O quarto discute-se assim. — Parece que a ingratidão, por causa da qual o pecado subseqüente faz voltarem os pecados já perdoados é um pecado especial.
1. — Pois, a retribuição às graças referidas constitui a reciprocidade (contrapassum) exigida pela justiça, como está claro no Filósofo. Ora, a justiça é uma virtude especial. Logo, a ingratidão é um pecado especial.
2. Demais. — Túlio introduz a gratidão como uma virtude especial. Ora, a ingratidão se opõe à gratidão. Logo, a ingratidão é um pecado especial.
3. Demais. — Um efeito especial procede de uma causa especial. Ora, a ingratidão produz o efeito especial de fazer de certo modo voltarem os pecados já perdoados. Logo, a ingratidão é um pecado especial.
Mas, em contrário. — O efeito de todos os pecados não constitui um pecado especial. Ora, qualquer pecado mortal nos torna ingratos para com Deus como do sobredito se colhe. Logo, a ingratidão não é um pecado especial.
SOLUÇÃO. — A ingratidão do pecador é às vezes um pecado especial; outras vezes não o é, não passando de uma circunstância geralmente conseqüente a todo pecado mortal cometido contra, Deus. Ora, o pecado se especifica pela intenção do pecador; por isso diz Aristóteles, quem adultera a fim de furtar, é, antes, ladrão, que adúltero. O pecador, pois, que por desprezo de Deus e do benefício recebido cometa um pecado, constitui este pecado uma espécie de ingratidão, e essa ingratidão do pecador é um pecado especial. Quem tiver porém tendo a intenção de cometer um pecado, por exemplo, o homicídio ou o adultério, dele não desiste porque implique desprezo de Deus, não será tal pecado um pecado especial, mas entrará na espécie de outro pecado como uma circunstância. Ora, como diz Agostinho, nem todo pecado é cometido por desprezo; e contudo por todos os pecados Deus é desprezado nos seus preceitos. Por onde, é manifesto que a ingratidão do pecador é às vezes um pecado especial; mas nem sempre. Donde se deduzem claras as respostas as objeções. — Pois, as primeiras concluem que a ingratidão, em si mesma, é uma espécie de pecado. — E a última objeção conclui que a ingratidão enquanto existente em todos os pecados, não é um pecado especial.