(Opusc. XXVIII, De Fato, cap. II, III).
O terceiro discute-se assim. — Parece que o fado não é imutável.
1. — Pois, diz Boécio: Assim como o intelecto está para o raciocínio; o que é, para o que é gerado; o tempo, para a eternidade; o círculo, para o ponto central; assim está a série mutável do fado para a estável simplicidade da providência.
2. Demais. — Como diz o Filósofo, quando nos movemos, move-se tudo o que está em nós. Ora, o fado é uma disposição inerente às coisas móveis, como diz Boécio. Logo o fado é imutável.
3. Demais. — Se o fado é imutável, as coisas que lhe estão submetidas se realizarão imutável e necessàriamente. Ora, as coisas atribuídas ao fado são as mais contingentes. Logo, nada haverá de contingente mas tudo se realizará necessariamente.
Mas, em contrário, diz Boécio: o fado é uma disposição imutável.
Solução. — A disposição das causas segundas, a que chamamos fado, pode ser duplamente considerada. Em relação a si mesmas, de tal modo, dispostas ou ordenadas, e em relação ao princípio primeiro, pelo qual são ordenadas que é Deus. — Ora, certos ensinam que a série mesma ou disposição das causas é em si necessária; de modo que tudo se realiza necessàriamente, porque qualquer efeito tem a sua causa e, posta esta, aquele necessàriamente se segue. Mas esta opinião é claramente falsa, em virtude do que já se disse. — Outros porém, contràriamente, dizem que o fado é mutável, mesmo no que depende da divina Providência. Por isso os Egípcios diziam que o fado pode ser mudado, por, certos sacrifícios, como refere Gregório Nisseno. Mas, esta opinião já foi excluída antes, porque repugna à imutabilidade divina.
E portanto deve-se dizer que o fado relativamente à consideração das causas segundas, é mutável; mas enquanto sujeito à divina Providência, participa da imutabilidade, não por necessidade absoluta, mas condicionada. Ê assim que consideramos esta condicional verdadeira ou necessária: Se Deus prevê que tal coisa há-de ser, ela será. Por onde, depois de ter dito que a série do fado é mutável, Boécio acrescentou, após poucas palavras: a qual, originando-se da imutável Providência, também há-de necessàriamente ser imutável.
Donde se deduzem as respostas às objeções.