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Art. 3 – Se quem se obrigou por voto a entrar em religião precisa cumpri–lo.

O terceiro discute–se assim. – Parece que quem se obrigou por voto a entrar em religião não precisa cumpri–lo.

1. – Pois, diz uma decretal: Consaldo presbítero, sob o império da doença e da força do sofrimento, prometeu fazer–se monge; mas, não entrou no mosteiro, não se entregou entre as mãos do abade nem lançou por escrito a sua promessa, confiando a um advogado o seu benefício eclesiástico; e depois de restabelecido recusou fazer–se monge. E acrescenta: Julgamos e determinamos, que o referido sacerdote entre na posse do seu benefício e da sua igreja e não seja inquietado nessa posse. Ora, isto não poderia ser se estivesse obrigado a entrar em religião. Logo, parece que quem se obrigou por voto a entrar em religião não precisa cumpri–lo.

2. Demais. – Ninguém está obrigado ao que está além do poder. Ora, o entrar alguém em religião não está no seu poder; pois, para tal, deve ter o assentimento daqueles em cuja religião quer entrar. Logo, parece que não precisa cumprir o voto pelo qual se obrigou a entrar em religião.

3. Demais. – Por um voto menos útil não pode ser derrogado outro mais útil. Ora, o cumprimento do voto de entrar em religião impediria o voto de ser cruzado, na defesa da Terra Santa. O que é mais útil, pois quem fizer esse voto alcança a remissão dos pecados. Logo, parece que o voto que obriga a entrar em religião não deve ser necessariamente cumprido.

Mas, em contrário, a Escritura: Se fizeste algum voto a Deus, trata de o cumprir logo, porque lhe desagrada a promessa infiel e imprudente. E àquela passagem – Fazei votos ao Senhor vosso Deus e cumpri–os – diz a Glosa: Fazer voto é um ato da vontade; mas, feita a promessa do voto, há necessidade de cumpri–la.

SOLUÇÃO. – Como dissemos, quando dele tratámos, o voto é uma promessa feita a Deus em matéria que lhe concerne. Ora: Gregório diz: Se entre homens de boa fé por nenhum motivo se podem romper os contratos, com maior razão a promessa, pela qual se fez um pacto com Deus, não pode ser rompida sem provocar um castigo. Por isso, quem fez um voto está obrigado a cumpri–lo necessariamente contanto que se trate de matéria concernente a Deus. Ora, como é manifesto, a entrada em religião incide por excelência em matéria divina, pois, quem assim procede totalmente se consagra ao serviço divino, como do sobredito resulta. Donde se conclui, que quem se obriga por voto a entrar em religião está obrigado a cumpri–lo, na medida em que pretendeu obrigar–se pelo voto. De modo que, se entendeu obrigar–se absolutamente, está obrigado a cumpri–lo logo que seja possível, cessado que for algum impedimento legítimo. Se porém se obrigou depois de um certo tempo e sob certa condição, está obrigado a entrar em religião quando chegar o tempo ou realizar–se a condição.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – O referido presbítero não fez voto solene mas, simples. Por isso, não se tornou monge de modo a poder ser coagido pelo direito a permanecer no mosteiro e abandonar a sua igreja. Contudo, no foro da consciência, dever–se–ia lhe aconselhar a entrada em religião com o abandono de todos os seus bens. Por isso, o Papa aconselhou ao bispo de Grenoble, que assumira o episcopado depois de ter feito voto de entrar em religião e de não o ter cumprido, que se quisesse viver em paz com a sua consciência, resignasse o governo da igreja e cumprisse para com o Altíssimo os seus votos.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Como dissemos, quando tratámos do voto, quem se obrigou por ele a entrar numa certa religião, deve fazer tudo o que pode para ser nela recebido. E se teve simplesmente a intenção de se obrigar a entrar em religião, e não for recebido numa, está obrigado a procurar outra. Mas, se se obrigou especialmente a entrar numa determinada religião, não está obrigado senão pelo modo por que o fez.

RESPOSTA À TERCEIRA. – O voto de religião, sendo perpétuo, é maior que o de peregrinação à Terra Santa, que é temporal. E Alexandre III diz: Não pode ser considerado réu de ter quebrado o voto quem resolveu comutar o voto de um serviço temporal no voto de viver perpetuamente em religião. – E demais, pode–se racionalmente responder que quem fez o voto de entrar em religião também consegue a remissão de todos os pecados. Pois, por umas esmolas, que fez, pode um homem desde logo satisfazer pelos seus pecados, conforme aquilo da Escritura – rime os teus pecados com esmola – com muito maior razão, como satisfação por todos eles basta consagrar–se totalmente ao serviço divino, entrando numa religião, o que sobrepuja todos os géneros de satisfação, mesmo o da penitência pública, corno se lê numa decretal; assim como também o holocausto excede o sacrifício, no dizer de Gregório. Por isso se lê na Vida dos Padres do Deserto, que alcançam a mesma graça os que entram em religião, que os batizados. Se porém, não ficassem assim absolvidos de todo reato da pena, contudo o ingresso em religião seria mais útil que a peregrinação à Terra Santa, como meio de progredir no bem, que todavia prepondera sobre a absolvição da pena.

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