Michael J. Rayes
[Nota da Permanência: O leitor interessado no tema dos quatro temperamentos encontrará um estudo valioso publicado na Revista Permanência no. 270, à venda na nossa livraria]
Você está disciplinando dois dos seus filhos. Um deles está bem na sua frente com olhar firme na cara, ouvindo seu sermão e seu tom de voz ríspido. O outro está do seu lado e não consegue sequer olhar para você. Ele começa a chorar. Por que as crianças reagem de modo tão diferente à mesma coisa?
Talvez você já tenha lido sobre os quatro temperamentos. Mas o que isso tem a ver com você enquanto pai hoje? Como aplicar o conhecimento dos temperamentos ao seu estilo de educação? Talvez você já tenha uma ideia genérica de que não pode responder a cada filho da mesma maneira, mas modificar seu jeito para se adaptar às necessidades de cada um deles. No mundo real, como reagir do modo mais eficiente e caritativo a cada um de seus filhos?
Temperamento e personalidade
O que é o temperamento, afinal de contas? Temperamento é algo que alguém está inclinado a fazer devido ao modo como foi “programado” no nascimento. A personalidade combina o temperamento com o sexo, a educação (inclusive o ambiente familiar), a força de vontade interna, os hábitos adquiridos da pessoa e outros fatores externos e eventos na vida.
Então o temperamento é como você nasceu, mas a personalidade é o que você se torna. O temperamento é como você reage a algo. Você já percebeu que algumas pessoas são naturalmente agitadas, enquanto outras são naturalmente calmas? Isso é o temperamento.
Sua personalidade como um todo enquanto adulto é a combinação do temperamento com os outros fatores mencionados acima. Por exemplo, dois sanguíneos de 25 anos terão personalidades muito diferentes se um cresceu em Beverly Hills, e o outro no Afeganistão. A força de vontade também tem muito a ver com a personalidade de um adulto. Dois coléricos de 50 anos que viveram suas vidas inteiras na mesma cidade, na mesma cultura e no mesmo background familiar terão personalidades diferentes se um deles passou os últimos 30 anos, deliberadamente, tentando conter suas paixões e arranjando tempo para oração privada.
Por que levar em conta os temperamentos, então? Estamos etiquetando as pessoas? Não exatamente. Perceba que, quando falamos da personalidade de alguém, estamos nos referindo a adultos apenas. As crianças não têm personalidades plenamente formadas, e, portanto, nós olhamos para o temperamento delas. Elas estão muito mais propensas, por estarem no seu estado temperamental “cru”, a reagir a eventos de maneira previsível. Os pais podem usar sua compreensão do temperamento dos filhos para facilitar seu trabalho.
Como determinar o temperamento do seu filho
Dê uma olhada nessa tabela e veja quais atributos, reações e orientações sua criança tende mais a exibir. E lembre-se: provavelmente ninguém tem um temperamento puro. Somos combinações de temperamentos dominantes e secundários (ex: sanguíneo colérico)
Temperamento |
Tipo |
Atributos |
Reação |
Orientação |
Necessidades |
|
Colérico |
(C) intrometido |
Ambicioso, ativo, insensível, autoritário |
Rápida, profunda |
Tarefas |
Lealdade dos demais, ocupação |
|
Sanguíneo |
(C) brincalhão |
Palhaço, amigável, extrovertido, sem foco, dramático, ativo. |
Rápida, superficial |
Diversão |
Diversão, grupos, pessoas |
|
Melancólico |
(C) preocupado |
Introspectivo, introvertido, preocupado, temperamental, s/ autoconfiança |
Lenta, profunda |
Detalhes |
Apoio, elogio |
|
Fleumático |
(C) desleixado |
Lento, pode ser preguiçoso, calmo, passivo, cabeça-dura. |
Lenta, superficial |
Ideias |
Paz, harmonia |
|
(C) Criança; (A) Adulto
Abordagem prática para a vida familiar
Em uma família grande, você pode juntar os filhos mais velhos e os mais novos para cuidarem dos irmãos, em vez de simplesmente contar com o filho mais velho para cuidar da tropa inteira. Por exemplo, junte um fleumático mais velho e calmo com um colérico mais ativo em idade pré-escolar; um melancólico preocupado mais velho com um sanguíneo mais novo e otimista.
Na hora da tarefa de casa, os sanguíneos costumam gostar de ter música tocando no fundo enquanto começam os trabalhos. Muitos melancólicos não podem ouvir música nessas circunstâncias, pois isso tiraria seu foco. Você pode ter que separar as crianças para que elas não se distraiam umas às outras.
Vamos usar a matemática como exemplo de como iniciar as tarefas escolares de casa. O pai pode usar uma das seguintes abordagens a depender do temperamento do filho:
Se o filho for colérico, o pai pode dizer: “Aqui está sua tarefa de matemática. É muito importante, pois nos ajuda a pensar e a resolver problemas. Você consegue resolver essa tarefa?”
Para o sanguíneo: “Aqui está sua tarefa de matemática. Faça apenas metade por enquanto, tudo bem? Vamos começar a primeira juntos”.
Para o melancólico: “Sente aqui comigo, e vamos começar a tarefa de matemática juntos”.
Para o fleumático: “Hora da tarefa de matemática. Vá lá e faça a tarefa agora. Vamos começar agora mesmo”.
Repare nos pontos centrais: com o colérico, o pai enfatiza que a matemática é importante e, então, desafia a criança; com o sanguíneo, o pai compartilha o trabalho com o filho para que ele não esteja só e diminui a quantidade de trabalho (por enquanto); o filho melancólico recebe apoio por estar junto do pai; e o fleumático ouve a palavra “agora” mais de uma vez.
Como ensinar crianças temperamentais
Crianças coléricas não têm muita paciência para aulas longas e chatas. Essas crianças podem praticar bullying na escola se não receberem atividades suficientes.
Crianças sanguíneas têm problemas de concentração. Você não pode dar a elas um monte de material de estudos e dever de casa e ir embora, como faria com um colérico. Elas precisam de monitoramento frequente. Dê prazos a elas e recompensas. Elas gostam de ver o todo, mas é preciso dividir suas tarefas para que possam se concentrar melhor assim. Se for divertido, elas farão sem a menor dificuldade; se não for divertido, será como mover montanhas.
Crianças melancólicas precisam do seu próprio espaço. Precisam de ordem, estrutura e rotina. Elas, normalmente, são as vítimas do bullying escolar. Conseguem fazer toda a tarefa de casa uma vez que sintam que tem o apoio de que tanto necessitam e, então, ficarão confortáveis trabalhando. Se não estiverem acostumadas com uma tarefa, sua timidez as impedirá de fazê-la. Quando uma criança melancólica precisa de ajuda com a tarefa escolar, virá diretamente a você. Quando uma criança sanguínea precisar de ajuda, vai se esgueirar silenciosamente em direção a outra coisa mais divertida.
Crianças fleumáticas têm traços de teimosia. Elas não costumam realizar grandes façanhas e podem se comprazer apenas em ver as outras crianças brincarem. Precisam ouvir, respeitosamente, que é hora da próxima atividade ou tarefa. Essas crianças precisam de paz e harmonia. Se o mau desempenho delas for apresentado como um problema, elas se sentirão motivadas a consertar isso para que possam retornar à sua rotina normal, pacífica. Elas também precisam de respeito e são desencorajadas por ranzinzices.
Como você elogia seu filho vai depender do temperamento dele. Ao colérico diga: “Gostei do seu trabalho”. Ao fleumático: “Eu gosto de você”. Uma criança sanguínea precisa ouvir: “Você é bonita!” Mas o melancólico precisa ouvir: “Bom trabalho”, ou “Gostei do jeito como você fez isso!”
Em outras palavras, os coléricos precisam de reconhecimento pelo que fazem. Fleumáticos precisam de reconhecimento por simplesmente serem o que são. Sanguíneos precisam de reconhecimento pela sua aparência ou pelo modo como agem. Melancólicos precisam de reconhecimento pelo modo com que fizeram algo. Lembre-se, o elogio que você faz a cada filho precisa ser específico, ou vai soar falso.
O que toda criança precisa
Os quatro tipos de temperamento são diferentes, mas todas as crianças são criadas à imagem e semelhança de Deus, e todos têm livre arbítrio para escolher seu comportamento. À luz disso, há algo de que todo tipo de criança precisa? Que traços universais ajudarão as crianças a crescerem e irem para o céu?
A resposta é amor e estabilidade
Quando os pais se amam, amam seus filhos e proporcionam um ambiente emocionalmente estável para a vida familiar, as crianças encontram um lar onde podem prosperar e se tornar adultos católicos. É a isso que Deus lhes direciona no sacramento do matrimônio. O propósito da vida familiar é voltar as almas a Deus. Lembre-se disso quando se sentir exasperado nos problemas com os filhos e serviços domésticos. Ao lhes dar amor, estabilidade e respostas adequadas aos seus temperamentos, estamos fazendo uma obra de Deus.
(The Angelus, March/2012. Tradução: Permanência)