(III Sent., dist. XXVI, q. 1, a . 2).
O terceiro discute-se assim. — Parece que a ira tem a sua sede no concupiscível.
1. — Pois, como diz Túlio, a ira é uma espécie de desejo. Ora, o desejo, pertence ao concupiscível. Logo, também a ira.
2. Demais — Agostinho diz que a ira se transforma no ódio. E Túlio, no livro supra-citado, que o ódio é a ira inveterada. Ora, o ódio, como o amor, tem a sua sede no concupiscível. Logo, também a ira.
3. Demais — Damasceno e Gregório Nisseno dizem que a ira compõe-se da tristeza e do desejo. Ora, tanto este como aquele têm sua sede no concupiscível. Logo, também a ira.
Mas, em contrário. — A potência concupiscível é diferente da irascível. Se pois a ira pertencesse ao concupiscível, a potência irascível não tiraria dela a sua denominação.
Solução. — Como já dissemos, as paixões do irascível diferem das do concupiscível, por serem os objetos destas o bem e o mal absolutos; ao passo que os objetos daquelas são o bem e o mal acompanhados de certa dificuldade ou arduidade. Ora, como já dissemos, a ira visa dois termos: a vindicta que deseja, e a pessoa de quem quer tirá-la. E em ambos esses casos ela requer uma certa arduidade, pois o seu movimento não se manifesta senão com uma certa grandeza relativamente a esses dois termos; pois, como diz o Filósofo, às coisas nulas ou muito pequenas não lhes damos nenhum valor. Por onde é manifesto, que a ira não tem sua sede no concupiscível, mas, no irascível.
Donde a resposta à primeira objeção. — Túlio denomina desejo o apetite de qualquer bem futuro, sem levar em conta as condições de árduo ou não árduo. E, a esta luz, inclui a ira no desejo, como desejo que é da vingança. E assim o desejo é comum ao irascível e ao concupiscível.
Resposta à segunda. — Diz-se que a ira se transforma no ódio, não porque a mesma paixão, numericamente, que era antes ira, venha a ser, em seguida, quando inveterada, o ódio; mas, isso se dá em virtude da causalidade. Pois a ira, quando diuturna, causa o ódio.
Resposta à terceira. — Diz-se que a ira se compõe da tristeza e do desejo, não como partes, mas como causas. Pois, como já dissemos, as paixões do concupiscível são as causas das do irascível.