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Art. 1 — Se um homem pode ensinar a outro.

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(II Sent., dist. IX, a. 2, ad 4; dist. XXVIII, a. 5. ad. 3; II Cont. Gent., cap. LXXV; De Verit., q. II a. I; Opusc. XVI, De Unit. Intell., cap. V).
 
O primeiro discute-se assim. — Parece que um homem não pode ensinar a outro.
 
1. — Pois, diz o Senhor, no Evangelho: Não queirais ser chamados mestres; ao que a Glossa de Jerônimo: Para que não atribuais aos homens a honra divina. Portanto, ser mestre é propriamente honra divina. Ora, ensinar é próprio do mestre. Logo, o
homem não pode ensinar, mas só de Deus isso é próprio.
 
2. Demais. — Um homem ensina causando, pela sua ciência, a ciência de outro. Ora, é por uma qualidade ativa que fazemos o que nos é semelhante. Donde se segue que a ciência é uma qualidade ativa, como o calor.
 
3. Demais. — A ciência requer o lume inte­ligível e a espécie da coisa inteligida. Ora, na­da disto um homem pode causar em outro. Logo, não pode, ensinando, causar a ciência de outro.
 
4. Demais. — O mestre age sobre o discí­pulo somente propondo-lhe certos sinais vocais ou gestos, para exprimir alguma causa. Ora, por sinais ninguém pode ensinar, causando em outro a ciência; pois, esses sinais são de coisas conhecidas ou desconhecidas. Se de conhecidas, aquele a quem são feitos já possui a ciência e, logo, não a recebe do mestre. Se de desconhe­cidas, tais sinais nada ensinam; assim, se al­guém propusesse, a um latino palavras gregas, cuja significação este ignora, não poderia en­siná-lo. Logo, ninguém pode, ensinando, cau­sar a ciência em outrem.
 
Mas, em contrário, diz o Apóstolo: Eu fui constituído pregador e Apóstolo, doutor das gentes na fé e na verdade.
 
Solução. — Sobre este assunto são várias as opiniões. — Assim, Averróis ensina que há um só intelecto possível para todos os homens, co­mo já se disse; donde resulta que todos têm a mesma espécie inteligível. E então, diz que um homem, ensinando, não causa em outro ciência diversa da que tem; mas comunica-lhe a mesma que tem, movendo-o a ordenar os fan­tasmas da sua alma, para que se disponham convenientemente à apreensão inteligível. E tal opinião é verdadeira, quanto a ser a ciência do mestre igual à do discípulo, considerando-se a identidade relativamente à unidade da coisa sabida; pois, a mesma verdade conhecem dis­cípulo e mestre. Mas, como já se viu, é falsa essa opinião quando ensina que todos os ho­mens têm o mesmo intelecto possível, e as mes­mas espécies inteligíveis só diferentes pela di­versidade dos fantasmas.
 
Outra é a opinião dos Platônicos, para os quais a ciência é ínsita, desde o princípio, nas nossas almas, por participação das formas sepa­radas, como já se disse; mas a alma, pela união com o corpo, fica impedida de considerar livre­mente aquilo de que tem ciência. E segundo esta opinião, o discípulo não recebe de novo, a ciência, do mestre; mas este o exercita na con­sideração daquilo de que já tem ciência; e en­tão aprender não é mais do que lembrar-se. Do mesmo modo, ensinam que os agentes naturais só dispõem para o recebimento das formas, que a matéria corpórea adquire por participação das espécies separadas. Mas, contra esta opi­nião já se estabeleceu antes, de conformidade também com Aristóteles, que o intelecto possí­vel da alma humana é potência pura, relativa­mente aos inteligíveis. E, portanto, deve-se, diferentemente e conforme Aristóteles, dizer que o mestre causa a ciência no discípulo, con­duzindo-o da potência ao ato. O que se evi­dencia considerando que, dos efeitos provenien­tes de um princípio exterior, uns procedem somente desse princípio; assim, a forma da casa é causada na matéria só pela arte. Outras po­rém procedem, ora de princípio exterior, ora, de interior; assim, a saúde é causada no enfer­mo, ora por um princípio exterior, a saber, a arte médica; ora, por um princípio interior, como quando alguém sara por virtude da natureza. Ora, em tais efeitos, a duas coisas se devem atender. Primeiro, que a arte, na sua operação, imita a natureza; pois, assim como esta cura um enfermo, alterando, digerindo e expulsando a matéria que causa a doença, assim também a arte. Segundo, o princípio exterior, que é a arte, não opera como agente principal, mas como coadjutor deste, que é o princípio interno, reforçando-o e ministrando-lhe os instrumentos e auxílios, de que se sirva a natureza para pro­duzir o efeito; assim, o médico reforça a natu­reza e lhe fornece os alimentos e remédios de que ela necessita para o fim a que tende. Ora, o homem adquire a ciência pelo princípio in­terno, como bem se vê naquele que a adquire por invenção própria; e pelo externo, como claramente o mostra quem aprende. Pois, é ínsito em cada homem um certo princípio de ciência, a saber, a luz do intelecto agente, pelo qual conhece, logo, inicial e naturalmente,cer­tos princípios universais de todas as ciências. Por onde, quando alguém aplica esses princí­pios universais a casos particulares, dos quais o sentido lhe ministram a memória e a experiên­cia, adquire, por invenção própria, a ciência do que ignorava, partindo do conhecido para o desconhecido. E assim, qualquer docente con­duz o discípulo, do que este conhece, para o que ignora, conforme Aristóteles, que diz, que toda doutrina e toda disciplina parte do conhe­cimento preexistente. Ora, o mestre conduz o discípulo, do conhecido ao desconhecido, de dois modos. Primeiro, ministrando-lhe certos auxílios ou instrumentos de que use o intelecto, para adquirir a ciência; assim, quando lhe propõe certas proposições menos universais, das quais entretanto o discípulo, pelo que sabe, pode julgar. Ou quando lhe propõe certos exemplos sensíveis — semelhantes, opostos, ou outros — pelos quais o intelecto do discente é le­vado ao conhecimento da verdade desconhecida. De outro modo, reforçando o intelecto do dis­cente, não por qualquer virtude ativa, como de natureza superior conforme já se disse quando se tratou da iluminação angélica — pois, todos os intelectos humanos são do mesmo grau, na ordem da natureza; mas, propondo a ordem dos princípios, relativamente às conclusões, ao discípulo, que talvez não tenha tal virtude re­flexiva, que possa, daqueles, deduzir estas. E, por isso, diz Aristóteles, que a demonstração é um silogismo, que faz saber; e assim, quem de­monstra faz o ouvinte saber.
 
Donde a resposta à primeira objeção. — Como já se disse, o mestre, ensinando, usa so­mente do ministério externo, como o médico, curando; mas assim como a natureza interior é a causa principal do sarar, assim o lume inte­rior do intelecto é a causa principal da ciência. E ambas essas coisas vêm de Deus. Por onde, assim como a Escritura diz de Deus — que sara todas as tuas enfermidades — assim, também diz — que ensina ao homem a ciência, enquanto o lume do seu rosto está gravado sobre nós, pelo qual todas as coisas nos são ensinadas.
 
Resposta à segunda. — O mestre não causa a ciência no discípulo, ao modo de agente na­tural, como objeta Averróis; por onde, não é necessário que a ciência seja uma qualidade ativa. Mas é o princípio pelo qual quem en­sina se dirige, assim como a arte e o princípio pelo qual se dirige quem opera.
 
Resposta à terceira. — O mestre não causa o lume inteligível no discípulo, nem diretamente as espécies inteligíveis; mas, com a sua doutrina, move-o a que forme, pelo intelecto, os conceitos inteligíveis, cujos sinais o mestre lhe propõe exteriormente.
 
Resposta à quarta. — Os sinais que o mes­tre apresenta ao discípulo, são de coisas conhe­cidas, universal e como confusamente, mas des­conhecidas em particular e como distintamente. Por onde, não se pode dizer que quem adquire a ciência por si mesmo a si mesmo se ensine, ou seja mestre de si, porque não tem preexis­tente a ciência completa, como se exige para mestre.

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