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Art. 3 — Se Cristo subiu por virtude própria.

 O terceiro discute-se assim. — Parece que Cristo não subiu ao céu por virtude própria. 

1. — Pois, diz o Evangelho, que o Senhor Jesus, depois de haver falado aos discípulos, foi assunto ao céu. E os Atos: Vendo-o eles, se foi elevando e o recebeu uma nuvem que o ocultou a seus olhos. Ora, o que é assunto e elevado parece que é movido por outro. Logo, Cristo foi levado ao céu não por virtude própria, mas por alheia.
 
2. Demais. — O corpo de Cristo era terreno, como o nosso. Ora, é contra a natureza do corpo terreno ser levado para cima. Assim, nenhum movimento tem, por virtude própria, o ser movido contrariamente à sua natureza. Logo, Cristo não subiu ao céu por virtude própria.
 
3. Demais. — A virtude própria de Cristo é a virtude divina. Ora, o movimento da ascensão não provinha da virtude divina, porque esta é infinita e aquele instantâneo; de modo que não podiam os discípulos verem-no elevar-se aos céus, como refere a Escritura. Logo, parece que Cristo não subiu ao céu por virtude própria.
 
Mas, em contrário, a Escritura: este formoso em seu traje que caminha na multidão da sua fortaleza. E Gregório diz: Notemos que a Escritura refere que Elias subiu ao céu num carro, como para mostrar abertamente que um simples homem precisava do auxílio alheio. Narra, porém, que o nosso Redentor se elevou sem o auxílio de nenhum carro e nem de anjos, porque o autor de todas as coisas subia, por seu poder próprio, acima de todas.
 
SOLUÇÃO. — Tem Cristo dupla natureza: a divina e a humana. Por onde, podemos lhe atribuir um poder próprio a cada uma dessas naturezas. Mas, já a natureza humana de Cristo é por si só, dotada de duplo poder. Um natural procedente dos princípios da natureza. E em virtude desse poder é manifestado que Cristo não subiu ao céu. Outro poder, porém, da natureza humana de Cristo é o da Glória. E em virtude desse Cristo subiu ao céu. Mas, o fundamento desse poder certos o vão buscar em a natureza da quinta essência, que é a luz, como dizem, que fazem entrar na composição do corpo humano, de modo a, por meio dela, adunarem os elementos contrários. De modo que, no seu estado mortal, predomine no corpo humano a sua natureza elementar; e assim, segundo a natureza do elemento predominante, o corpo humano tende para baixo pela sua virtude natural. Mas no estado da glória predomina a natureza celeste, por cuja inclinação e virtude o corpo de Cristo e os corpos dos santos são levados para o céu. Mas, dessa opinião já tratamos na Primeira Parte, e mais adiante tornaremos a vê-la no tratado da ressurreição em geral. Deixando, pois, de lado essa opinião, vão outros buscar a razão do referido poder na alma glorificada, por cuja redundância é glorificado o corpo, como diz Agostinho. Pois, tão sujeito estará o corpo glorioso àalma beata, que, como diz Agostinho, o corpo estará imediatamente onde o quiser o espírito, e este não quererá nada que não lhe convenha ao mesmo tempo, e ao corpo. Ora, ao corpo glorioso e imortal na morada celeste é o seu lugar conveniente. Por onde, levado pela vontade da sua alma, Cristo subiu ao céu. - Mas, assim como o corpo se torna glorioso por participar da alma, assim, como diz Agostinho, participando de Deus, a alma se torna bem-aventurada. Por onde, a causa primeira da ascensão de Cristo ao céu foi o poder divino. Assim, pois, Cristo subiu ao céu por virtude própria: primeiro, pela sua virtude divina; segundo, pela virtude da sua alma glorificada, que movia o corpo como queria.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Assim como Cristo ressurgiu pela sua vontade própria, e contudo dizemos que foi ressuscitado pelo Padre, por terem o Pai e o Filho o mesmo poder, assim também Cristo subiu ao céu por virtude própria, sendo contudo elevado e assunto pelo Pai.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — A razão aduzida prova que Cristo não subiu ao céu pela virtude própria, inerente ànatureza humana. Subiu ao céu porém pela sua virtude, enquanto poder divino; e pela virtude própria à sua alma bem-aventurada. E embora subir para as alturas seja contrário à condição presente da natureza do corpo humano, em que o corpo não está inteiramente sujeito ao espírito, não será porém contrário à natureza do corpo glorioso, nem lhe constituirá uma violência, a ele cuja natureza está totalmente sujeita ao espírito.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Embora o poder divino seja infinito, e tenha pelo seu sujeito, capacidade infinita, contudo o efeito da sua ação é recebido pelas causas segundo a capacidade delas e a disposição de Deus. Ora, o corpo não é capaz de um movimento local instantâneo, porque há de comensurar-se com o espaço, por cuja divisão e divide o tempo, como o prova Aristóteles. Por onde, não é necessário que o corpo seja movido por Deus instantaneamente, mas que o seja pela velocidade que Deus dispõe. 
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