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Art. 2 — Se numa mesma hierarquia há muitas ordens.

(II Sent., dist. IX, a. 3; IV, dist. XXIV, q. 2, a. 1, qª 2, a. 4).
 
O segundo discute-se assim. — Parece que numa mesma hierarquia não há muitas ordens.
 
1. — Pois, multiplicada a definição, multipli­ca-se o definido. Ora, a hierarquia, como diz Dionísio, é uma ordem. Se, portanto, são mui­tas as ordens, não haverá uma só, mas muitas hierarquias.
 
2. Demais. — Ordens diversas são graus di­versos; e os graus, nos seres espirituais, são cons­tituídos segundo os diversos dons espirituais. Ora, nos anjos, todos os dons espirituais são co­muns, porque nada entre eles se possui singularmente. Logo, não são diversas as ordens dos anjos.
 
3. Demais. — Na hierarquia eclesiástica dis­tinguem-se as ordens relativamente à purifica­ção, à iluminação e à perfeição. Pois, a ordem dos diáconos é purgativa; a dos sacerdotes, ilu­minativa; a dos bispos, perfectiva, como diz Dio­nísio. Ora, qualquer anjo purifica, ilumina e aperfeiçoa. Logo não há distinção de ordens, nos anjos.
 
Mas, em contrário, diz o Apóstolo (Ef 1, 21), que Deus constituiu Cristo homem acima de todo o prin­cipado, e potestade, e virtude, e dominação, que são as diversas ordens dos anjos; e certos, dentre eles, pertencem a uma mesma hierarquia, como a seguir se dirá (a. 6).
 
Solução. — Como já se disse (a. 1), uma hierar­quia é uma chefia, i.é., uma multidão ordenada, do mesmo modo, sob o governo de um chefe. Ora, não seria a multidão ordenada, mas con­fusa, se nela não houvesse diversas ordens. Lo­go, a noção mesma de hierarquia requer a diversidade das ordens, e esta é considerada relativa­mente aos diversos ofícios e atos. E isso bem se vê na cidade, em que são diversas as ordens, segundo os diversos atos; assim, uma é a ordem dos que julgam, outra, a dos que pugnam, outra, a dos que trabalham nos campos, e assim por diante. Mas, embora sejam muitas as ordens de uma mesma cidade, todas, contudo, podem re­duzir-se a três, por ter qualquer multidão perfeita princípio, meio e fim. Por onde, há trí­plice ordem de homens na cidade: uns são os supremos, como os nobres; outros, ínfimos, co­mo o baixo povo; outros, médios, como o povo honrado. Assim, pois, em qualquer hierarquia angélica, as ordens se distinguem segundo os di­versos atos e ofícios; e toda essa diversidade se reduz a três ordens: a suma, a média e a ínfima. E por isso, em cada hierarquia, Dionísio coloca três ordens.
 
Donde a resposta à primeira objeção. — Ordem se toma em dupla acepção. Numa, a or­denação, em si, compreendendo graus diversos; e, deste modo, diz-se que a hierarquia é uma or­dem. De outro modo, chama-se ordem a um mesmo grau; e assim, diz-se que há várias or­dens numa mesma hierarquia.
 
Resposta à segunda. — Na sociedade dos anjos, tudo é possuído em comum; contudo, uns possuem certas coisas de modo mais excelente que outros. Ora, o que pode comunicar o que possui tem posse mais perfeita que o que não o pode; assim é mais perfeitamente cálido o que pode aquecer, do que o que não pode; e sabe mais perfeitamente quem pode ensinar, do que quem não o pode. E quanto mais perfeito for o dom comunicado, tanto mais perfeito será o grau de quem o comunica; assim, no grau mais perfeito do magistério está quem pode ensinar a ciência mais elevada. E, de acordo com esta semelhança deve-se distinguir a diversidade dos graus ou das ordens dos anjos, segundo os di­versos ofícios e atos.
 
Resposta à terceira. — O anjo inferior é superior ao homem mais elevado, em a nossa hierarquia, conforme aquilo da Escritura (Mt 11, 2): O que é menor no reino dos céus, é maior do que ele, i. é, do que João Baptista, do qual entre os nascidos de mulher não se levantou outro maior. Por onde, o anjo menor da celeste hie­rarquia pode não só purificar, mas iluminar e aperfeiçoar, e de modo mais alto do que as ordens da nossa hierarquia. E assim pela distinção destes atos não se distinguem as ordens celestes, mas por outras diferenças deles.

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