O segundo discute-se assim. — Parece que sem batismo ninguém pode salvar-se.
1. — Pois, diz o Senhor: Quem não renascer da água e do Espírito Santo não pode entrar no reino de Deus. Ora, só se salvam os que entram no reino de Deus. Logo, ninguém pode salvar-se sem o batismo que nos regenera pela água e pelo Espírito Santo.
2. Demais. — Foi dito: Cremos que nenhum catecúmeno, embora morto com boas obras, alcança a vida eterna, exceto pelo martírio, que dá a plenitude à virtude do sacramento do batismo. Ora, se alguém pudesse salvar-se sem batismo, seriam sobretudo os catecúmenos que praticaram boas obras, possuidores da fé que obra por caridade. Logo, parece que sem batismo ninguém pode salvar-se.
3. Demais. — Como se disse, o sacramento do batismo é necessário à salvação. Ora, necessário é aquilo sem o que uma coisa não pode existir, como diz Aristóteles. Logo, parece que sem batismo ninguém pode alcançar a salvação.
Mas, em contrário, Agostinho: Certos receberam, e com proveito, a santificação invisível, fora dos sacramentos visíveis; mas a santificação visível, que opera o sacramento visível, pode ser conferida, embora não aproveite sem a santificação invisível. Ora, o sacramento do batismo, sendo uma santificação visível, sem ele ninguém pode alcançar a santificação, pela santificação invisível.
SOLUÇÃO. — O sacramento do batismo pode faltar-nos de dois modos. - Primeiro realmente e por vontade, como no caso dos que não foram batizados nem querem sê-lo. E isso implica manifesto desprezo do sacramento, nos que têm o uso do livre arbítrio. Portanto, aqueles que não receberam o batismo por essa razão não podem salvar-se; pois, nem mental nem sacramentalmente estão incorporados com Cristo, causa única da salvação. - De outro modo, pode alguém não ter recebido o sacramento do batismo, realmente, mas não por desejo. Tal o caso de quem, desejando ser batizado, é tomado de improviso pela morte, antes de receber o batismo. Mas esse pode alcançar a salvação, sem ter sido batizado, por causa do desejo do batismo, procedente da fé que obra por caridade, pela qual Deus nos santifica interiormente pela caridade. Por isso diz Ambrósio, de Valentiniano, morto catecúmeno: Perdi a quem deveria ser regenerado; mas ele não perdeu a graça que pediu.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Como diz a Escritura, o homem vê o que está patente, mas o Senhor olha para o coração. Ora, quem deseja pelo batismo ser regenerado pela água e pelo Espírito Santo, é por certo regenerado de coração, embora não corporalmente. Assim, diz o Apóstolo: A circuncisão do coração é no espírito, não segundo a letra; cujo louvor não vem dos homens, senão de Deus.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Ninguém chega à vida eterna, senão absolvido de toda culpa e reato da pena. E essa absolvição universal é efeito do batismo e do martírio. Por isso se diz que o martírio dá a plenitude a todas a ação sacramental do batismo, isto é, quanto à plena libertação da culpa e da pena. O catecúmeno, pois que tiver o desejo do batismo - porque do contrário não morreria com boas obras - que não podem existir sem a fé que obra por caridade, esse, morrendo, não chega logo à vida eterna, mas sofrerá as penas pelos pecados passados. Mas o tal será salvo, se bem desta maneira como por intervenção do fogo, diz o Apóstolo.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Dissemos que o batismo é de necessidade para a salvação, no sentido em que ninguém pode se salvar sem ao menos ter disso o desejo, o que Deus considera uma realidade (Agost.)