O terceiro discute-se assim. — Parece que estar sentado àdireita do Padre não convém a Cristo enquanto homem.
1. — Pois, como diz Damasceno, chamamos direita do Padre à glória e às honras da divindade. Ora, a glória e as honras da divindade não convém a Cristo enquanto homem. Logo parece que Cristo, enquanto homem, não está sentado à direita do Pai.
2. Demais. — O fato de estar sentado àdireita de quem reina parece que exclui a sujeição; porque o sentado àdireita de quem reina de certo modo reina com ele. Ora, Cristo enquanto homem, está sujeito ao Pai, segundo o Apóstolo. Logo, parece que Cristo, enquanto homem, não está sentado à direita do Pai.
3. Demais. — Aquilo do Apóstolo - Que está à mão direita de Deus, diz a Glosa: isto é, igual ao Pai pela honra em virtude da qual o Pai é Deus; ou, à direita do Pai. isto é, participante dos mais elevados dons de Deus. E àquele outro lugar: Está sentado à direita da majestade nas alturas. comenta: isto é. como tendo a igualdade com o Padre. acima de iodos os seres, pelo lugar e pela dignidade. Ora. ser igual a Deus não convém a Cristo enquanto homem, pois nessa qualidade, ele próprio o disse: O Pai é maior do que eu. Logo, parece que estar sentado à direita do Pai não convém a Cristo enquanto homem.
Mas, em contrário, diz Agostinho: Pela direita entendei o poder que tinha Cristo, recebido de Deus, pelo qual virá a julgar, ele que viera para ser julgado.
SOLUÇÃO. — Como dissemos pela direita do Padre entende-se ou a glória mesma de Cristo, ou a sua bem-aventurança eterna ou o seu poder judiciário e real. Pois a preposição - a - designa de certo modo o acesso à direita, o que implica a conveniência com uma certa distinção, como se disse. O que de três modos pode ser. — Primeiro, sendo a conveniência da natureza e a distinção da pessoa. E assim, Cristo, como Filho de Deus está sentado àdireita do Padre porque tem a mesma natureza que ele. Por onde, a conveniência e a distinção referidas cabem essencialmente tanto ao Filho como ao Pai. E isso é ter o Filho a igualdade com o Pai. — De outro modo, pela graça da união; e esta implica, ao inverso, a distinção de natureza e a unidade de pessoa. E, por aí, Cristo, enquanto homem, é o Filho de Deus e, por consequência, está sentado àdireita do Pai; mas de modo que a expressão enquanto não designe a condição da natureza, mas a unidade do suposto como já expusemos. — Em terceiro sentido, o referido acesso pode ser entendido segundo a graça habitual, mais abundante em Cristo que em todas as demais criaturas por ter a natureza humana de Cristo, em si mesma maior beatitude que a das outras criaturas: e por ter ainda sobre todas o poder real e judiciário.
Assim, pois, a expressão enquanto, designando a condição da natureza, Cristo, enquanto Deus, está sentado à direita do Padre, isto é, tem igualdade com o Padre. Mas, enquanto homem, está sentado àdireita do Padre, isto é, participa dos bens paternos mais elevados que os de todas as criaturas, isto é, tem uma beatitude maior e exerce o poder judiciário. Se porém — enquanto — designa a unidade de suposto, então também, enquanto homem, está sentado à direita do Padre, pela igualdade de honras, isto é, enquanto que em nossa veneração atribuímos as mesmas honras ao Filho de Deus e à natureza assumida como dissemos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A humanidade de Cristo, segundo as condições da sua natureza, não tem a glória ou as honras da divindade; tem-nas porém, em razão da pessoa a que está unida. Por isso Damasceno acrescenta no mesmo lugar: Dela, isto é, da glória da divindade, o Filho de Deus frui, antes de todos os séculos, enquanto Deus; e, com a sua carne glorificada, está sentado à dextra do Pai com quem é consubstancial. Assim, todas as criaturas lhe atribuem a mesma adoração, como Deus e homem.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Cristo, enquanto homem está sujeito ao Padre, designando - enquanto - a condição da natureza. E, assim não lhe cabe estar sentado à direita do Padre, por uma razão de igualdade que, como homem, não lhe assiste. Mas, cabe-lhe estar sentado à direita do Padre, entendendo-se por isso a excelência de beatitude e o seu poder judiciário sobre todas as criaturas.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Fruir da igualdade com o Padre não convém à natureza humana de Cristo em si mesma, senão só à pessoa assumente. Mas, participar dos dons mais elevados de Deus, enquanto excedentes às demais criaturas, isso o pode a natureza assumida, em si
mesma.