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Art. 1 — Se o Filho de Deus assumiu um verdadeiro corpo.

O primeiro discute-se assim. — Parece que o Filho de Deus não assumiu um verdadeiro corpo.

1. — Pois, diz o Apóstolo, que ele, se fez semelhante aos homens. Ora, o que verdadeiramente existe não existe por semelhança. Logo, o Filho de Deus não assumiu um verdadeiro corpo.

2. Demais. — A assunção do corpo em nada contrariava à dignidade da divindade; assim, como diz Leão Papa, nem a glorificação destruiu a natureza inferior, nem a assunção diminuiu a superior. Ora, a dignidade de Deus exige que seja totalmente separado do corpo. Logo, parece que, pela assunção, Deus não: se uniu a um corpo.

3. Demais. — Os sinais devem responder aos assinalados. Ora, as aparições do Antigo Testamento, que foram os sinais e as figuras da aparição de Cristo, não eram realmente de natureza corpórea, mas construíam visões imaginárias, como o adverte a Escritura: Vi ao Senhor assentado, etc. Logo, parece que também a aparição do Filho de Deus no mundo não foi a de um corpo real, mas só em figura.

Mas, em contrario, diz Agostinho, se o corpo de Cristo foi um fantasma, Cristo enganou; e se enganou, não é a verdade. Ora, Cristo é a verdade. Logo, fantasma não foi o seu corpo. E assim, é claro que assumiu um verdadeiro corpo.

SOLUÇÃO. — Como foi dito, o Filho de Deus não nasceu patativamente, quase com um corpo figurado, mas, com um verdadeiro corpo. E disto podemos dar três razões. — A primeira é deduzida da natureza humana, à qual é próprio ter um corpo. Suposto, pois, pelo que já dissemos, que era conveniente o Filho de Deus assumir a natureza humana, resulta, como consequência, que teve um verdadeiro corpo. — A segunda razão pode ser deduzida do que se realizou no mistério da Encarnação. Pois, se o corpo de Cristo não era real mas fantástico, também consequentemente não padeceu uma verdadeira morte, nem nada do que dele narram os Evangelistas realmente o praticou, mas só na aparência. Donde também resultaria que não operou a verdadeira salvação do gênero humano, pois, há de o efeito proporcionar-se à causa. — A terceira razão pode ser concluída da dignidade mesma da Pessoa assumente, a qual, sendo a verdade, não lhe era decente existir qualquer ficção na sua obra. Por isso, o próprio Senhor se dignou excluir esse erro. quando os discípulos, conturbados e aterrados, julgavam ver um espírito e não um corpo verdadeiro. Por isso, ofereceu-se lhes a que o apalpassem, dizendo: Apalpai e vede, que um espírito não tem carne nem ossos, como vós vedes que eu tenho.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A referida semelhança exprime a verdade da natureza humana em Cristo, ao modo pelo qual todos os que têm verdadeiramente a natureza humana se consideram semelhantes, pela espécie. Mas não se entende por ela uma semelhança fantástica. E para evidenciá-lo o Apóstolo acrescenta — Feito obediente até à morte e morte de cruz, o que não poderia ser, se a semelhança fosse somente em imagem.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Pelo fato do Filho de Deus ter assumido um corpo real em nada se lhe diminuiu a dignidade. Por isso diz Agostinho: Abateu-se a si mesmo, tomando a forma de servo, para que se tornasse servo; mas não perdeu a plenitude da forma de Deus. Pois o Filho de Deus não assumiu um corpo real para que se fizesse a forma do corpo, o que repugna à divina simplicidade e pureza, pois tal seria assumir um corpo na unidade de natureza; o que é impossível, como do sobredito se colhe. Mas, salva a distinção da natureza, assumiu um corpo na unidade da pessoa.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A figura deve corresponder à realidade quanto à semelhança e não quanto à verdade mesma dessa realidade; pois, se a semelhança o fosse em tudo, já não seria um sinal, mas a realidade mesma, como diz Damasceno. Logo, era conveniente que as aparições do Antigo Testamento fossem só aparências, quase figuras; mas a aparição do Filho de Deus no mundo seria segundo a verdade do corpo, quase uma realidade figurada pelas anteriores figuras. Donde o dizer o Apóstolo: Que são sombra das coisas vindouras, mas o corpo é de Cristo.

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