Em 24 de novembro de 1843, Nosso Senhor disse as seguintes palavras à carmelita francesa, Irmã Maria de São Pedro:
“A Terra está coberta de crimes! Meu Pai está irado com a violação dos três primeiros Mandamentos de Deus. A blasfêmia para com o Santo Nome de Deus e a profanação do Santo Dia do Senhor completam a medida das iniqüidades. Esses pecados subiram ao Trono de Deus e provocaram sua cólera, que irromperá se sua justiça não for aplacada. Em nenhuma outra época esses crimes alcançaram tal ponto.”
Este pequeno escrito traz à luz as revelações de Nosso Senhor à Irmã Maria de São Pedro, uma carmelita francesa que viveu de 1816 a 1848. Essas revelações gozam de plena aprovação da Igreja Católica, tendo sido altamente recomendadas pelo renomado beneditino do século XIX, Dom Guéranger, autor da célebre obra L'Année Liturgique (O Ano Litúrgico).
As palavras de Nosso Senhor à Irmã Maria parecem mais urgentes hoje do que quando recebidas há mais de 170 anos. Elas fazem parte de uma “tradição” de avisos do Céu para a humanidade sobre seus ultrajes contra Deus, a grande necessidade de reparação e a ameaça de castigos divinos de um Deus “que já está muito ofendido”. Essas revelações à Irmã Maria de São Pedro constituem também um fundamento para as aparições de 1917 de Nossa Senhora em Fátima.
Padre Janvier
Este estudo é baseado em materiais de fonte primária, entre os quais destaca-se Vie de la Sœur Saint-Pierre (A Vida da Irmã Maria de São Pedro). Esse livro, publicado apenas 36 anos após a morte da carmelita, foi escrito pelo Padre Pierre Janvier, um fervoroso promotor das Obras de Reparação. Sua tradução para o inglês, de 1884, traz o Imprimatur de 1881 de Dom Charles-Théodore Colet, Arcebispo de Tours. 1
Desde o início, Padre Janvier relata que sua narração da vida da Irmã Maria é baseada em cinco fontes primárias francesas:
Também foi utilizado como fonte o livro do Padre Janvier sobre Léon Dupont, publicado apenas nove anos após a morte do venerável.
Léon Dupont esteve intimamente ligado ao convento da Irmã Maria de São Pedro. Conhecido como o “Santo Homem de Tours”, foi o mais zeloso promotor dos pedidos de Nosso Senhor por reparação e devoção à Sagrada Face. Possuía pendurada na parede de sua sala de estar uma grande imagem da Sagrada Face, diante da qual ardia uma lâmpada com óleo sagrado. Essa sala, convertida em oratório com permissão do bispo, recebia inúmeros visitantes. Por meio da devoção à Sagrada Face, tantos milagres aconteceram na sala de Léon Dupont que o Beato Pio IX chegou a chamá-lo “o maior taumaturgo da história da Igreja”. 2
Aqui, entretanto, nosso foco será a Irmã Maria de São Pedro, que, de 1843 a 1848, recebeu mensagens especiais do Céu em relação à “Obra de Reparação” pelos pecados de blasfêmia e pela profanação dos Domingos, assim como pedidos de reparação à Sagrada Face de Jesus.
“Trocada no Berçário”?
A Irmã Maria de São Pedro nasceu em 4 de outubro de 1816, Festa de São Francisco de Assis, tendo como nome de batismo Perrine Elvery. Ela conta um episódio de quando tinha apenas um mês de idade:
“Minha babá, tendo saído por um instante, deixou-me no berço. Uma de suas filhas pequenas pegou-me no colo e aproximou-me do fogo, querendo sem dúvida me aquecer; mas escorreguei de seus braços e caí no fogo. Conservei para sempre no rosto uma marca daquele acidente.” 3
Apesar de seus piedosos pais a terem educado na Fé e nos rudimentos do ensino católico, Perrine não era, por assim dizer, uma criança angelical. Sua própria mãe lamentava o fato de a pequena ser tão levada: “Certamente foi trocada no berçário: não é possível que um filho nosso seja tão mau como essa criança.” 4
“Colérica, teimosa e muito imprudente” 5 é como a Irmã Maria de São Pedro descreveu mais tarde seus traços da primeira infância. Apesar de suas faltas, entretanto, a pequena Perrine possuía um bom espírito e aceitava os castigos que suas más ações lhe mereciam; por fim, conquistou autodomínio, aprendeu suas devoções e, ainda em tenra idade, desenvolveu intenso amor pela oração.
Perrine tinha apenas doze anos quando sua mãe morreu. Não passou muito tempo, foi trabalhar como costureira. Alimentando seu “dom de oração”, como o Padre Janvier o descreve, fazia comunhões espirituais freqüentes, mesmo quando ocupada com seus afazeres cotidianos. Sua santidade e senso de recolhimento irradiavam sobre as colegas de trabalho, que logo passaram a procurá-la em busca de aconselhamento espiritual e edificação.
Acreditando ser chamada a uma vocação religiosa, colocou-se nas mãos de um diretor espiritual que foi um verdadeiro dom do Céu. Esse santo confessor declarou que, ao lidar com alguém que poderia ter vocação, tinha “por princípio só enviar ao convento aqueles aspirantes suficientemente provados, esperando que, uma vez que entrassem no claustro, não os veria sair de lá.” 6 O sacerdote guiou-a na preparação para sua vida como religiosa, especialmente ensinando-a como vencer suas paixões.
Numerosos obstáculos retardaram sua entrada na vida religiosa. Por um tempo, parecia que seria conduzida à Ordem Hospitaleira, o que não era sua primeira escolha. Seu grande desejo era entrar para o Carmelo. Ainda assim, Nosso Senhor a confortava durante esse período de aflição. Após receber a Sagrada Comunhão certo dia, no que pode ter sido a primeira comunicação mística, Nosso Senhor lhe falou interiormente:
“Minha filha, amo-te muito para te abandonar mais tempo a tuas perplexidades; não serás irmã hospitaleira; isto é apenas uma provação; já cuidamos de tua recepção; serás carmelita.” E uma voz poderosa repetiu várias vezes: “serás carmelita.” 7
Como boa católica, anotou imediatamente essas palavras para submetê-las ao diretor espiritual. Ao entregar o papel dobrado ao confessor, e antes que este conhecesse seu conteúdo, o padre irrompeu com suas próprias boas notícias. Tinha acabado de receber uma carta que o informava que ela havia sido aceita no mosteiro das carmelitas em Tours.
Uma Herança de Fidelidade
O Carmelo de Tours, que havia aberto suas portas para a jovem Perrine, era abençoado com uma rica história. Foi fundado em 1608 pela Irmã Ana de São Bartolomeu, que viria a se tornar a primeira Superiora da casa. Amiga devota de Santa Teresa d’Ávila, Irmã Ana esteve presente em seu leito de morte.
Quando as carmelitas chegaram a Tours em 1608, encontraram a cidade “repleta de hereges” descendentes dos huguenotes. A presença das santas carmelitas, como sempre, ocasionou a conversão de vários desses não-crentes à Fé Católica. O legado desse Carmelo foi de fidelidade e coragem diante de alguns dos piores inimigos da Igreja. Não apenas permaneceu firme à verdade católica durante a heresia jansenista, como sobreviveu à Revolução Francesa, embora com cicatrizes. Durante a Revolução, o governo pressionou as freiras a fazerem o novo “Juramento de Lealdade”. Nenhuma delas se submeteu. Por essa recusa, foram retiradas do convento e lançadas num pátio onde ficaram expostas a intempéries climáticas de toda sorte. Uma freira idosa e cega de 87 anos morreu devido a esses maus tratos. Ainda assim, qualquer que fosse o ambiente que as cercasse, as freiras perseguidas mantiveram vivas a Fé, a Regra e o espírito de sua Ordem. Talvez tenha sido durante esse período que melhor entenderam a descrição da vocação carmelita feita por Santa Teresa d’Ávila: “Minhas filhas, não estais aqui para repousarem e vos alegrarem, mas para trabalharem, sofrerem e salvarem as almas!” 8
Em 1822, tendo a França optado por um ateísmo mais amistoso e gentil, foi permitido que as carmelitas retornassem a seu convento em Tours. Dezessete anos depois, a jovem Perrine, que veio a se tornar a Irmã Maria de São Pedro, chegou à casa, foi admitida à Ordem, perseverou alegremente em seu noviciado e fez sua profissão definitiva de votos em junho de 1841.