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Introdução ao domingo da Septuagésima

“Ide vós também para a minha vinha” (Evangelho)

 

Paramentos roxos

 

A aproximação dos textos do Breviário e do Missal, esta semana, esclarece-lhes singularmente o sentido e a importância. As lições e os responsórios do Ofício da noite são tirados do Gênese e relatam a história da criação do mundo e do homem, a queda dos primeiros pais, a promessa do Redentor e finalmente a morte de Abel e a sequela das gerações até Noé. “No princípio, diz o Livro Santo, Deus criou o Céu e a Terra, formou o homem e colocou-o num jardim delicioso para o cultivar”. Jesus Cristo, observa São Gregório, diz-nos que o Reino dos Céus é semelhante a um pai de família que assalaria operários para a sua vinha. Ora, quem pode melhor representar o pai de família do que o Criador, que governa com a sua Providência tudo o criado e traz neste mundo os seus escolhidos como o Senhor traz os servos em sua casa? A vinha é a Igreja. Todos os que se aplicaram com retidão à prática do bem e exortaram os outros com a palavra ou com o exemplo a enveredar pelos caminhos da virtude, são operários desta vinha. Pelos da primeira, da terceira, da sexta e da nona hora, quis o Senhor designar o povo judeu, que desde o princípio se esforçou por servir a Deus na pessoa dos seus profetas e dos seus santos e não cessou de trabalhar no cultivo da vinha. Pelos da undécima, designou os gentios e a eles se dirige: “Porque estais aqui o dia todo sem fazer nada? ”Todos os homens são, pois, convidados a trabalhar na vinha do Senhor, quer dizer, na própria santificação e na alheia, e glorificar por este modo a Deus. Mas Adão, falhou à sua missão: “porque tu comeste do fruto da árvore que te ordenara não comesse, a terra será maldita e tirarás dela o teu sustento à força de trabalho. Só dará espinhos e cardos. Comerás o pão no suor do teu rosto até que voltes à terra donde saíste”. Exilados do Paraíso, diz S. Agostinho, o primeiro homem comunicou a pena de morte e reprovação a todos os descendentes. O gênero humano, assim condenado, foi, por assim dizer, afundado na desgraça que vai arrastando consigo através das misérias da vida. Os textos da Missa estão cheios dos mesmos pensamentos. “Dores de morte me cercaram”, diz o Intróito. E é com justiça, diz a Oração, que sofremos pelos nossos pecados. A Epístola apresenta-nos a vida como um circo onde é necessário lutar para ganhar a coroa. O denário da vida eterna, acrescenta o Evangelho, será dado só àquele que trabalhar na vinha do Senhor. Deus na sua sabedoria preferiu, diz S. Agostinho, tirar o bem do mal a não permitir mal algum. Deus com efeito compadeceu-se dos homens e prometeu-lhes um segundo Adão que restabeleceria a ordem perturbada pelo primeiro. O Paraíso era “a sombra duma vida mais perfeita”. Exilados de lá com Adão, perdêramos o direito a essa vida que ele representava. Porém, o segundo Adão veio reabrir-nos a porta e dar possibilidade de lá reentrarmos. Senhor, canta a Igreja, Vós sois o nosso auxílio na angústia e na indigência. Tendes o perdão convosco, iluminai sobre nós a Vossa face e salvai-nos.

A Missa da Septuagésima assim estudada prepara-nos para começar este novo período do ano litúrgico com uma compreensão mais perfeita dos mistérios pascais. Aprende-se melhor deste modo tudo o que a Páscoa representa e o que a Igreja nos ensina quando diz: “Deus criou o homem duma maneira admirável e resgatou-o de maneira mais admirável ainda”.

 

Do Evangelho: O amanhecer do mundo, a primeira hora, diz S. Gregório, pode entender-se do tempo que vai de Adão até Noé; a terceira, de Noé até Abraão; a sexta, de Abraão até Moisés; a nona, de Moisés até a vinda do Salvador; a undécima, desde a vinda do Salvador até o fim do mundo. Todos os homens são, portanto, chamados a trabalhar para a glória de Deus e a receber como salário o denário da vida eterna.

 

Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.

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