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Art. 2 — Se entre Maria e José houve verdadeiro matrimônio.

 O segundo discute-se assim. — Parece que entre Maria e José não houve verdadeiro matrimônio.

 
1. — Pois, diz Jerônimo, que José foi guarda de Maria, antes que seu marido. Ora, se entre eles tivesse havido verdadeiro matrimônio, José teria sido verdadeiramente seu marido. Logo, parece que não houve verdadeiro matrimônio entre Maria e José.
 
2. Demais. — Aquilo do Evangelho – Jacó gerou a José, esposo de Maria – diz Jerônimo: Quando ouvires o nome de esposo, não vás logo pensar que se trate de núpcias; mas lembra-te que as Escrituras costumam chamar aos noivos, esposos e as noivas, esposas. Ora, o verdadeiro matrimônio não são os esponsais, mas as núpcias. Logo, não houve verdadeiro matrimônio entre a Santa Virgem e José.
 
3. Demais. — O Evangelho diz: José seu esposo, como era justo, não queria infamá-la, isto é, levá-la para sua casa para com ela coabitar habitualmente; mas resolveu deixá-la secretamente, isto é, transferir o tempo das núpcias, como expõe Remígio. Logo, parece que, antes de celebradas as núpcias, ainda não havia verdadeiro casamento; sobretudo porque, depois de contraído o matrimônio, a ninguém é lícito abandonar a mulher.
 
Mas, em contrário, diz Agostinho: Não devemos crer que, segundo o Evangelista, José tivesse recusado receber Maria em casamento, a pretexto que ela teria, como virgem, dado à luz Cristo, sem o seu concurso. Mas esse exemplo prova claramente aos fiéis casados, que podem ser verdadeiros esposos e merecer tal nome, ao mesmo tempo que guardam a promessa de recíproca continência, sem ter comércio conjugal.
 
SOLUÇÃO. — Chama-se verdadeiro matrimônio ou casamento o que realiza a sua perfeição. Ora, dupla pode ser a perfeição de uma coisa: primária e secundária. A perfeição primária de uma coisa consiste na sua forma, donde tira a sua espécie. A perfeição secundária consiste na sua operação, pela qual de certo modo atinge o seu fim. Ora, a forma do matrimônio consiste numa certa e indivisível conjunção das almas, pela qual cada cônjuge está obrigado a conservar uma fé íntegra para com o outro. Quanto ao fim do matrimônio, é a geração e a educação da prole; e esse é atingido, primeiramente, pelo concúbito conjugal; e, secundariamente, pela cooperação do homem e da mulher, que mutuamente se ajudam, para a manutenção dos filhos.
 
Assim, pois, devemos dizer, quanto à primeira perfeição, que houve matrimônio absolutamente verdadeiro entre a Virgem Mãe de Deus e José. Pois, ambos consentiram na convivência conjugal; mas não expressamente, na cópula carnal, senão sob a condição, se isso aprouvesse a Deus, por isso, o Anjo chama a Maria esposa de José, quando lhe disse a este: Não temas receber a Maria, tua mulher. Expondo o que, diz Agostinho: Chama-lhe esposa, pela fé primeira dos desposórios, aquela que jamais conhecera nem nunca haveria de conhecer pelo concúbito Quanto porém à segunda perfeição, pelo ato do matrimônio, se a referirmos ao concúbito carnal, gerador dos filhos, então não se consumou o matrimônio entre José e Maria. Donde o dizer de Ambrósio: Não te perturbes com o chamar frequentemente a Escritura a Maria de esposa; pois, a celebração do casamento não implica em perda da virgindade, sendo apenas a testificação das núpcias. - Contudo, o matrimônio em questão foi também perfeito quanto à educação da prole. Por isso diz Agostinho: Os pais de Cristo tiveram o bem completo das núpcias – a prole, a fé e o sacramento. Pela prole, significamos o próprio Senhor Jesus; pela fé, a ausência de todo adultério; pelo sacramento, a não existência do divórcio. Só não houve o concúbito nupcial.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Jerônimo, no lugar citado, se refere ao marido, quanto ao ato da consumação do matrimônio.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Jerônimo chama às núpcias concúbito nupcial.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como diz Crisóstomo, a Santa Virgem quando desposou a José já lhe habitava a casa. Pois, se a concepção de uma mulher, na casa de seu marido, é considerada regular, é suspeita a da que concebeu fora de casa. Por isso, não teria sido suficientemente acautelada a reputação da Santa Virgem só pelo fato de ter casado, sem que estivesse habitando no domicílio conjugal. Por onde, a expressão  não queria levá-la para casa  entende-se melhor como significando que não queria difamá-la em público, do que como significativa do ato de levá-la para a casa. Por isso o Evangelista acrescenta, que resolveu deixá-la secretamente. Embora porém estivesse habitando a casa de José, pela fé primeira dos desposórios, antes ainda de celebradas solenemente as núpcias; por causa do que, também ainda não tinha tido comércio carnal. Por isso, como ensina Crisóstomo, o Evangelista não disse – Antes de ter sido levada para a casa do esposo — pois já lhe habitava a casa. Porque era costume entre os antigos que a noiva habitasse a casa do noivo. Donde o ter também dito o Anjo: Não temas receber a Maria tua mulher, isto é, não temas celebrar núpcias solenes com ela. - Embora outros digam, que ainda não habitava a casa de José, mas era somente noiva. Mas, a anterior explicação melhor concorda com o Evangelho.
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