(I Cont. Gent., cap. XLV; Comp. Theol., cap. XXXI; XXII Metaph., lect. XI).
O quarto discute-se assim. — Parece que o inteligir de Deus não é a sua própria substância.
1. — Pois, inteligir é uma operação. Ora, esta significa algo procedente do agente que opera. Logo, o inteligir de Deus não é a sua própria substância.
2. Demais. — Quando conhecemos pela reflexão o nosso ato de inteligir, não conhecemos nada de grande ou principal, mas algo de secundário e acessório. Ora, se Deus é o seu próprio inteligir, o seu ato de intelecção será como aquele pelo qual conhecemos, pela reflexão, o nosso ato de inteligir; e, assim, o inteligir de Deus não será de grande importância.
3. Demais. — Todo ato de inteligir consiste em inteligir alguma coisa. Ora, quando Deus se intelige a si mesmo, se não é diferente do seu ato de inteligir, intelige-se como inteligindo e como inteligindo que se intelige, e assim ao infinito. Logo, o inteligir de Deus não é a sua própria substância.
Mas, em contrário, diz Agostinho: Para Deus, ser é ser sábio. Ora, ser sábio, é inteligir. Logo, para Deus, ser é inteligir. Ora, o ser de Deus é a sua própria substância, como já se disse. Logo, o inteligir de Deus é a sua própria substância.
SOLUÇÃO. — É necessário admitir que o inteligir de Deus é a sua própria substância. Pois, se fosse diferente dela, seria necessário, como diz o Filósofo, que a substância divina tivesse o seu ato e a sua perfeição em algo dela diferente; e, para isso estaria a divina substância, como a potência, para o ato; o que é absolutamente, impossível, pois, inteligir é a perfeição e o ato do ser que intelige. Por onde, para explicar a questão de que tratamos, devemos considerar o seguinte. Como já dissemos, inteligir não é ato orientado para nada de exterior, mas, imanente no sujeito, como ato e perfeição do mesmo, porque o ser é a perfeição do que existe; pois, como o ser é consecutivo à forma, assim o inteligir é consecutivo à espécie inteligível. Ora, em Deus não há forma diferente do seu ser, como já dissemos. Por onde, como a sua essência mesma é também a espécie inteligível, conforme já dissemos, segue-se necessariamente, que o seu ato mesmo de inteligir é a sua essência e o seu ser.
E assim é claro, por tudo o que precede, que, em Deus, o intelecto que intelige, o objeto da intelecção, a espécie inteligível e o ato mesmo de inteligir são, absolutamente, uma só e mesma realidade. Por onde, é manifesto que, dizer que Deus é inteligente não introduz na sua substância nenhuma multiplicidade.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Inteligir não é uma operação transitiva para fora do agente, mas, nele imanente.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Inteligir que inteligimos, quando se trata de um ato de intelecção não-subsistente, não é ato de grande importância; tal é o caso, quando inteligimos o nosso ato de intelecção, em que não há semelhança com o inteligir divino, que é subsistente.
DONDE SE DEDUZ CLARA A RESPOSTA À TERCEIRA OBJEÇÃO. — Pois, o inteligir de Deus, subsistente em si mesmo, é relativo a Deus mesmo, e não, a qualquer outro ser, de modo que houvesse processo ao infinito.