EÇA DE QUEIRÓS
"Nos romances de Eça de Queirós tudo é claro, tudo é visível e colorido. Como porém lhe falta o gênio de um Tolstoi ou de um Proust, essa claridade é mais um verniz do que uma radiação própria que venha de dentro das coisas. Sua luminosidade, em suma, é uma superficialidade. No que concerne ao jogo psicológico das situações dramáticas, essa visibilidade chega freqüentemente ate o mau gosto. O autor não deixa nada implícito, não supõe uma vida interior, e nem de longe imagina os abismos inconscientes da alma humana. Tudo se diz, tudo se explica e tudo se compreende (...)
O que torno a dizer dos romances de Eça de Queirós, com o acréscimo do que disse acima, é que seu enorme talento de descrever estava ligado a um talento menor de acompanhar os passos das humanas paixões"
("Na mesma língua em que chorou Camões", in O Desconcerto do Mundo)
EDUCAÇÃO
"Quem enlouqueceu, leitor, foi o mundo, sim, o mundo na sua efervescente pluralidade e majestosa rotundidade. Foi o mundo, a civilização, a época, o século - ou que outro nome lhe dêem; e um dos muitos efeitos dessa loucura, que reflui sobre os indivíduos na variada proporção da permeabilidade que encontra, está na idéia que atribui aos aparelhos institucionais, às máquinas de educar, o principal papel na formação dos valores humanos. Este erro funestíssimo é próprio de uma época gregária, cujos critérios pegajosos, colantes e massificantes sufocam e estrangulam as iniciativas pessoais, que desde São Tomás, e até desde Aristóteles, são o fator principal da formação dos veros valores da pessoa humana."
(Ensina-te a ti mesmo, Permanência, Jan/Fev de 1975)
EMPIRISMO
"O homem filosofa, ainda que freqüentemente filosofe mal. A existência do empirismo prova contra o empirismo. Se as teses do empirismo fossem verdadeiras, não existiria o empirismo. Se o materialismo fosse verdadeiro, o homem seguiria seu caminho sem se deter para apregoar o materialismo. A única filosofia que se pode apregoar com lógica é aquela que permite filosofar.
"Em resumo, o homem só pode negar a vida do espírito, embora com veemente falta de lógica, porque é espiritual; só pode negar a liberdade e a lei moral porque é livre."
(O Tecnicismo e suas Origens, in As Fronteiras da Técnica)
EROTISMO
"Estamos numa Guerra. A Guerra Mundial III. E contra quem? Contra o homem, contra a Imagem e semelhança de Deus.
"No Oriente a Guerra toma a forma de escravidão. No Ocidente, liberal, relaxado, entregue ao igualitarismo e ao mito da liberdade total; no Ocidente que deu à luz o que já se chama a "permissive society" - e que nós traduziríamos por "sociedade do vale tudo" - a Guerra toma a forma da liquefação e putrefação de todo o brio humano. Com violência aturdidora, espalha-se um furor de erotismo, uma febricitante promoção da sexualidade, degradante e destrutiva como se todas as energias humanas se concentrassem no mesmo propósito: levar o homem a descrer definitivamente de todos os seus títulos de transcendência e nobreza."
("A Escalada do Erotismo e a Censura", in Carta Mensal, julho de 1970)
"— Ó galata pouco inteligente! geme São Paulo. Ó leitor desatento! Gememos nós. Consideremos o espetáculo dos costumes que aflige tantas famílias, lembremos os casos de tantas e tantas moças que se transviam, que se perdem, que se prostituem, e que ainda respondem aos pais “que eles estão por fora e não entendem nada”.
"Pergunto eu: qual é o critério principal que norteia a vida dessas pobres moças embrutecidas? Todos proclamam: “é o hoje” é a “atualidade” unanimemente afinada pelo diapasão do orgulho que esmaga o 4° Mandamento, despreza Deus e diz aos moços que só eles são juizes de seus atos, como, com todas as letras, já foi dito num “catecismo” editado pela Sono-Viso, aprovado pela CNBB e evidentemente inspirado pelo Diabo.
"O inimigo evidente das pobres moças que se perdem é “o que todo mundo faz”, é o que se vê nos filmes, nas TV’s, ora, é esse gênio mau que Jesus chama “mundo”. E os jovens idiotas, quando pensam que estão sendo movidos por sua esplêndida e brilhante soberba, quando pensam que estão agindo livremente, COITADOS !!!, é justamente nesses arrebatamentos que estão sendo arrastados, puxados, levados para a sarjeta e para o prostíbulo pelo aparelho da perdição que Jesus chama “mundo” do qual Ele nos veio apartar, do qual nos veio salvar."
(Editorial da Revista Permanência, n° 76-77, Março-Abril de 1975.)
"E nós, herdeiros desse júbilo divino, devemos compreender que a dignidade humana mais depressa começa pelo decoro da veste do que pela conquista da Lua."
(Editorial Permanência, n°18, Ano III, Março de 1970.)
ESCRITOR
"Imagino que as pessoas alheias ao ofício julguem que a substância de um escritor é feita de mistura e da soma de outros escritores e que, assim sendo, caberia aqui um largo tópico onde eu discorresse sobre os livros que li e os autores que devorei. Parece-me todavia que um escritor mais se parece com uma salada do que com um panteão ou com uma academia. Salada de quê? De experiências, de cabeçadas, e sobretudo de malogros.
(Quando nasce o escritor? in Conversa em Sol Menor)
"Como pode o escritor ser escritor se não tiver o gosto supremo das mais finas exatidões? E como pode o escritor ser escritor, e lograr comunicação, se não possuir nos recôncavos da alma as ressonâncias, os abalos da terra, do chão, do rumor dos passos e descompassos das marchas e das danças?"
(Quando nasce o escritor? in Conversa em Sol Menor)
"Mas o escritor não nascerá somente da matéria que lhe dá corpo. Para que ele venha a nascer é preciso que dentro dele nasça a paixão violenta, invencível, de deixar sinais escritos, mots, words, vocábulos, sinais, língua. O escritor nascerá para escrever, para passar a vida pondo tudo o que viveu neste imperativo vital de respirar escrevendo ou neste veredicto de não respirar se não escrever."
(Quando nasce o escritor? in Conversa em Sol Menor)
ESPERANÇA
"Nossa esperança, senhores, vem de Deus mesmo. Não somos nós que a inventamos, que a deduzimos, que a fabricamos. Deus mesmo é quem no-la deposita na alma, com as outras virtudes teologais, a Fé e a Caridade, que é a maior. E nós sabemos, agora, que nosso Destino não é a força cega que empurrava o rei Édipo para o parricídio e para o incesto. Nós sabemos que as portas de nossos destinos abriram-se; sabemos que o Filho de Deus deitou-se sobre o abismo de dor e morte para que nós todos, um por um, pudéssemos passar por cima de seu corpo. Nós sabemos que uma festa está sendo preparada para nós, desde toda a eternidade, e, quando apuramos os ouvidos, conseguimos distinguir os ruídos desses preparativos...
"Quando éramos pequeninos, nas vésperas dos aniversários, ou das noites de Natal, ficávamos às vezes acordados na cama, nervosos, impacientes; e trocávamos olhares compreensivos com nossos irmãos, noite a dentro, ouvindo os passos, as vozes, os ruídos novos de objetos novos, e trocávamos olhares cheios de suposições, ouvindo a surda azáfama dos pais que povoavam nossa noite de mistérios e esperanças.
"Ora, nossa esperança de hoje, essa esperança teologal, parece-se muito com aquela esperança filial de antigamente. Nós sabemos, com a certeza da fé, que há uma festa preparada para nós, e sabemos, desde já, que os preparativos escondidos não nos estão inteiramente escondidos. Ouvimos sinos que batem, ouvimos passos em procissão, ouvimos, como um rio de amor, um murmúrio de orações - e sabemos que é aqui mesmo, aqui em baixo, aqui e agora, entre velas, cálices, e pães, que o Cristo Jesus e sua Mãe preparam, para nós!, as garantias da ressurreição..."
("O valor da vida", in As Fronteiras da Técnica)
"Bem sabemos, Senhor, que a beleza maior da Igreja, a beleza sem par, está guardada para o céu. Bem sabemos, Senhor, que aqui na jornada nossas alegrias são de esperanças e portanto de lágrimas. Mas não é só por nós mesmos, por nosso pobre irmão corpo que nos apegamos às alegrias deste chão tão doce de pisar, desta água tão bela de beber, deste sol que comemos com os olhos. Não é só por nós e para nós que rogamos um reflexo de esperança nas nossas pobres coisas, esta mesa, os livros, a casa lá dentro, a pobre família mal amada... não é só por nossa casa que rogamos uma beleza de vergel, uma largueza de mar, uma suavidade de jardim, é também, Senhor, para vossa Igreja que rogamos a beleza da terra. E perdoai-nos, Senhor, a fraqueza de nossa esperança..."
("Encruzilhada de Traições" in O Século do Nada)
ESTUDO
"Na vida do estudante temos a supervalorização da Universidade: os moços esperam demais da universidade. Sim, esperam receber dela não apenas uma iniciação, não apenas um aperfeiçoamento a ser continuado, mas quase a substância plástica de sua personalidade profissional.
"Abrem-se as torneiras das aulas e os estudantes se enchem daquela "matéria dada". Ora, nós sabemos que, ainda hoje, qualquer profissional que se destaca é quase totalmente um autodidata. Aprendeu sem dúvida alguma coisa nos bancos escolares, mas sobretudo aprendeu por iniciativa própria muitíssimo mais. Não contraponho aqui o estudo à prática da vida, como se costuma fazer num esquema convencional; contraponho o estudo escolar com o estudo por iniciativa própria, o estudo solitário, o estudo personalíssimo, que é o único capaz de formar elites criadoras de que o mundo precisa constantemente para seus repetidos emperros.
"Os moços de hoje acreditam demais na universidade, e acreditam de menos no valor próprio, no esforço próprio, e na fecundidade desse esforço procurado na solidão da alma. Nós sabemos há mais de mil anos que o agente principal da educação e do ensino é a atividade imanente do próprio educando, sabemos que o mestre, e portanto toda a universidade, é um agente ministerial secundário, mas os moços de hoje perderam essa noção que só é individualística na cabeça das pessoas que raciocinam com o ruído das palavras."
("O Valor Próprio", in A Tempo e Contratempo)
"Qualquer transmissão de experiência viva, qualquer magistério, só pode funcionar com o primado da palavra e por isso qualquer pedagogia tem de ser fundamentalmente passiva. Esse vocábulo é considerado hoje obsceno; mas para um cristão ele tem o mais elevado sentido e com ele afrontamos o ridículo do mundo, porque toda nossa vida consiste em ser compassiva."
(A Descoberta do Outro, pág. 176)
EUTANÁSIA
"Às vezes tentamos esse empreendimento de medir o que é incomensurável, e tomamos o metro da dor física para concluir que é melhor que morra o paciente se o pouco que lhe resta de vida está condenado ao sofrimento. A eutanásia é a ilógica conseqüência do excesso de lógica. Ela aconselha a matar baseada na certeza da morte próxima, e no direito sobre a dor. Ora, se a morte é próxima, porque abreviá-la? E qual é a diferença essencial entre o moribundo e um de nós? Se é por causa da dor qual é o critério, a medida, o grau centígrado de dor que perdoa ou condena? E quem poderá dizer o significado de cinco minutos de vida?"
("O valor da vida", in As Fronteiras da Técnica)
EVOLUCIONISMO
"Parece-nos indispensável marcar bem a intolerância em relação à Evolução dos evolucionistas, que tira o mais do menos, que faz passar a potência ao ato sem nada que esteja em ato, o que consiste precisamente em ser um processo autocriador que torna sub-repticiamente aceitável a criação “ex-nihilo” sem um Deus Todo Poderoso, desde que essa criação se torne infinitesimal e suficientemente lenta para que as inteligências tardas não percebam o mecanismo do absurdo, e fiquem, de tantos em tantos metros, ou de tantos em tantos séculos, diante de uma situação de fato.
"É preciso denunciar a absoluta inaceitabilidade do evolucionismo dos racionalistas e dos empiristas."
(As Descontinuidades da Criação, Ed. Permanência, 1992)