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Art. 2 — Se é da essência da virtude humana ser um hábito operativo.

(III Sent., dist. XXIII. Q. 1, a. qª 1).
 
O segundo discute-se assim. — Parece que não é da essência da virtude humana ser um hábito operativo.
 
1. — Pois, diz Túlio, o que se dá com a saúde e a beleza do corpo se dá também com a virtude da alma1. Ora, a saúde e a beleza não são hábitos operativos. Logo, também não o é a virtude.
 
2. Demais — Há, nos seres naturais, virtude, não só para agir, mas também para existir; pois, vemos claramente no Filósofo2, que certos seres têm a virtude de existir sempre; outros a de existir, não sempre, mas durante um determinado tempo. Ora, a virtude natural se comporta, nos seres naturais, como a virtude humana, nos racionais. Logo, também a virtude humana é relativa, não só ao agir, mas também ao existir.
 
3. Demais. — O Filósofo diz3, que a virtude é uma disposição do perfeito para o ótimo. Ora, o ótimo, para o qual o homem se dispõe pela virtude, é o próprio Deus, como Agostinho4 o prova; para o qual ela se dispõe pela assimilação. Logo, parece que a virtude deve ser denominada uma certa qualidade da alma ordenada para Deus, enquanto que nos torna semelhantes a ele, e não, ordenada para a operação. Logo, não é um hábito operativo.
 
Mas, em contrário, o Filósofo diz, que a virtude de um ser é o que lhe torna boa a operação5.
 
Solução. — A virtude, conforme a significação mesma da palavra, implica uma certa perfeição da potência, com já se disse6. Ora, como há dupla potência — uma relativa ao ser e outra, ao agir — a perfeição de uma e outra se chama virtude. A potência para o ser, porém, se funda na matéria, que é um ser potencial; ao passo que a potência para agir se funda na forma, que é o princípio da ação, porque um ser age na medida em que é atual. Ora, na constituição do homem, o corpo se comporta como matéria e a alma, como forma. Ora, o homem tem corpo como os brutos, como também tem as potências comuns ao corpo e à alma. Só as faculdades próprias à alma, i. é, as racionais, é que pertencem exclusivamente ao homem. Por onde, a virtude humana, de que agora tratamos, não pode pertencer ao corpo, mas somente ao que é próprio da alma. Logo, ela não implica em ordenar-se para o ser, mas antes, para a ação. E, portanto, é da essência da virtude humana ser um hábito operativo.
 
Donde a resposta à primeira objeção.— O modo da ação é conseqüente à disposição do agente, pois um ser, assim como é, assim age. Por onde, sendo a virtude o princípio de certas operações, é necessário preexista no agente, relativamente à virtude, alguma disposição que lhe seja conforme. Ora, a virtude é que torna a operação ordenada. Por onde, a virtude, em si mesma, é uma disposição ordenada da alma, pela qual as potências desta se ordenam, de certo modo, uma para as outras e para o que lhes é exterior. E portanto, a virtude, enquanto disposição conveniente da alma, assimila-se à saúde e à beleza, que são disposições próprias do corpo. Mas isto não impede que a virtude seja também um princípio de operação.
 
Resposta à segunda. — A virtude relativa ao existir não é própria do homem; mas só a relativa à atividade da razão, que lhe é própria a ele.
 
Resposta à terceira. — A substância de Deus, sendo a sua ação, a suma assimilação do homem com Deus é fundada em alguma operação. Por onde, como já se disse7, a felicidade ou beatitude, pela qual o homem sobretudo se conforma com Deus, fim da vida humana, consiste na ação.

  1. 1. IV De Tuscul. Quaest.
  2. 2. I De Caelo.
  3. 3. VII Physicorum
  4. 4. De moribus Ecclesiae, cap. III, XIV.
  5. 5. II Ethic., lect. VI.
  6. 6. Q. 55, a. 1.
  7. 7. Q. 31, a. 2.
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