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Art. 3 – Se a virgindade é uma virtude.

O terceiro discute–se assim. – Parece que não é uma virtude a virgindade.

1. – Pois, nenhuma virtude existe em a nossa natureza como tal, como diz Aristóteles, Ora, a virgindade existe em nós por natureza mesma nossa; pois, todos são virgens logo depois de nascerem. Logo, a virgindade não é uma virtude.

2. – Demais. – Quem possui uma virtude as tem todas, como se disse. Ora, certos tem as outras virtudes, que não tem a virgindade; do contrário, como ninguém pode sem virtude chegar ao reino dos céus, ninguém poderia também chegar a ele, sem a virgindade; o que seria condenar o matrimônio. Logo, a virgindade não é uma virtude.

3. Demais. – Toda virtude se recupera pela penitência. Ora, a virgindade não se repara pela penitência e por isso diz Jerônimo: Deus, que tudo pode, não pode restituir a quem perdeu a virgindade ao seu estado anterior. Logo, parece que a virgindade não é uma virtude.

4. Demais. – Nenhuma virtude se perde sem pecado. Ora, a virgindade se perde sem pecado, isto é, pelo matrimônio. Logo, a virgindade não é uma virtude.

5. Demais. – A virgindade entra na mesma divisão que a viuvez e a pudicicia conjugal. Ora, nenhuma delas é considerada virtude. Logo, a virgindade não é uma virtude.

Mas, em contrário, diz Ambrósio: A integridade do amor nos exorta a dizer alguma coisa sobre a virgindade, de modo que não toquemos apenas de passagem na que é a virtude principal para a vida do gênero humano. 

SOLUÇÃO. – Como o demonstra Jerônimo, erro foi de Joviniano ensinar que a virgindade não deve ser preferida ao matrimônio. E esse erro é principalmente eliminado tanto pelo exemplo de Cristo, que escolheu mãe virgem e conservou ele próprio a virgindade, como pela doutrina do Apóstolo, que aconselhou a virgindade como um bem melhor. E ainda pela razão; quer porque, o bem divino é superior ao humano; quer porque o bem da vida contemplativa é superior ao da ativa. Ora, a virgindade se ordena ao bem da alma, segundo a vida contemplativa, que consiste em estarmos cuidadosos das coisas que são de Deus. Ao passo que o casamento se ordena ao bem do corpo, que é a multiplicação corporal do gênero humano e pertence à vida ativa; porque o homem e a mulher, vivendo em matrimônio hão de necessariamente cuidar das coisas que são do mundo, como está claro no Apóstolo. Por onde e indubitavelmente a virgindade é preferível à continência conjugal.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – O mérito não se funda só no gênero do ato mas sobretudo, no ânimo de quem age. Ora, Abraão tinha o ânimo disposto a conservar a virgindade, se o fosse em tempo conveniente; por isso, o mérito da continência conjugal nele se equipara ao da continência virginal em João, quanto ao prêmio essencial; mas não, quanto ao acidental. Por isso diz Agostinho, que S. João combateu por Cristo no celibato e Abraão, no casamento, conforme as diferenças de tempo; mas, ao passo que S. João tinha em ato a virtude da continência, Abraão só em hábito a possuía.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Embora a virgindade seja melhor que a continência conjugal, pode contudo, o casado ser melhor que o virgem por duas razões. – Primeiro, relativamente à castidade mesma; isto é, se o casado tiver o ânimo mais disposto a guardar a virgindade, se for necessário, do que o atualmente virgem. Por isso Agostinho instrui o virgem para que diga: Eu não sou melhor que Abraão, mas é melhor a castidade do solteiro que a do casado. E logo depois dá a razão: O que eu agora faço ele melhor o faria se o tivesse de fazer; e o que eles fizeram também eu agora faria se o devesse. – Segundo, porque talvez o que não é virgem tenha uma virtude mais excelente. Donde o dizer Agostinho: Como sabe a virgem, embora cuidadosa das coisas de Deus, que está madura para o martírio e se não tem alguma fraqueza da alma que dele o afaste? Ao passo que a mulher a que se julgava preferível, talvez já possa beber o cálice da paixão do Senhor.

RESPOSTA À TERCEIRA. – O bem comum é superior ao bem privado, se forem do mesmo gênero; mas, o bem privado pode ser superior, no seu gênero. E, deste modo, a virgindade dedicada a Deus é preferível à fecundidade carnal. Por isso diz Agostinho, que a fecundidade da carne, mesmo a daquelas que, neste mundo, não tem outro fim, no casamento, senão o de dar filhos a Cristo, não pode compensar, segundo se deve crer, a perda da virgindade.

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