O duodécimo discute-se assim. — Parece que Cristo, enquanto homem, é hipóstase ou pessoa.
1 — Pois, o conveniente a qualquer homem convém a Cristo, enquanto homem. Porque é semelhante aos outros homens, conforme à Escritura: Fazendo-se semelhante aos homens. Ora, todo homem é pessoa. Logo, Cristo, enquanto homem, é pessoa.
2. Demais. — Cristo, enquanto homem, é uma substância de natureza racional. Não porém uma substância universal. Logo, uma substância individual. Ora, a pessoa não é senão uma substância individual de natureza racional, como define Boécio. Logo, Cristo, enquanto homem é uma pessoa.
Mas, em contrário. — Cristo, enquanto homem, não é uma pessoa eterna. Se, pois, Cristo, enquanto homem, é pessoa, segue-se que há em Cristo duas pessoas — uma temporal e outra eterna. O que é errôneo, como se disse.
SOLUÇÃO. — Como dissemos, a palavra homem, tomada em sentido restritivo, pode significar o suposto ou a natureza. Assim, pois, quando dizemos, Cristo, enquanto homem, é pessoa, se homem é tomado como suposto, é manifesto que, enquanto homem, Cristo é pessoa; pois, o suposto da natureza humana não é senão a pessoa do Filho de Deus. Se, porém, for tomado pela natureza, então é susceptível de dupla interpretação. Num sentido, significa que à natureza humana é próprio existir numa pessoa. E então, neste sentido também a proposição é verdadeira; pois tudo o subsistente em a natureza humana é pessoa. Noutro sentido pode entender-se como significando que a natureza humana em Cristo tem uma personalidade própria causada pelos princípios da natureza humana. E então Cristo enquanto homem, não é pessoa; porque a natureza humana não subsiste por si, separadamente da natureza divina, ao contrário do que exige a noção de pessoa.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Todo homem é propriamente pessoa, porque é pessoa todo o ser subsistente da natureza humana. Mas é próprio ao homem Cristo, que a pessoa subsistente na sua natureza humana seja eterna e não causada pelos princípios da natureza humana. Por onde, é pessoa, de um modo, enquanto homem; mas de outro modo não o é, como dissemos.
RESPOSTA À SEGUNDA. — A substância individual, posta na definição de pessoa, supõe uma substância completa subsistente por si, separada das outras. Do contrário, a mão do homem podia chamar-se pessoa, pois é uma certa substância individual; mas, por ser uma substância individual existente em outra, não pode chamar se pessoa. Pela mesma razão, também não o pode a natureza humana em Cristo, que contudo pode chamar-se indivíduo ou um ser particular.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Assim como pessoa significa um ser completo e por si subsistente em a natureza racional; assim também, a hipóstase, o suposto e um ser da natureza pertencente ao gênero da substância significam um ente subsistente por si mesmo. Por onde, assim como a natureza humana não é em si mesma uma pessoa separada da pessoa do Filho de Deus, assim também não é em si mesma uma hipóstase ou um suposto ou um ser da natureza. E portanto, no sentido em que deve ser negada a proposição — Cristo, enquanto homem, é pessoa — devem também sê-lo todas as outras.