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Art. 6 — Se às crianças o batismo confere a graça e as virtudes.

O sexto discute-se assim. — Parece que às crianças o batismo não confere a graça e as virtudes.
 
1. — Pois, graça e virtudes não se podem ter sem fé e caridade. Ora, a fé, como diz Agostinho, está na vontade do crente. Semelhantemente, a caridade supõe a vontade de amar. Ora, as crianças não tendo o uso da von­tade, não têm fé nem caridade. Logo, as crian­ças com o batismo não recebem nem a graça nem as virtudes.
 
2. Demais. — Aquilo do Evangelho - Fará obras ainda maiores - diz Agostinho: Para fazer de um ímpio um justo, Cristo obra nele, mas não sem ele. Ora, a criança, não tendo o uso do livre arbítrio, não coopera com Cristo para a sua justificação, e até, às vezes se lhe opõe o quanto pode. Logo, não é justificada pela graça e pelas virtudes.
 
3. Demais. — O Apóstolo diz: Ao que não obra e crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é imputada a justiça, segundo o decreto da graça de Deus. Ora, a criança não crê na­quele que justifica o ímpio. Logo, não recebe a graça justificante nem as virtudes.
 
4. Demais. — O que fazemos com intenção carnal não tem efeito espiritual. Ora, às vezes as crianças são levadas ao batismo com a intenção carnal de recuperarem a saúde do corpo. Logo não recebem o efeito espiritual da graça e das virtudes.
 
Mas, em contrário, diz Agostinho: As crianças, renascendo pelo batismo, morrem ao pecado que contraíram ao nascer. De tal sorte que se lhes aplica o dito do Apóstolo: Fomos sepulta­dos com ele para morrer pelo batismo. E acres­centa: Para que como Cristo ressurgiu dos mor­tos pela glória do Padre, assim também nós andemos em novidade de vida. Ora, a novidade de vida resulta da graça e das virtudes. Logo, às crianças o batismo confere a graça e as vir­tudes.
 
SOLUÇÃO. — Certos antigos ensinaram que o batismo não confere às crianças a graça nem as virtudes; mas lhes imprime o caráter de Cris­to, por cuja virtude, quando chegarem à idade de razão, receberão a graça e as virtudes. ­Mas isto é falso por duas razões. - Primeiro, porque as crianças, como os adultos, se tornam pelo batismo membros de Cristo por onde e necessàriamente, hão de receber da cabeça o influxo da graça e da virtude. - Segundo, porque de acordo com tal opinião, as crianças mor­tas depois do batismo não alcançariam a vida eterna, segundo o Apóstolo: A graça de Deus é a vida eterna. E assim de nada lhes aproveita­ria o terem sido batizadas. - Quanto à causa desse erro, foi não saberem distinguir entre o habito e o ato. E assim, vendo as crianças incapazes de atos de virtude, pensavam que depois do batismo de nenhum modo tinham a virtude. Ora, essa impotência de obrar não existe nas crianças por defeito dos hábitos, mas por impedimento corporal; assim como os ador­mecidos, embora tenham o hábito das virtudes, não lhes podem, contudo praticar os atos, por causa do sono.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — ­A fé e a caridade residem na vontade humana, mas com a diferença que os hábitos dessas vir­tudes e de todas as outras se fundam na potên­cia da vontade, existente nas crianças; ao passo que os atos das virtudes implicam o ato da vontade, e desse são elas capazes. E em tal sen­tido Agostinho diz, no mesmo lugar: A criança, embora ainda não tenha a fé, que supõe a von­tade do crente, torna-a contudo fiel o sacra­mento mesmo da fé que causa o hábito dessa virtude.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como diz Agostinho: Não renasce da água e do Espírito Santo senão quem quer. E isso se deve entender, não das crianças, mas dos adultos. Do mesmo modo, dos adultos se deve entender, que Cristo não nos justifica sem nós. - Quanto ao fato de as crianças, que vão ser batizadas, relutarem o quanto as forças lhes permitem, não lhes é ele imputável; pois, não sabem o que fazem. a ponto de não as considerarmos autores do ato pra­ticado.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como diz Agostinho, aos pequeninos a Igreja empresta os pés dos outros para virem, o coração dos outros para crerem, a língua dos outros para confessarem. E assim, as crianças crêem não por ato próprio, mas pela fé da Igreja, que lhes é comunicada. E em virtude dessa fé lhes é conferida a graça e as virtudes.
 
RESPOSTA À QUARTA. — A intenção carnal com que se levam as crianças ao batismo em nada as prejudica; assim como também a culpa de um não prejudica a outro, que nela não con­sentiu. Donde o dizer Agostinho: Não te deixes perturbar pelo facto de certos apresentarem as crianças ao batismo, não na fé que a graça espi­ritual os fará nascer para a vida eterna, mas na idéia de ser o batismo um remédio para con­servarem ou adquirirem a saúde do corpo. Pois não lhes vai impedir a regeneração o jato de não serem apresentados com a intenção de serem regenerados.

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