O quarto discute-se assim. — Parece que as referidas palavras das formas não encerram nenhuma virtude criada, efetiva da consagração.
1. — Pois, diz Damasceno: Pela só virtude do Espírito Santo se opera a conversão do pão no corpo de Cristo. Ora, a virtude do Espírito Santo é uma virtude incriada. Logo, este sacramento não se consuma por nenhuma virtude criada das referidas palavras.
2. Demais. — Nenhum poder criado pode fazer obras milagrosas, mas só o poder divino, como se estabeleceu na Primeira Parte. Ora, a conversão do pão e do vinho no corpo e no sangue de Cristo é obra não menos milagrosa que a criação do mundo ou mesmo que a formação do corpo de Cristo no ventre virginal — causas que nenhum poder criado poderia fazer. Logo, nem este sacramento é consagrado por nenhuma virtude criada das referidas palavras.
3. Demais. — As referidas frases não são simples, mas compostas de muitas; nem se proferem simultânea, senão sucessivamente. Ora, a conversão discutida se opera instantaneamente, como se disse. Logo, há de fazer-se por uma virtude simples e não por virtude das referidas palavras.
Mas, em contrário, diz Ambrósio: Se tão grande poder, tem a palavra de N. S. Jesus Cristo, a ponto de fazer existir o que não existia, com quanto maior razão não é capaz de transformar o ser já existente, em outro? Assim, o que era pão antes da consagração, já é corpo de Cristo, depois dela, porque a palavra de Cristo pode mudar a criatura.
SOLUÇÃO. — Alguns disseram, que as referidas palavras nenhuma virtude criada tem para obrar a transubstanciação, nem as formas dos outros sacramentos, ou mesmo os próprios sacramentos, para produzir os efeitos deles. — Ora, isto como já estabelecemos, repugna às palavras dos Santos e derroga a dignidade dos sacramentos da Lei Nova. Por onde, sendo este sacramento o mais digno de todos, conforme estabelecemos, resulta por consequência, que as suas palavras formais têm uma certa virtude criada para obrar a conversão que nele se opera. Mas virtude instrumental, como a do outros sacramentos, conforme dissemos. Ora, sendo as referidas palavras proferidas em nome de Cristo, por disposição dele recebem uma virtude instrumental; assim como os demais atos ou ditos seus tem uma virtude salutífera instrumental, conforme mostramos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — O dizer-se que pela só virtude do Espírito Santo o pão se converte no sangue de Cristo, não exclui a virtude instrumental, que é a forma deste sacramento. Como o dizer-se que o ferreiro faz uma faca, por si só, não exclui a virtude do martelo.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Obras milagrosas nenhuma criatura pode fazê-las, como agente principal; pode porém fazê-las como agente instrumental, como quando o simples contacto da mão de Cristo curou o leproso. E deste modo as palavras de Cristo convertem o pão no corpo de Cristo. O que não podia dar-se na concepção, pela qual se formou o corpo de Cristo, de modo que qualquer· ação procedente desse corpo tivesse a virtude instrumental de o formar. Também na criação nenhum extremo houve que pudesse ser o termo da ação instrumental da criatura. Logo o símile não colhe.
RESPOSTA À TERCEIRA. — As referidas palavras, que obram a consagração, operam sacramentalmente. Por onde, a virtude conversiva das formas deste sacramento, resulta da significação; completa com a prolação da última dicção. Por onde, no último instante da prolação das referidas palavras, elas se revestem da virtude em questão; ordenadamente, porém, às precedentes. E tal virtude é simples em razão do significado; embora as palavras exteriormente proferidas tenham uma certa composição.