IDADE MÉDIA
"Para nós, o esplendor medieval não está no brilho das cortes, na oficialização, na penetração do poder temporal; diríamos até que não está no desenvolvimento da escolástica e na altura das catedrais: para nós, o maior, o único esplendor da Idade Média está numa cruz de carvão que São Tomás traçou numa porta que dava para o pecado e nas chagas que um dia apareceram sangrando nas mãos dum pobre de Assis."
"Quem presta ouvidos àquela crônica das derrotas da Igreja, onde se diz que ela perdeu oportunidades e terreno, presta ouvidos aos pruridos e não às palavras da fé. Não lhe passa pelo espírito que foi o mundo que perdeu terreno no reino de Deus e não a Igreja que o perdeu nas cidades do mundo. Não se recorda mais que o banquete de núpcias será completo um dia, ainda que bilhões de convidados inventem as mais engenhosas desculpas para não comparecerem."
(A Descoberta do Outro, pág. 146)
IDEALISMO
"O grande desvio do pensamento moderno tem origem nessa inversão interior pela qual a vontade se arroga um direito de conquista onde somente à inteligência cabe o primado. Todos nós, mais ou menos europeus, estamos impregnados de idealismo filosófico até à medula dos ossos, estamos convencidos de que nossa dignidade mais alta reside nesse subjetivismo obstinado que tenta reduzir todas as coisas do céu e da terra a meia dúzia de opiniões. Muita gente pensa que isso é grandeza e marca de caráter e que a personalidade humana se define por esse fechamento diante dos objetos e se engrandece por essa deformação interior. Diante dos objetos mais simples, o homem liberal, que agasalha suas opiniões, que desconfia de tudo que não seja o morno recôncavo de sua interioridade, cai em guarda numa posição crispada; a vontade mete-se de permeio entre a porta dos sentidos e a inteligência, e como o seu caminho é mais curto, ou porque seja ela mais ágil, sua sugestão chega antes do conceito e gera o preconceito. A inteligência perde a liberdade e a vontade então convence o sujeito de que ele é um livre-pensador"
(A Descoberta do Outro, pág. 66)
IGUALITARISMO
“A sociedade de nossos sonhos terá a medida de sua perfeição na riqueza das diferenciações enquadradas na mais forte e vitoriosa unidade moral. O mundo que nós desejamos não é o pesadelo de uniformidade desejado pelos marxistas. Ao contrário, é um mundo de diferenças exaltadas, em que a criança seja plenamente infantil, o homem plenamente varonil, e a mulher plenamente mulheril. O mundo que nós desejamos restaurar é, em poucas palavras, aquele em que a natureza das coisas seja esplendidamente afirmada, e em que tudo se valorize pelo que tem de genuíno. O pão será pão e não pedra. O leite será leite, e não um equívoco líquido esbranquiçado. A poesia será poesia, e não um pretexto de andar na vida sem regras morais. E tudo o mais será assim, verídico e autêntico." (Teologia da História, Ed. Permanência).
INTELECTUAIS
"Por essas e outras é que sempre aconselho aos jovens intelectuais a prática de trabalhos manuais. Aprendam a consertar torneiras, a descobrir curto-circuitos e assim terão um exercício de docilidade ao real. Não é só com a cabeça que o homem pensa, é também com as mãos. É preciso nunca ter mudado um fusível ou nunca ter pregado um botão nas calças para chegar ao irrealismo profundo dos “intelectuais” que trazem seus brilhantes talentos para pronunciamentos que deveriam versar sobre coisas simples como pão e a água e por excesso de categorias mentais deixam de ver o elefante, o piano e outras coisas mais volumosas."
(O Globo 29/08/1970)
IMATURIDADE
"Numa reunião de pais de família, uma pergunta é lançada à madre superiora:
"- Então a Sra. acha que não devemos obrigar os filhos a ir à missa?
"Houve um silêncio. Um suspense. E então a madre, com voz clara e resoluta, respondeu:
"- Não. A missa não deve ser imposta às crianças como um castigo, do qual não se pode escapar. A criança deve ser despertada para o significado e a beleza desse encontro semanal com o Cristo. Os pais devem dar o exemplo e mostrar à criança que ela é livre de fazer a escolha...
"E aí está. Tudo isto que pareceu muito bonito a vários pais de família é simplesmente monstruoso.
"Em primeiro lugar obrigação não é castigo. Em segundo lugar, a educação consiste essencialmente em preparo e em indicar aos educandos as suas obrigações e os seus deveres para com Deus, consigo mesmos e com o próximo. E educação católica consiste essencialmente em preparar a alma do educando para o cumprimento da vontade de Deus, expressa nos mandamentos.
"Todos nós sabemos há mais de dez mil anos, para o que concerne a lei natural, e há quase dois mil anos, para a lei revelada, que essa tarefa tem de ser feita com amor, dedicação incansável, alternativas de persuasão e severidade, e, sobretudo, sabemos que o desnível da autoridade paterna se atenua com o crescimento dos filhos. Ninguém pensará em obrigar um filho de 48 anos a cumprir o preceito dominical; mas também nenhum pai cristão de bom senso deverá consentir que um filho de 7 anos não vá à missa porque não quer. Diremos até que é bom, vez por outra, algum atrito, para lembrar à criança que há uma obrigação a cumprir em relação a Deus, e que nessa matéria ela tem de obedecer como o pai e a mãe obedecem. Chamo a atenção do leitor para um aspecto muito curioso da resposta daquela madre. Na religião nova ou na nova filosofia de vida que ela prega, os pais devem... os pais devem... mas os filhos não devem nem aprendem a dever. Observem especialmente esta passagem: “Os pais devem dar o exemplo e mostrar à criança que ela é livre de fazer a escolha...”. Do lado dos pais o dever, do lado dos filhos a liberdade, a livre opção. (Devemos aqui fazer uma distinção que certamente não ocorreu à freira: livre escolha, toda alma racional possui, se se trata de liberdade interior de autodeterminação da vontade; mas livre escolha dos atos exteriores, no sentido de liberdade, de independência, ou de não-obrigação, esta só temos em termos muito relativos já que todos nossos atos são polarizados no universo moral!)
"E aí está um exemplo típico do mundo em que vivemos: um colégio católico, de longa tradição, em cinco anos se transforma num “André Maurois”. Não ensinam os deveres e não se entende bem como será que o jovem descobrirá sozinho o dia e a hora em que deixa de ser um imaturo que só age em função do agrado, para ser um responsável."
(Editorial da revista Permanência n° 7, abril de 1969, Ano II)
"Como se explica então tal paradoxo? Como se explica que uma sociedade se gabe precisamente do que não tem, e se glorie justamente no que devia envergonhar-se? Estamos diante de mais uma arma de guerra invisível que se trava nos subterrâneos da história contra a dignidade e a grandeza do homem. Basta um esboço de inquérito para nos revelar o seguinte dado: o termo "Cristão adulto" foi lançado precisamente por uma ala que precisava cativar os ressentidos, os imbecis, os imaturos e os perversos. Servia o termo para designar uma atitude nova, livre, autônoma e supostamente adulta. E qual era essa atitude? A da recusa das estruturas da autoridade. Seria "cristã adulta" a mocinha que chegasse em casa e desfeiteasse a mãe antiquada. Seria cristão consciente o garoto semi-analfabeto que soubesse repetir slogans contra a guerra do Vietnam, e que com isto tivesse o conforto de saber que feriria seu pai ou se avô.
"Na verdade, verdadeiramente maduro e verdadeiramente consciente é o homem que sabe não ser ele sua própria lei, e que possui interiorizado o austero amor da obediência ao bem. É o homem que se move por convicções próprias, mas, também, e principalmente, pela convicção central e principal de que não é ele que improvisa os critérios com que se move na vida. As convicções são próprias porque se apropriou delas por um processo de reflexão e de obediência. Em obscuro, se não é religioso, ou claramente se tem fé, esse homem maduro sabe que tem deveres e normas mais altas do que seus caprichos e suas inclinações.
"O contrário disso é o imaturo. quando ele pensa estar realizando sua mais radiante epifania, e quando pensa estar atingindo sua máxima afirmação, está apenas cumprindo um ato subalterno ditado pelas inclinações inferiores, ou sugeridas pelo líder da turma. E esses pobres títeres se enfeitam com títulos de nobreza que têm a derrisão de apresentá-los pelo avesso do que são.
"(...) A moral subjetiva, que recusa a regra exterior, a lei divina, não faz e ninguém um adulto; ao contrário, fixa inexoravelmente suas vítimas numa perpétua adolescência."
(A moral subjetiva, O Globo, 8-2-69)
INFELICIDADE
"É claro que o homem é extraordinariamente engenhoso na arquitetura de sua infelicidade. Ainda que os fatores extrínsecos sejam seguros e bonançosos, o homem traz em si a borrasca. Ainda que os elementos econômicos, afetivos e temperamentais sejam favoráveis, o homem se encarrega freqüentemente de inventar sua desventura."
(Amor, casamento, divórcio, A Ordem, fev/52)
INIMIGOS
"Hoje, depois de um século de empulhamentos e do triunfal aggiornamento trazido por uma apoteose de equívocos, querem nos inculcar a amolecida idéia de um cristianismo sem combate, sem inimigos e, por via de conseqüência, sem necessidade do Sinal da Cruz. Ouso dizer que a paz mundial, a paz terrestre, a paz feita de bem-estar e do comodismo, etc...constitui uma das principais preocupações do Demônio. Muito melhor do que nós, ele sabe que a obsessão desse cuidado nos leva ao abandono de qualquer ideal de Bem e de Verdade, e diverte-se em saber também que esse é o caminho da mais espantosa explosão de inimizades que o mundo conhecerá. Por mim, confesso que me apavoro, quando sinto o horror que esta simples palavra provoca nesta atualidade costurada de ecumenismos, cursilhos, diálogos e demais retalhos da fantasia dopada. Uma vez, conversando com um general, usei inadvertidamente este vocábulo: “os nossos INIMIGOS”, e ouvi esta afetuosa observação: Professor, eu prefiro o termo adversário...Calei-me aterrado. Se os padres e os militares não sabem mais o que é o “inimigo”, quem o saberá? Porque, na verdade, as duas instituições que devem ter a viva noção desta entidade, são realmente a Igreja e o Exército. Aqui no Brasil, as desavenças acaso ocorridas entre essas duas instituições se explicam umas vezes pelo fato de não serem “da Igreja” aqueles que em nome dela pretendem falar, outras vezes pelo fato de não saberem, os homens da Igreja, que o Exército, de 64 até hoje luta a seu lado contra o inimigo comum.
"Imagino que nesta altura meu leitor esteja a revolver as idéias que aprendeu sobre a Caridade, Evangelho, Perdão e outras grandes noções que auriu no regaço da Igreja. Sendo estudioso, lembra-se que o Concílio de Trento trouxe esta definição lapidar: A Igreja Militante é aquela parte de seus membros (ainda na Terra) que luta contra três cruéis Inimigos: o Diabo, o Mundo e a Carne.
"Mas meu leitor também se lembrará de uma palavra de Cristo: Mas eu vos digo amareis vossos inimigos... “Meu Deus, como conciliar tantas idéias aparentemente opostas?! Como poderei amar se devo combater? Respondo dizendo: combatendo! Porque esta é a melhor forma de Caridade a que ele tem direito. Por incrível que pareça são os pacifistas que pecam contra a Caridade quando querem que todos se unam e se misturem na mesma indiferença em relação à Verdade e ao Bem. Sim, não há mais odioso pecado contra a Caridade do que a amável condescendência com que permitimos e colaboramos com a permanência no erro e no mal. Não fazer questão de incomodá-lo, de combatê-lo, de tirá-lo da sua tranqüilidade no erro e no mal, é fazer uma das obras prediletas do Demônio.
("Livrai-nos Deus de nossos inimigos", O Globo, 25-7-74)
"Falando ao prelado em questão de tais personagens, que desfiguram a Santa Igreja, disse-lhe eu que o meu mais ardente desejo não era o da convivência pacífica com tais inimigos. Ao contrário, meu mais ardente desejo, repito-o aqui, é que esses maus levitas, que tão estridentemente apregoam sua apostasia, sob os eufemismos de novidade e progresso, tenham a lealdade última de se afastarem da Igreja. Levem sua aventura até a extremidade de irem comer bolotas com os porcos. Estas palavras duras, caro leitor, são palavras dos santos evangelhos, e portanto, palavras de amor, porque assim fazendo, eles teriam talvez nesta vida a última chance de, um dia, sentirem saudades da Casa do Pai que só espera a volta do filho pródigo"
("A Santa Visibilidade", in O Globo 9/8/75)