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Art. 12 — Se podemos formar sobre Deus proposições afirmativas.

(I Sent., dist. IV, q. 2, a. 1; dist. XXII, a. 2, ad 1; I Cont. Gent., cap. XXXVI; De Pot., q. 7, a. 5, ad 2).
 
O duodécimo discute-se assim. — Parece que não podemos formar sobre Deus proposições afirmativas.
 
1. — Pois, diz Dionísio1, que as negações, sobre Deus, são verdadeiras, mas, as afirmações são inconsistentes.
 
2. Demais. — Boécio diz2, que a forma simples não pode ser sujeito. Ora, Deus é forma simples, por excelência, como já se demonstrou3. Logo, não pode ser sujeito. Ora, todo o ser sobre o qual podemos formar uma proposição afirmativa é tomado como sujeito. Logo, não podemos formar sobre Deus proposições afirmativas.
 
3. Demais. — Todo o intelecto, que compreende as coisas diferentemente do que elas são, é falso. Ora, Deus tem o ser sem nenhuma composição, como já se provou4. E, como todo intelecto, que afirmar alguma coisa, a intelige com composição, resulta que não podemos, verdadeiramente, formar sobre Deus proposições afirmativas.
 
Mas, em contrário, a fé não contém nada de falso. Ora, ela encerra certas proposições afirmativas, como: Deus é trino e uno, é onipotente. Logo, podemos formar, verdadeiramente, a respeito de Deus proposições afirmativas.
 
SOLUÇÃO. — Podemos formar, verdadeiramente, a respeito de Deus, proposições afirmativas. Para evidenciá-lo devemos considerar que, em qualquer proposição afirmativa verdadeira, é necessário que o predicado e o sujeito exprimam a mesma realidade, de certo modo, e coisas diversas, quanto à noção. E isto é claro, não só quanto às proposições em que a predicação é acidental, mas também em relação àquelas em que ela é substancial. Pois, é manifesto que — homem e branco — têm idêntico sujeito, mas representam noções diferentes; pois, uma é a noção de homem e outra, a de branco. E o mesmo se dá quando digo — o homem é um animal racional; pois, o homem é, em si mesmo e verdadeiramente, animal racional; porque o mesmo é o suposto da natureza sensível, em virtude da qual é chamado animal, e da natureza racional, em virtude da qual é chamado homem. Por onde, também neste caso, o predicado e o sujeito têm idêntico suposto mas, noções diversas. E ainda, isto mesmo se dá, de certo modo, com as proposições nas quais um sujeito é predicado de si mesmo; pois, então àquilo que a inteligência toma como sujeito ela o faz desempenhar o papel de suposto; e ao que toma como predicado dá a natureza de forma do suposto; e é isto que leva os lógicos a dizerem que os predicados são tomados formalmente e os sujeitos, materialmente. Ora, a esta diversidade racional corresponde a pluralidade de predicado e de sujeito; ao passo que a identidade real o intelecto a exprime pela composição mesma. — Ora, Deus, em si mesmo considerado, é absolutamente uno e simples; contudo, o nosso intelecto o conhece por meio de conceitos diversos, já que não pode vê-lo tal como em si mesmo é. Mas, embora o intelija sob noções diversas, sabe, contudo que a todas as suas noções corresponde um mesmo ser simples. Por onde, essa pluralidade racional ele o representa pela pluralidade de predicado e sujeito; e a unidade, por meio da composição.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Dionísio diz, que as afirmações sobre Deus são inconsistentes; ou inconvenientes, segundo outra tradução, porque nenhum nome lhe convém quanto ao modo de significar, como já dissemos5.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — O nosso intelecto não pode compreender as formas simples subsistentes, tais como elas em si mesmas são; mas, as apreende ao modo dos compostos, nos quais há um sujeito e o que a esse sujeito é inerente. Por onde, apreende a forma simples como se fosse sujeito e lhe atribui alguma coisa.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — A proposição — o intelecto que compreende as coisas diferentemente do que elas são é falso — tem duplo sentido, porque o advérbio diferentemente pode determinar o verbo compreende, em relação ao objeto compreendido, ou ao sujeito que compreende. No primeiro caso, a proposição é verdadeira e o seu sentido é: qualquer intelecto que compreende uma coisa diferentemente do que ela é, é falso. Ora, isto não se dá no caso vertente, porque o nosso intelecto, quando forma uma proposição sobre Deus, não diz que ele é composto, mas, simples. No segundo caso, porém, a proposição é falsa; pois, então, o modo pelo qual o intelecto compreende é diferente do pelo qual a coisa existe. Pois, é manifesto que o nosso intelecto intelige imaterialmente as coisas materiais que lhe são inferiores; não que as intelija como imateriais, mas, porque tem um modo imaterial de as inteligir. E, semelhantemente, quando intelige os seres simples, que lhe são superiores, intelige-os ao seu modo, como se fossem compostos, mas, sem pensar que sejam realmente compostos. E assim, o nosso intelecto não é falso, quando afirma em Deus alguma composição.
  1. 1. Cael. Hierar., cap. II.
  2. 2. De Trinit., cap. II.
  3. 3. Q. 3, a. 7.
  4. 4. Ibid.
  5. 5. Q. 13, a. 3.
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