(III Sent., dist. XXVI, q. 1, a . 1).
O terceiro discute-se assim. — Parece que os brutos não têm esperança.
1. — Pois, a esperança é relativa a um bem futuro, como diz Damasceno. Ora, conhecer o futuro não pertence aos brutos, dotados só de conhecimento sensível, que não alcança o futuro. Logo, neles não há esperança.
2. Demais — O objeto da esperança é o bem que podemos adquirir. Ora, o possível e o impossível são diferenças da verdade e da falsidade, que só existem na inteligência, como diz o Filósofo. Logo, a esperança não existe nos brutos, desprovidos de inteligência.
3. Demais — Agostinho diz, que os animais se movem pelo que vêem. Ora, a esperança não se refere ao que é visto, como diz a Escritura (Rm 8, 24): porque o que qualquer vê, como o espera? Logo, não há esperança nos brutos.
Mas, em contrário. — A esperança é uma paixão do irascível. Ora, este existe nos brutos. Logo, também aquela.
Solução. — As paixões interiores dos animais podem ser depreendidas dos seus movimentos exteriores: e destes se deduz que há neles esperança. Assim, nem o cão se move para uma lebre, nem o gavião, para uma ave, que vêem muito distantes, como não esperando poder alcançá-las; se porém estiverem próximas, movem-se, como na esperança de as apanhar. Pois, como já dissemos, tanto o apetite sensitivo dos brutos, como o natural dos seres insensíveis, seguem a apreensão de algum intelecto, como se dá também com o apetite da natureza intelectiva chamado vontade. Mas a diferença está em que esta é movida pela apreensão do intelecto conjunto, ao passo que o movimento do apetite natural segue a apreensão do intelecto separado, que instituiu a natureza. E o mesmo se dá com o apetite sensitivo dos brutos, que também agem por um certo instinto natural. Por onde, nas obras dos brutos e dos demais seres naturais, manifesta-se um processo semelhante ao das operações da arte. E deste modo os brutos podem ter esperança e desespero.
Donde a resposta à primeira objeção. — Embora os brutos não conheçam o futuro, movem-se contudo por um instinto natural para algo de futuro, como se o previssem; e esse instinto lhes foi infundido pelo intelecto divino, que prevê o futuro.
Resposta à segunda. — O objeto da esperança é o possível não enquanto aspecto do verdadeiro, pois, em tal sentido, resulta da relação entre o predicado e o sujeito; mas, enquanto relativo a uma potência; e é assim que Aristóteles divide o possível nessas duas partes referidas.
Resposta à terceira. — Embora a vista não apreenda o futuro, contudo o que o animal vê de presente move-lhe o apetite a buscar ou evitar algo no futuro.