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Art. 6 — Se o conhecimento intelectivo é derivado das coisas sensíveis.

(De Verit., q. 10, a. 6; q. 19, a. 1; Qu De Anima, a. 15; Quodl. VIII q. 2, a. 1; Compend. Theol., cap. LXXXI).
 
O sexto discute-se assim. ― Parece que o conhecimento intelectivo não é derivado das coisas sensíveis.
 
1. ― Pois, diz Agostinho, não se deve derivar a plenitude da verdade, dos sentidos do corpo. O que prova de duplo modo. Primeiro, porque tudo o que o sentido corpóreo atinge, sofre comutação, sem nenhuma intermissão de tempo; ora, o que não permanece não pode ser percebido. De outro modo, porque todas as coisas que sentimos pelo corpo, conservamos as imagens, mesmo quando já não estejam presentes aos sentidos; como se dá no sono ou na loucura. Ora, pelos sentidos, não podemos discernir se sentimos os próprios sensíveis ou se as falsas imagens deles. Ora, nada pode ser percebido se não for discernido do que é falso. Donde conclui que não deve derivar a verdade, dos sentidos. Ora, como o conhecimento intelectual é apreensivo da verdade, não se pode derivá-lo, dos sentidos.
 
2. Demais. ― Agostinho diz: Não é admissível que o corpo opere alguma coisa no espírito, sendo este como a matéria sobre a qual opera aquele; pois, de qualquer modo, o ser que opera é mais presente que o ser do qual jaz alguma coisa. Donde conclui que não é o corpo que opera no espírito a sua própria imagem, mas é o espírito que a causa em si mesmo. Logo, o conhecimento intelectual não é derivado dos sentidos.
 
3. Demais. ― O efeito não se estende para além da virtude da sua causa. Ora, o conhecimento intelectual, inteligindo o que o sentido não pode perceber, vai além dos sensíveis. Logo, o conhecimento intelectual não é derivado das coisas sensíveis.
 
Mas, em contrário, como o prova o Filósofo, o princípio do nosso conhecimento provém do sentido.
 
Solução. ― Os filósofos se repartiram em três opiniões, no tocante a este assunto. ― Assim, Demócrito dizia, que toda causa de qualquer conhecimento nosso está somente em que, dos corpos em que pensamos, provêm imagens que entram em as nossas almas, segundo refere Agostinho. E, como Aristóteles também refere, Demócrito ensinava que o conhecimento se opera por influições das imagens. E a razão desta opinião é que tanto Demócrito, como os antigos fisiólogos, não diferençavam o intelecto, do sentido segundo Aristóteles. E portanto, como o sentido é imutado pelo sensível, pensavam que todo o nosso conhecimento se faz só pela imutação causada pelos sensíveis. E essa imutação Demócrito a explicava pelas influições das imagens.
 
Platão porém, contrariamente, ensinava que o intelecto difere do sentido e é uma virtude imaterial, que não se serve, para o seu ato, de órgão corpóreo. E como o incorpóreo não pode ser imutado pelo corpóreo, concluía que o conhecimento intelectual não se faz pela imutação do intelecto, causada pelos sensíveis, mas sim pela participação das formas inteligíveis separadas, como já se disse. E também dizia ser o sentido uma virtude que opera por si mesma. Por onde, o próprio sentido, por ser uma virtude espiritual, não é imutado pelos sensíveis, mas sim os órgãos dos sentidos; por cuja imutação, a alma é, de certo modo, excitada de maneira a formar em si as espécies dos sensíveis. E parece que Agostinho alude a esta opinião quando diz: o corpo não sente; mas a alma, por ele, do qual usa, como de núncio, para formar em si mesma o que é anunciado, de fora. Assim, pois, segundo a opinião de Platão, nem o conhecimento intelectual procede do sensível, nem este, totalmente, das coisas sensíveis; mas, os sensíveis excitam a alma sensível para que sinta; e, semelhantemente, os sentidos excitam a alma intelectiva para que intelija.
 
Aristóteles, por fim, seguiu a via média. De um lado, admite com Platão, que o intelecto difere do sentido; mas, de outro ensina que o sentido não tem, sem comunicação do corpo, operação própria; de modo que sentir não é ato só da alma, mas do conjunto. E o mesmo doutrina em relação a todas as operações da parte sensitiva. Como, pois, não há inconveniência em que os sensíveis, exteriores à alma, causem alguma coisa no conjunto, Aristóteles concorda com Demócrito em que as operações da parte sensitiva são causadas pela impressão dos sensíveis no sentido; não, porém, por influição, como Demócrito ensinara, mas por uma operação. Pois Demócrito também ensinava que toda ação se dá por influição dos átomos, como se vê em Aristóteles. Porém, quanto ao intelecto, Aristóteles ensina que opera sem comunicação do corpo; pois, nada do que é corpóreo pode imprimir-se num ser incorpóreo. Por onde, para causar a operação intelectual, segundo Aristóteles, não basta só a impressão dos corpos sensíveis, mas se requer algo de mais nobre, porque o agente é mais nobre que o paciente, como ele mesmo o diz. Não porém a ponto tal que a operação intelectual Seja causada em nós só pela impressão das outras coisas superiores, como queria Platão; mas, aquele agente mais nobre e superior, a que chamou intelecto agente, e de que já tratamos, torna os fantasmas, recebidos dos sentidos, em inteligíveis atuais, por meio da abstração.
 
Ora, segundo esta doutrina, a operação intelectual, quanto aos fantasmas, é causada pelo sentido. Como porém os fantasmas não bastam para imutar o intelecto possível, mas é preciso que se tornem em inteligíveis atuais, por meio do intelecto agente, não se pode dizer que o conhecimento sensível seja a causa perfeita e total do conhecimento intelectual, mas, antes e de certo modo, a matéria da causa.
 
Resposta à primeira objeção. — Pelas palavras citadas, Agostinho quer dizer que a verdade não deve ser buscada totalmente, nos sentidos. Pois, é necessário o lume do intelecto agente para que conheçamos, imutavelmente, a verdade, nas coisas mutáveis, e discernamos as coisas mesmas, das sua semelhanças.
 
Resposta à segunda. ― Agostinho não se refere ao conhecimento intelectual, mas ao imaginário. E como, segundo a opinião de Platão, a virtude imaginária tem operação pertencente só à alma, Agostinho, para mostrar que os corpos não imprimem as suas semelhanças na virtude imaginária, o que é feito pela própria alma, usou da mesma razão de que usa Aristóteles para provar que o intelecto agente é algo de separado, a saber, que o agente é mais nobre que o paciente. E sem dúvida, é forçoso, segundo esta opinião, admitir, na virtude imaginativa, não só uma potência passiva, mas também uma ativa. Porém, se admitimos, conforme a opinião de Aristóteles, que a operação da virtude imaginativa pertence ao conjunto, desaparece toda dificuldade; pois, o corpo sensível é mais nobre que o órgão do animal, enquanto é comparado com este órgão como ser atual para o potencial, ao mesmo modo porque o colorido em ato se compara com a pupila, que é colorida em potência. ― Mas também se pode dizer que, embora a primeira imutação da virtude imaginária se realize pelo movimento dos sensíveis, por ser a fantasia um movimento sensível, contudo, há certa operação da alma, no homem, que, dividindo e compondo, forma as diversas imagens das coisas, mesmo as que não são recebidas dos sentidos. E nesta acepção podem-se admitir as palavras de Agostinho.
 
Resposta à terceira. ― O conhecimento sensitivo não é a causa total do conhecimento intelectual. Por onde, não é para admirar se estenda para além daquele.

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