O oitavo discute-se assim. — Parece que Damasceno assinala inconvenientemente três espécies de ira: o fel, a mania e o furor.
1. — Pois, as espécies de nenhum gênero se diversificam por um acidente, Ora, o fel, a mania e o furor se diversificam acidentalmente, pois, chama-se fel o princípio do movimento da ira; a ira permanente chama-se mania; e por fim, o furor é a ira que se vinga num certo tempo. Logo, não são espécies diferentes de ira.
2. Demais — Túlio diz, que o arrebatamento se chama em grego, θυμός é uma ira que ora nasce e ora desaparece. Ora, θυμός, segundo Damasceno, é o mesmo que o furor. Logo, este não precisa de tempo para a vindicta mas se extingue com o tempo.
3. Demais — Gregório estabelece três graus na ira: a ira sem palavras, a ira acompanhada de palavras e a ira com palavras expressas, de conformidade com aquelas três partes do dito do Senhor no Evangelho (Mt 5, 22): o que se ira contra seu irmão, em que se refere à ira sem palavras; e depois acrescenta: e o que disser a seu irmão: Raca, onde toca na ira acompanhada da palavra, mas não ainda com sentido pleno; e depois acrescenta: e o que lhe disser a seu irmão: És um tolo, onde a palavra se completa pelo discurso perfeito. Logo, Damasceno dividiu insuficientemente a ira, não compreendendo nela nada do que se refere à palavra.
Mas, em contrário, é a autoridade de Damasceno e de Gregório Nisseno (Nemésio).
Solução. — As três espécies de ira, na divisão de Damasceno e também de Gregório Nisseno (Nemésio) se fundam naquilo que intensifica a ira. E isto pode dar-se de três modos. Primeiro, pela facilidade do movimento mesmo; e essa ira ele a denomina fel, porque se acende facilmente. Segundo, pela tristeza que causa a ira, que perdura muito tempo na memória; e esta pertence à mania, palavra derivada de permanecer. Terceiro, por aquilo que o irado deseja, a saber, a vindicta; e esta pertence ao furor, que não se aplaca enquanto não pune. Por onde o Filósofo chama a certos irados agudos, por se irarem prontamente; a certos outros, amargos, por conservarem a ira por muito tempo; e certos, enfim, difíceis, porque não descansam enquanto não punem.
Donde a resposta à primeira objeção. — Tudo aquilo que dá à ira algum complemento não se lhe refere acidentalmente. Donde, nada impede que nisso nos fundemos para especificá-la.
Resposta à segunda. — O arrebatamento, que Túlio introduz, parece antes pertencer à primeira espécie de ira, que se consuma com a prontidão desta, do que ao furor. Nada porém impede que o θυμός grego, que se chama em latim furor, importe numa e noutra coisa: a prontidão no irar-se e a firmeza de propósito em punir.
Resposta à terceira. — Os graus dessa ira se distinguem pelo efeito da mesma; não porém pela diversa perfeição do movimento mesmo da ira.