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Art. 2 — Se a Paixão de Cristo causou a nossa salvação a modo de satisfação.

 O segundo discute-se assim. — Parece que a Paixão de Cristo não causou a nossa salvação a modo de satisfação. 

1. — Quem pecou é que deve dar satisfação, como demonstram as outras partes da penitência; assim, quem pecou deve arrepender-se e confessar o pecado. Ora, Cristo não pecou segundo o diz a Escritura: O qual não cometeu pecado. Logo, não satisfez pela sua Paixão própria.
 
2. Demais. — Não satisfazemos a ninguém por meio de uma ofensa maior. Ora, a ofensa máxima foi a perpetrada na Paixão de Cristo; pois, pecaram gravissimamente os que o mataram como dissemos. Logo, parece que pela Paixão de Cristo não podia Deus ser satisfeito.
 
3. Demais. — A satisfação implica uma certa igualdade com a culpa, por ser um ato de justiça. Ora, parece que a Paixão de Cristo não foi igual a todos os pecados do gênero humano, porque Cristo não sofreu nas divindades, mas na sua carne, segundo aquilo da Escritura: Havendo, pois, Cristo padecido na carne. Ora, a alma que é a contaminada pelo pecado, é superior à carne. Logo, pela sua Paixão Cristo não satisfez pelos nossos pecados.
 
Mas, em contrário, da sua pessoa diz a Escritura: Paguei então o que não tinha roubado. Ora, não pagou o que perfeitamente não satisfez. Logo, pela sua Paixão Cristo satisfez perfeitamente pelos nossos pecados.
 
SOLUÇÃO. — Propriamente satisfaz pela ofensa, quem oferece o que ama tanto ou mais oque odeia a ofensa. Ora, Cristo, sofrendo por obediência e caridade, ofereceu a Deus um bem maior do que o exigido pela recompensa da ofensa total do gênero humano. Assim, primeiro, pela grandeza da caridade, com a qual sofria. Segundo, pela dignidade de sua vida, que oferecia em satisfação, que era a vida de Deus e do homem. Terceiro, por causa da generalidade da Paixão e da grandeza da dor assumida, como dissemos. Por onde, a Paixão de Cristo não foi só uma satisfação suficiente, mas também superabundante pelos pecados do gênero humano, segundo aquilo do Evangelho (1Jo 2,2): Ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A cabeça e os membros constituem uma como pessoa mística. Por isso a satisfação de Cristo pertence a todos os fiéis, como aos seus membros. Assim, também quando dois homens estão unidos pela caridade, um pode satisfazer por outro, como a seguir se dirá. Mas o mesmo não se dá com a confissão e o arrependimento; porque a satisfação consiste num ato exterior, para o qual se podem empregar instrumentos, entre os quais se contam também os amigos.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Maior foi à caridade de Cristo na sua Paixão do que a malícia dos que o crucificaram. Por isto Cristo pôde satisfazer mais pela sua Paixão, do que ofendê-lo os que o crucificaram e o mataram. Porquanto a Paixão de Cristo foi suficiente e superabundante para satisfazer pelos pecados dos que o mataram.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — A dignidade da carne de Cristo não deve ser a validade só pela natureza da carne, mas pela pessoa assumente; isto é, enquanto carne de Deus, donde lhe derivava a dignidade infinita. 
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