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Uma resposta a Emmanuel Mounier

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Georges Bernanos

 

A revista Espirit, cuja ambição é, visivelmente, a de resolver todos os problemas segundo o método inaugurado outrora nos laboratórios do sr. Edison, quero dizer, utilizando centenas de jovens pensadores de óculos, trabalhando em equipes, acaba de publicar as respostas à sua enquete sobre “a ruptura” entre o mundo cristão atual e o mundo moderno.

“Acha o senhor, perguntava o Sr. Mounier, que esse divórcio seja definitivo e que deva acabar no desaparecimento da era cristã, ou somente acidental, e correspondendo apenas à crise de uma Cristandade histórica particular de onde o Cristianismo deve sair com uma nova face?” 1

Mas, caro Mounier, só existe uma face no Cristianismo, não está de acordo comigo sobre esse ponto? Só há uma face do Cristianismo que é a do Cristo, e encontramos esta face, você e eu, cada vez que lemos o Evangelho.

Sem dúvida compreendo seu pensamento, vejo agora onde quer chegar. Sabe muito bem que depois de ter executado seu número de circo, cada um de seus alunos viria declarar em público, sob uma forma ou outra, que a lei do mundo moderno é a eficácia, que a Igreja não é eficaz, enquanto seus amigos comunistas aplaudiriam gravemente, do alto de suas incompetências, com um sorriso de entendidos... Mas qual é a lei da eficácia para a Igreja? Meu caro Mounier, eis o ponto sobre o qual devemos primeiramente nos entender.

No julgamento de seus amigos comunistas está claro que essa eficácia deve ser medida pelos resultados estatísticos como os de uma sociedade beneficente. Mas o próprio de uma certa eficácia sobrenatural não será precisamente a de decepcionar aqueles que a julgam segundo a regra comum? Aquilo que pedem à Igreja, estes horrorosos intelectuaizinhos atormentados pela sarna da dialética marxista, e que entre duas cambalhotas se coçam ferozmente nos bastidores, é precisamente o mesmo que os doutores e os escribas pretendiam exigir do Cristo. No final das contas os judeus — também eles — esperavam um messias “eficaz” e não viram mais do que um homem pobre, tal como o descreve Daniel Rops em um livro que leio e releio com o coração flagelado de angústia2. Um pobre homem, que nem era capaz de carregar sozinho sua cruz debaixo da gritaria do populacho. A Igreja não nos desconcerta menos, é certo, mas Deus quis alguma vez que Ela nos seduzisse? Há um escândalo da Igreja, mas Deus quer acabar com esse escândalo, ou dará somente até o fim, a cada homem de boa-vontade, o que é preciso para passar além? Você acredita que hoje o rosto da Igreja repele mais do que atrai, mas e se repelisse precisamente porque nós nos desviamos dele, porque não ousamos olha-lo de frente, porque nossa fé e nosso amor não se refletem mais nele? As massas se afastam da Igreja, vejo bem. Mas terá a Igreja necessidade das massas ou as massas necessidade da Igreja? Imbecis! Deixaram formar uma civilização inimiga do homem e contam com o Filho do Homem para os ajudar a prosseguirem com essa experiência até o fim? Quando não pensavam mais em pecado original ei-lo que se impõe sob a forma de bomba atômica ou desses cristais do Dr. Went, dos quais 20 gr. são suficientes para provocar a morte de todos os seres humanos vivos nos Estados Unidos e no Canadá... Idiotas que são! Quiseram um mundo eficaz, eis que o têm. Arrebentem-se contentes!

Quando falo assim, o sr. Mauriac pára um instante de lamber seu urso democrata-cristão para me tratar de pessimista. Ele ou eu, Deus sabe quem é o pessimista! Porque não é meu desespero que recusa o mundo, eu o recuso com toda a minha Esperança. Sim, espero com todas as minhas forças que o mundo moderno não dará razão ao homem. O mundo moderno quer dizer, o Estado moderno, o Robô gigante, planetário ao qual a ciência oferece todos os dias armas à sua medida. Está claro que diante desta Providência mecânica da qual esperam a justiça social — e porque não o amor também, imbecis! — o Mendigo Divino suspenso a seus cravos faz uma triste figura... E agora estamos todos em volta da Igreja, como outrora os judeus em volta do Supliciado: “Vamos. Se é Deus, prove-o, salva-te! Salva-nos”. Mas a Igreja, assim como o Cristo, não se dignará responder ao desafio do mau ladrão.

 

Revista Permanência n° 172-173, Março-Abril de 1983. (Tradução de Anna Luiza Fleichman, de “Français, si vouz saviez”)

 

** O título é de nossa autoria [N. da P.]

  1. 1. “Mundo Cristão, mundo Moderno” (Espirit, ag-se 1946). As perguntas feitas por Mounier eram textualmente: “Que pensa do fosso que se estabeleceu entre o mundo cristão e o mundo moderno? Como se formou? O que se torna? Como encara as soluções que foram tentadas para enche-lo? Que se deve tentar?” As principais respostas recebidas e publicadas foram as dos srs. Denis de Rougemont, François Mauriac, Etienne Gilson, Brice Parrin, Henry Multzer O’Naghten, Nicolas Berdialff, D. Bruno de Solage, Rv. Ped. Buckberger, Pierre Teillard de Chardin, Henry de Lubac, Montuclard, Henry Leclerc, G. Michonneau, Pierre, Depierre, dos pastores Roland de Pury e Brissaud.
  2. 2. Jesus em seu tempo. Ed. Fayard, 1945.
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