O quinto discute-se assim. — Parece que não era conveniente a instituição deste sacramento.
1. — Pois, como diz o Filósofo, nós nos nutrimos da matéria idêntica à de que somos constituídos. Ora, pelo batismo, que é uma regeneração espiritual, recebemos o ser espiritual. Logo, pelo batismo também nos nutrimos. E portanto não era necessário instituir este sacramento como nutrição espiritual.
2. Demais. — Por este sacramento os homens se unem com Cristo como os membros com a cabeça. Ora, Cristo é a cabeça de todos os homens, inclusive dos que existiram desde o princípio do mundo, como se disse. Logo, a instituição deste sacramento não devia ser definidoaté a ceia do Senhor.
3. Demais. — Este sacramento se chama memorial da paixão do senhor, segundo aquilo do Evangelho: Fazei isto em memória de mim. Ora, a memória é das coisas passadas. Logo, este sacramento não devia ser instituído antes da paixão de Cristo.
4. Demais. — Pelo batismo estamos aptos a receber a Eucaristia, que não é dada senão aos batizados. Ora, o batismo foi instituído depois da paixão e da ressurreição de cristo, como o refere o Evangelho. Logo e inconvenientemente, este sacramento foi instituído antes da paixão de Cristo.
Mas, em contrário, este sacramento foi instituído por Cristo, de quem o Evangelho diz: Ele tudo tem feito bem.
SOLUÇÃO. — Este sacramento foi convenientemente instituído na ceia, na qual Cristo pela última vez esteve reunido com os discípulos. - Primeiro, em razão do conteúdo desse sacramento. - Pois, o próprio Cristo está contido na Eucaristia como num sacramento. Por isso, quando Cristo teve de se separar corporalmente dos discípulos, en.tregou-se-Ihes a si mesmo sob a espécie sacramental, assim como na ausência do imperador se mostra a sua veneranda imagem. Por isso Eusébio (aut. inc.) diz: Porque o corpo que assumira devia se separar dos olhos dos discípulos e subir ao céu, era necessário que no dia ela ceia nos consagrasse o sacramento elo seu corpo e sangue, a fim ele que fosse adorado perenemente no mistério quem uma vez se ofereceu como o preço ela nossa redenção. - segundo, porque sem a fé da paixão de Cristo nunca poderia haver salvação, segundo aquilo do Apóstolo: Ao qual propôs Deus para ser vítima ele propiciação pela fé no seu sangue. Por isso era necessário que em todos os tempos houvesse entre os homens o que representasse a paixão do senhor. Do que, no Testamento Velho, o sacramento precípuo era o Cordeiro Pascal; donde o dizer o Apóstolo: Cristo, que é a nossa Páscoa, foi imolado. Mas lhe sucedeu, no Testamento Novo, o sacramento da Eucaristia, rememorativo da paixão passada, assim como o Cordeiro Pascal era prefigurativo da futura. Por isso era conveniente instituir o novo sacramento, na iminência da paixão, depois de celebrado o anterior, como diz Leão Papa (I). - Terceiro. porque as palavras pronunciadas por último, sobretudo entre amigos que se separam, são as que mais se gravam na memória, principalmente porque então são mais intensos os afetos para com eles; ora, o para o que temos maior hábito mais profundamente se nos grava na alma. Mas, como diz S. Alexandre Papa (I), como nenhum sacrifício pode ser maior que o do corpo e do sangue de Cristo, nem nenhuma oblação lhe é superior, por isso, para que o tivéssemos em maior veneração, Cristo instituiu este sacramento na última despedida dos seus discípulos. E tal é o que diz Agostinho: O Salvador, desejando inculcar mais veementemente a profundeza deste mistério, quis que fosse a última coisa a fíxar-se no coração e na memória dos discípulos, dos quais devia separar-se para sofrer a sua paixão.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Nós nos nutrimos da matéria idêntica à de que somos constituídos, mas não a recebemos do mesmo modo. Assim, aquilo de que somos feitos o recebemos pela geração; e isso mesmo, enquanto nos serve de nutrição, o recebemos pela manducação. Por onde, assim como pelo batismo renascemos em Cristo, assim pela Eucaristia, comemos a Cristo.
RESPOSTA À SEGUNDA. — A Eucaristia é o sacramento perfeito da paixão do Senhor, pois contém o próprio Cristo padecente. Por isso não podia ser instituído antes da Encarnação; mas então vigoravam os sacramentos que apenas eram prefigurativos da paixão do Senhor.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Este sacramento foi instituído na ceia, a fim de ser no futuro o memorial da paixão do Senhor. depois de ela consumada. Por isso o Senhor diz sinaladamente:
Todas as vezes que o fizerdes, falando no futuro.
RESPOSTA À QUARTA. — A instituição responde à ordem da intenção. Ora, o sacramento da Eucaristia, embora posterior ao batismo em perfeição, foi contudo anterior na intenção. Por isso tinha de ser instituído primeiro. - Ou podemos dizer que o batismo já de certo modo estava instituído por ocasião do batismo mesmo de Cristo. Por isso já certos foram batiza dos no batismo de Cristo, como lemos na Escritura.