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O desemprego e a Cruz

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E vem essa CNBB dos bispos do Brasil nos falar de desemprego, na linguagem marxista e materialista que lhe é costumeira. Quanta cegueira! O desemprego tem suas raízes numa crise que nem de longe é econômica: é a crise nascida no séc. XIV, que deu origem ao chamado Nominalismo, que levou os homens a abandonarem a "direita via", vivendo já no Humanismo que punha o próprio homem no centro dos seus interesses. Querem saber o próximo passo? É a quebra da Europa católica pelo protestantismo, é a Renascença, com seu pensamento e sua arte carregada de paganismo beato.

Nesta altura da vida da humanidade, o cristianismo medieval já tinha ficado para trás há séculos. E com ele, perdeu-se a noção de uma sociedade católica, onde os homens buscavam primeiro o Reino de Deus e sua Justiça, viviam pobremente, contentavam-se com pouco, mas eram felizes e alegres.

Estava eu neste pensamento quando tocou o telefone:

Dom Lourenço, a companhia onde eu trabalho está mandando dezenas de funcionários embora. Talvez eu perca o emprego!

O contágio!

É a única explicação. Estamos vivendo uma espécie de contágio que não atinge o corpo, mas as forças espirituais da alma. Na antiguidade, os homens iam acompanhando passo a passo o caminho da peste. Hoje levou um pai, amanhã, será a vez do vizinho, do pároco, do amigo.

Eram felizes, os antigos, porque morriam no flagelo. A nós está reservado sofrer uma terrível doença que penetra no fundo de nossas almas, que arrasta pouco a pouco, espalhando-se como um câncer, sem escolha, sem marcar dia nem hora. E o tormento perdura pelos anos a fio:

«E naqueles dias os homens buscarão a morte e não a encontrarão; desejarão morrer, e a morte fugirá deles» (Apoc. 9, 6)

Esta doença tem mais de uma característica. Ela começa pela cegueira espiritual, que leva as melhores pessoas a não verem que o mal está dentro de suas casas, dentro de suas vidas. E todos vão se divertir, e adotam os prazeres do mundo e suas riquezas, seu orgulho idiota contra a santidade da Igreja. Mal sabem eles que são peças de um jogo, escravos de uma ordem mundial, acéfala e monstruosa, saída direto das trevas do Inferno para o derradeiro combate contra o Rei do Céu e da Terra.

Depois de se entregarem a esta cegueira, entram na lógica do erro e, já sem forças, se vêem obrigados a amar as riquezas, as posições de destaque, as maravilhas do mundo:

– Faço sucesso, ganho muito dinheiro, sou bem sucedido, isso é meu direito!

– Já no meu caso, como não faço sucesso, como perdi meu emprego, tenho o direito de reclamar! Vou entrar na justiça!

É um vício. Se adquire pela prática constante dos mesmos atos, e pela adoção da espiritualidade moderna, que nada mais é do que escravidão aos desígnios do diabo.

Mas eles não enchergam e, pior, desejam viver assim.

Dentro deste contexto aparece o flagelo terrível que atinge a todos indiscriminadamente, bons e maus, ricos e pobres, brancos e pretos: o desemprego, que é filho do excesso de emprego.

Já ouço o clamor público, mas estou longe dele. Saí deste mundo e é do alto que procuro analisá-lo. Sem um certo recuo fica difícil conhecer a verdade dos fatos, como a beleza de um quadro.

Digo que é o excesso de emprego que gera o desemprego. Primeiro devido ao mundo materialista mergulhado no vício de possuir e gozar que descrevi acima. Depois, devido ao abandono da verdadeira noção de família, do papel de cada um na vida da sociedade. A mãe já não é mais mãe, a mulher já não é mais esposa. Não vou discutir isso agora, e peço às senhoras que não se levantem para essa discussão. Remeto-vos ao texto de Gustavo Corção que se encontra no cap. VI do livro As Fronteiras da Técnica, e que está editado aqui mesmo em A Vocação da Mulher. A verdade é que eles buscaram esta situação, derrubando os padrões da sociedade católica, ou pelo menos da moral católica, que ainda vigorava no início dos anos sessenta. Agora choram, choramingam, sem saber o que vai acontecer; lavam-se, escovam-se, como que querendo desgrudar do corpo essa lepra, mas ela não atinge o corpo e sim a alma.

«...e todo servo e livre se esconderam nas cavernas e entre os penhascos dos montes; e diziam aos montes e aos rochedos: caí sobre nós e escondei-nos da face daquele que está sentado sobre o trono e da ira do Cordeiro; porque chegou o grande dia da ira de ambos, e quem poderá subsistir». (Apocalipse, VI, 16)

Remédio para o corpo, medicina, de nada vale.

Remédio para a alma. É o que é preciso. Mas o demônio, na sua esperteza, minou as forças da alma, ao longo dos anos, levando os homens a viver nesta miragem do mundo belo, cheio de prazeres e coisas lindas e gostosas. Viciou o homem, de modo que o remédio espiritual tem para ele, hoje, um amargor insuportável. E ele foge. E fugindo, perde a única tábua de salvação, que é o retorno aos parâmetros essenciais da vida humana: Deus e a Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo.

O que vou lhes dizer agora são pensamentos que me foram vindo diante de um mundo que beira a caduquice, a barbárie mais abjeta, a loucura coletiva. Não sou profeta do Apocalipse, apenas olho para o mundo que temos diante de nós com os olhos da objetividade, da clareza de um pensamento assentado em bases filosóficas e doutrinárias ensinadas ao longo de dois mil anos de catolicismo.

E pergunto: vocês vêem na atitude dos homens comuns, dos magistrados e governantes, dos padres, algo que lhes inspire confiança quanto ao futuro? Não digo certeza, digo inspirar uma certa e tênue esperança de que o caminho esteja certo.

Não tenho nada de pessimista, e devo lhes dizer que esta palavra nada significa quando nos deparamos com um mundo enlouquecido como está o nosso.

Eis o que vejo.

Nosso Senhor, na sua grande misericórdia, tem nos dado sinais de que está separando o joio do trigo. Ele ceifa neste momento e recolherá ao seu celeiro o grão bom, deitando fogo na palha e na erva daninha. E que sinais são esses?

O primeiro sinal é o flagelo da Aids que castiga os maus e purifica os bons no que toca a concupiscência da carne. Eis o que nos ensina S. Paulo: «Porque as suas próprias mulheres mudaram o uso natural em outro uso, que é contra a natureza. E, do mesmo modo, também os homens, deixando o uso natural da mulher, arderam nos desejos, mutuamente, cometendo homens com homens a torpeza, e recebendo em si mesmos a paga que era devida ao seu desregramento.»

Com este flagelo, Deus nos alerta para que pratiquemos a virtude da castidade, cada um segundo o seu estado, fugindo com força e gana dos pecados e dos prazeres ilícitos de uma sociedade liberada dos antigos tabus, ou seja, da lei de Deus. Que os casais usem corretamente dos direitos matrimoniais, que os adolescentes fujam sem medo das intimidades ilícitas dos namoros sexuais, que as crianças sejam afastadas da televisão que lhes ensinam que tudo é lindo num mundo alegre e feliz onde reina a liberdade total, sem Deus, sem os ultrapassados 10 mandamentos, sem pais.

O segundo flagelo é o que nos ocupa mais particularmente aqui. Ele atinge em cheio a concupiscência dos olhos, castigando os homens que só pensam em riquezas, em bem estar, em dinheiro, em ser dono disso, em comprar aquilo. É a atitude que vem se agravando desde o século XIV, de resumir a vida no dinheiro, o que acarreta em estabelecer parâmetros de classificação dos homens pela produtividade. Não interessa mais se ele é virtuoso e honesto ou se, ao contrário, desonesto e vicioso. O que conta é a relação custo/benefício. E a massificação realizada pela mídia, hoje agravada pela Internet, iguala todos os homens no que toca a procura. Todos querem porque todos assistem aos mesmos programas de televisão. Basta perceber o que ocorre na época do Natal. De Ipanema a Madureira, de São Gonçalo a Tijuca, nos prédios, nos condomínios ou nas favelas, todas as crianças brincam com os mesmos brinquedos.

E nós, como escaparemos disso, como receberemos este flagelo do desemprego (ou do excesso de necessidade de emprego) de modo a purificar a concupiscência dos olhos? Creio que só há um caminho, para isso. É a virtude da pobreza, que brota da gruta de Belém e se derrama sobre nós da Cruz do Gólgota. Com dinheiro ou sem dinheiro, o pobre Jesus exige de nós a comunhão na sua Santa Pobreza. Possuir como se não possuísse, viver no mundo como se não vivesse. Renunciar aos bens materiais, ao supérfluo, por amor de Deus, porque a Ele pertencem, como tudo o mais. Estarmos submissos à sua Santa Vontade, como Jó, simplex et rectus, que dizia no meio de sua amargura: «Nu saí do ventre de minha mãe e nu me tornarei para lá; o Senhor o deu, o Senhor o tirou, como foi do agrado do Senhor, assim sucedeu; bendito seja o Nome do Senhor». (Jó, 1,20). Me parece que Nosso Senhor pede que sejamos mais modestos no uso dos bens materiais.

A grande confusão que paira sobre a humanidade, seguindo esta linha de raciocínio, é que faltaria um flagelo para o castigo dos maus e purificação dos eleitos. Este último flagelo agiria sobre a última e mais terrível das concupiscências, a soberba da vida. A carne, as riquezas, o poder, assim se dividem os pecados dos homens.

Não há dúvida que já vivemos dentro de um ambiente de orgulho total, de ódio ao próximo, de busca desenfreada de poder. Não apenas por governantes estúpidos e corruptos. São todos que assim agem. Este ambiente é o que mais se assemelha ao inferno, por isso é o pior e mais terrível flagelo que poderia cair sobre os homens. Esse ambiente de soberba universal já existe e exerce sua influência em tudo o que se realiza hoje sobre a terra. Mas não me parece que já seja um flagelo, pois ainda não é imposto individualmente a cada um, sem escolha, sem dia nem hora marcada. Já respiramos o seu ar, mas talvez ainda não estejamos vendo o seu rosto demoníaco. A não ser que, pela soberba atingir essencialmente à alma e não ao corpo, já estejamos vivendo este derradeiro flagelo, sem no entanto percebe-lo. Contra ele, o único remédio é a virtude da obediência, pela qual nos submetemos de bom grado aos mandamentos de Deus, à orientação segura da Igreja Católica, fiéis ao que Ela sempre ensinou, cheios de profunda humildade, desconfiando e desprezando nossas próprias opiniões.

Desde já estejamos no combate contra este flagelo horrível, contra os três flagelos dos fins dos tempos. Dentro de nossas casas, em nossas vidas, participemos das coisas do mundo com cuidado, desconfiando das nossas próprias forças para resistir a tamanho mal, pedindo socorro numa oração constante para que Deus tenha pena de nós. Os remédios que apresentei estão no Evangelho: são os três conselhos de perfeição que Jesus nos ensina.

Tenhamos uma certeza, porém: existe um lugar, um único lugar, onde estaremos ao abrigo de forças tão destruidoras da nossa alma. Junto à Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo. É lá, com Maria, nossa boa Mãe, de pé diante de seu Filho crucificado que receberemos as luzes necessárias para escapar da morte eterna. É lá, neste Calvário eterno que é a Santa Igreja, junto à Cruz da Santa Tradição, que receberemos a vida de Jesus ressuscitado, que permanece conosco na Sagrada Hóstia até a consumação dos séculos. Com esta vida, viveremos. «Nós devemos gloriar-nos na Cruz de N. S. Jesus Cristo, em quem está, para nós, a salvação, vida e ressurreição; por Ele fomos salvos e nos tornamos livres» (Gálatas, 6,14).

Temos pela frente três dias Santos para acompanhar a Paixão, Morte e Ressurreição de Nosso Senhor, na Semana Santa. Depois de nos termos preparado, pela Quaresma, ressuscitemos com Ele, cantemos o nosso Alleluia, cheios da única esperança verdadeira. A vida da graça, semente de glória, que nos é dada hoje para a vida eterna.  

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