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Art. 4 — Se a prudência é virtude diferente da arte.

(IIª-IIª, q. 47, a.4, ad 2; a. 5; De Virtut., q. 1, a. 12; VI Ethic., lect IV).
 
O quarto discute-se assim. — Parece que a prudência não é virtude diferente da arte.
 
1. — Pois, a arte é a razão reta de acordo com a qual fazemos certas obras. Ora, obras genericamente diversas não fazem com que uma arte deixe de o ser, pois há artes diversas que se ocupam com obras muito diversas. Ora, como também a prudência é uma certa razão reta das obras, parece que também ela deve ser considerada como arte.
 
2. Demais. — A prudência convém mais com a arte que os hábitos especulativos, pois tanto estes como aquela dizem respeito ao que se realiza contingentemente, como já se diss1. Ora, certos hábitos especulativos se chamam artes. Logo e com maior razão, a prudência deve ser considerada uma arte.
 
3. Demais. — É próprio da prudência aconselhar retamente, como já se disse2. Ora, também em certas artes, como a militar, a governativa e a medicinal, é preciso haver conselho3. Logo, a prudência não se distingue da arte.
 
Mas, em contrário, o Filósofo distingue a prudência da arte4.
 
SOLUÇÃO. — As virtudes se distinguem pelas noções diversas que elas realizam. Pois, como já se disse5, hábitos há que se fundamentam como virtudes só pelo darem a faculdade de obrar retamente, outros, porque não só dão essa faculdade, mas também o uso. Ora, a arte dá apenas a faculdade de obrar retamente, porque não diz respeito ao apetite. Ao passo que a prudência, não só dá a referida faculdade, como também o uso; pois, diz respeito ao apetite por lhe pressupor a retidão.
 
E a razão desta diferença é que a arte é a razão reta que nos dirige naquilo que produzimos; ao passo que a prudência é a razão reta que nos dirige quando agimos. Ora, produzir e agir diferem; pois, como se disse6, produzir implica um ato transitivo para a matéria exterior, como, edificar, cortar e outros; enquanto que agir implica um ato imanente no agente, como ver, querer e outros. Assim que, a prudência está para os atos humanos, consistentes no uso das potências e dos hábitos, como a arte está para o que produzimos exteriormente. Ora, a perfeição e a retitude do ato depende dos princípios que servem de base ao silogismo da razão; do mesmo modo que, como já dissemos7, a ciência depende do intelecto, que é o hábito dos princípios e o pressupõe. Ora, nos atos humanos, os fins desempenham o mesmo papel que os princípios nas ciências especulativas, como já se disse8. Por onde, a prudência, que é a razão reta, que nos guia nas nossas ações, exige estejamos bem dispostos em relação aos fins, o que se dá pelo apetite reto; e, portanto, ela também supõe a virtude moral, que torna reto o apetite. Ora, a bondade das obras da arte não é a do apetite humano, mas a dessas obras mesmas; e por isso a arte não pressupõe o apetite reto. E daí vem que o artífice que peca voluntariamente é mais digno de louvor que outro que o faz involuntariamente; ao contrário quem peca voluntariamente vai contra a prudência mais que quem o faz involuntariamente; porque a prudência exige, por essência, a retidão da vontade, o que não se dá com a arte. Por onde consta com clareza que a prudência é uma virtude distinta da arte.
 
Donde a resposta à primeira objeção. — Os diversos gêneros das coisas artificiais são todos exteriores ao homem, e por isso não diversificam a noção de virtude. Mas a prudência, sendo a razão reta dos próprios atos humanos, a diversifica, como dissemos.
 
Resposta à segunda. — A prudência convém mais com a arte que os hábitos especulativos, quanto ao sujeito e à matéria; pois ambas pertencem à parte opinativa da alma e dizem respeito ao que sucede contingentemente. Mas, pela noção de virtude, a arte convém mais com os hábitos especulativos, que com a prudência, como se disse.
 
Resposta à terceira. — A prudência aconselha com acerto sobre o pertencente à totalidade e ao último fim da vida humana. Enquanto certas artes aconselham apenas sobre o pertencente aos seus fins próprios. Por isso, os bons conselheiros em matéria bélica ou náutica, se consideram chefes prudentes ou pilotos e não simplesmente prudentes, como aqueles, e só esses, que aconselham sobre o pertencente à totalidade da vida.

  1. 1. VI Ethic. (lect. V).
  2. 2. VI Ethic. (lect. IV).
  3. 3. III Ethic. (lect. IV).
  4. 4. VI Ethic. (lect. IV).
  5. 5. Q. 57, a. 1; q. 56, a. 3.
  6. 6. IX Metaph. (lect. VIII).
  7. 7. Q. 57, a. 2, ad 2.
  8. 8. VII Ethic. (lect. VIII).
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