1. — Pois, diz Ambrósio: Deixa-te de provas, quando se trata da fé. Ora, a ressurreição de Cristo é matéria de fé. Logo, não é susceptível de provas.
2. Demais. — Gregório diz: Nenhum mérito tem a fé, quando a razão humana se funda na experiência. Ora, Cristo não devia privar-nos do mérito da fé. Logo, não devia confirmar com provas a sua ressurreição.
3. Demais. — Cristo veio ao mundo para tornar possível aos homens a aquisição da felicidade, segundo a Escritura: Eu vim para terem a vida e para terem em maior abundância. Logo, parece que Cristo não devia manifestar com provas a sua ressurreição.
Mas, em contrário, a Escritura refere que Cristo apareceu aos discípulos por quarenta dias, com muitas provas, falando-lhes do reino de Deus.
SOLUÇÃO. — O vocábulo - prova - é susceptível de duplo sentido. Num, assim se chama qualquer razão que nos leve a dar fé a uma causa duvidosa. Noutro, é às vezes um sinal sensível que induz a manifestação de alguma verdade; assim, Aristóteles nas suas obras usa às vezes ao referido vocábulo neste sentido. Ora, tomando a palavra no primeiro sentido, Cristo não deu aos seus discípulos prova da sua ressurreição. Porque tal prova seria um argumento resultante de determinados princípios: e estes, não sendo conhecidos dos discípulos, nada por eles se lhes poderia provar, pois, do desconhecido não podemos tirar nenhum conhecimento. E, de outro lado, se lhes fossem conhecidos, não transcenderiam a razão humana e portanto, não seriam eficazes para fundar a fé na ressurreição, que excede a nossa razão: pois os princípios devem ser do mesmo gênero que as coisas que pretendem provar, como diz Aristóteles. Ora, Cristo provou aos discípulos a sua ressurreição pela autoridade da Sagrada Escritura, fundamento da fé, quando disse: Era necessário que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na lei de Moisés, nos profetas e nos salmos.
Mas, se considerarmos a prova na segunda acepção então dizemos que Cristo declarou por provas a sua ressurreição, porque mostrou por certos sinais evidentíssimos, que verdadeiramente ressurgiu. Por isso, o grego, em lugar de dizer como a vulgata - com muitas provas - diz TfXJJ.'YJPW'" isto é, sinal evidente para provar. E esses sinais de ressurreição Cristo os manifestou aos discípulos, por duas razões. Primeiro, porque os corações deles não estavam dispostos a dar fàcilmente fé à ressurreição. Por isso Cristo lhes disse: ó estultos e tardas de coração para crer! E noutro lugar o Evangelho diz que Cristo lhes lançou em rosto a sua incredulidade e dureza de coração. — Segundo, para que, mediante tais sinais a eles manifestados, o testemunho que dessem fosse mais eficaz, segundo aquilo da Escritura: O que vimos e ouvimos e palparam as nossas mãos, disso damos testemunho.
DONDE RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Ambrósio, no lugar citado, funda-se em argumentos baseados na razão humana. Os quais não são válidos para demonstrar as coisas da fé, como dissemos.