que devemos dar satisfação.
 
SOLUÇÃO. A satisfação concerne a ofensa passada, pela qual ela dá uma compensação; e também a culpa futura, da qual por ela nos preservamos. Ora, de ambos esses modos há de a satisfação dar-se por meio de obras penais. Assim, a compensação pela ofensa implica uma igualdade que há de ser entre o ofensor e a vítima da ofensa. Ora, a igualdade, na justiça humana, se produz subtraindo a quem tem mais do que o justo para adicionar a quem sofreu a subtração. Ora, embora a Deus, como tal, nada possa ser tirado, contudo o pecador, na medida do seu possível, subtrai-lhe alguma causa pecando, como se disse. Por onde, é necessário, a fim de haver compensação, que algo seja tirado ao pecador, pela satisfação, que redunda em glória de Deus. A obra boa porém, como tal, de nada priva ao seu autor, mas antes, o aperfeiçoa. Portanto, subtração não pode ser feita por uma obra boa, senão penal. E assim, para uma obra ser satisfatória, há de ser boa, para redundar em glória de Deus; e penal, para assim o pecador sofrer uma privação. Semelhantemente, a pena preserva da culpa futura, pois não facilmente voltamos a pecar desde que sofremos uma pena. Por isso, segundo o Filósofo, as penas são remédios.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. Embora Deus não se deleite com os nossos males, enquanto penas, deleita-se contudo com elas enquanto justas. E assim, podem ser satisfatórias.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. Assim como na satisfação se considera a penalidade, assim no mérito, a dificuldade. Ora, a diminuição da dificuldade relativa ao ato mesmo, diminui em igualdade de circunstâncias, o mérito; mas a diminuição da dificuldade relativa à presteza da vontade, longe de diminuir, aumenta o mérito. Semelhantemente, a diminuição da penalidade, quanto à presteza da vontade, produzida pela caridade, não diminui a eficácia da satisfação, mas a aumenta.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. O débito pelo pecado cometido é uma compensação da ofensa, que não vai sem pena para o pecador. E é a esse débito que se refere Anselmo.

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