O segundo discute-se assim. — Parece não ser efeito deste sacramento fazer-nos alcançar a glória.
1. — Pois, o efeito é proporcionado à causa. Ora, este sacramento é próprio dos que viandamos neste mundo, chamando-se por isso viático. Ora, não sendo as viandantes capazes ainda da glória, parece que este sacramento não nos faz alcançar a glória.
2. Demais. — Posta a causa suficiente, resulta o efeito. Ora, muitos recebem este sacramento que nunca chegarão à glória, como o diz Agostinho. Logo, este sacramento não é causa de alcançarmos a glória.
3. Demais. — O mais não pode ser produzido pelo menos, pois a ação de nenhum ser lhe ultrapassa a espécie. Ora, é menos receber a Cristo sob uma espécie alheia, como o recebemos neste sacramento, do que gozá-lo na sua espécie própria, o que constitui a glória. Logo, este sacramento não nos faz alcançar a glória.
Mas, em contrário, o Evangelho: Se qualquer comer deste pão viverá eternamente. Ora, a vida eterna é a vida da glória. Logo, o efeito deste sacramento é fazer-nos alcançar a glória.
SOLUÇÃO. — Duas coisas podemos considerar neste sacramento. A causa do efeito, a saber, o próprio Cristo nele contido, e a sua paixão representada. E o meio pelo qual alcançamos o efeito, a saber, a recepção do sacramento e das suas espécies. E, de ambos os modos este sacramento é apto a fazer-nos alcançar a vida eterna. Pois, quanto a Cristo, ele próprio pela sua paixão franqueou-nos a entrada da vida eterna, segundo àquilo do Apóstolo: É mediador de um novo testamento, para que, intervindo a morte, recebam a promessa da herança eterna os que tem sido chamado. Por isso a forma desse sacramento reza: Este é o cálice do meu sangue, do novo e eterno Testamento. - Semelhantemente, também a nutrição da comida espiritual e a unidade, significada pelas espécies do pão e do vinho temo-las por certo nesta vida, mas imperfeitamente; perfeitamente, porém os teremos na vida da glória. Por isso Agostinho, aquilo do Evangelho - A minha carne é verdadeiramente comida diz: Os homens buscamos o comer e o beber para saciarmos a fome e a sede, mas isso só o produz verdadeiramente esta comida e esta bebida, tornando imortais e incorruptíveis os que o tomamos e fazendo-nos entrar na sociedade dos santos, onde haverá paz e unidade plena e perfeita.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — — A paixão de Cristo, por cuja virtude obra este sacramento, é por certo a causa eficiente da glória. não porém de modo que nele nos faça entrar imediatamente, pois devemos primeiro padecer com ele, para que depois sejamos com ele glorificados. Assim também, este sacramento não nos introduz imediatamente na glória. mas nos dá o poder de a ela chegarmos. Por isso se chama viático. E como figura dele lemos na Escritura, que Elias comeu e bebeu e com o vigor daquela comida caminhou quarenta dias e quarenta noites até o monte de Deus, Horeb.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Assim como a paixão de Cristo não produz efeito naqueles. que não estão para com ela na disposição devida, assim também por este sacramento não alcançam a glória os que o recebem indignamente. Por isso Agostinho, expondo aquelas palavras do Evangelho - Comeram o maná e morreram - diz: Uma coisa é o Sacramento e outra, a virtude do sacramento. Muitos se achegam ao altar e dele recebem a morte. Por onde, comei espiritualmente o pão celeste, aproximando-vos do altar vestidos de inocência. Por isso nada há para admirar, se os que não conservam a inocência não recebem o efeito deste sacramento.
RESPOSTA À TERCEIRA. — O ser Cristo recebido sob espécie alheia, resulta da natureza co sacramento, que atua instrumentalmente. Ora, nada impede uma causa instrumental produzir um efeito mais amplo, como dissemos.