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Art. 2 – Se o pecado do temor se opõe à coragem.

O segundo discute–se assim. – Parece que o pecado do temor não se opõe à coragem.

1. – Pois, a coragem enfrenta os perigos de morte, como se estabeleceu, Ora, o pecado do temor nem sempre se funda no perigo de morte; porque, aquilo da Escritura – Bem–aventurados todos os que temem ao Senhor – diz a Glosa: Temor humano é aquele pelo qual tememos perder a vida ou os bens temporais. E àquilo do Evangelho – Foi orar terceira vez, dizendo as mesmas palavras – comenta a Glosa: Há três maus temores, a saber, o da morte, da dor e da humilhação. Logo, o pecado do temor não se opõe à coragem.

2. Demais. – O que é sobretudo louvável, no ato de coragem, é o nos expormos ao perigo de morte. Ora, às vezes, certos, por temor da escravidão, ou da ignomínia, expõem–se ao perigo de morte; assim, narra Agostinho, que Catão, para não cair sob o poder de césar, deu–se a morte. Logo, o pecado do temor não se opõe à coragem, mas, ao contrário, tem semelhança com ela.

3. Demais. – Todo desespero procede de algum temor. Ora, o desespero não se opõe à coragem, mas antes, à esperança, como se estabeleceu. Logo, também o pecado do temor não se opõe à coragem.

Mas, em contrário, o Filósofo considera a timidez oposta à coragem.

SOLUÇÃO. – Como dissemos todo temor procede do amor, pois, não tememos senão o contrário do que amamos. Ora, o amor não é determinado a nenhum género de virtude ou de vício. Mas, o amor ordenado se inclui em qualquer virtude; pois, qualquer pessoa virtuosa ama o bem próprio da virtude. Ao contrário, o amor desordenado se inclui em qualquer pecado; pois, do amor desordenado procede a cobiça desordenada. Por onde e semelhantemente, o temor desordenado se inclui em qualquer pecado; assim, o avarento teme perder o dinheiro, o intemperante, o prazer e assim por diante. Ora, o principal de todos os perigos é o da morte, como o prova Aristóteles. Logo, a desordenação oriunda desse temor se opõe à coragem, que enfrenta os perigos da morte. Donde o dizer–se, por antonomásia, que a timidez se opõe à coragem.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ­ Os lugares citados se referem ao temor desordenado em sentido geral, que pode ser oposto a diversas virtudes.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Os atos humanos sobretudo, se julgam pelo fim, como do sobredito se colhe. Ora, é próprio do homem forte expor–se ao perigo de morte, para a consecução de algum bem. Mas, quem se expõe aos perigos de morte para evitar a escravidão ou qualquer sofrimento, deixa–se vencer do temor, que é contrário à coragem. Por isso diz o filósofo, que morrer para fugir da pobreza ou de qualquer sofrimento não é próprio do corajoso, mas antes, do irmão; pois  é fraqueza evitar a adversidade das paixões ou dos sofrimentos.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Conforme dissemos, assim como a esperança é o princípio da audácia, assim à temor, do desespero. Por onde, assim como o forte, que é moderadamente audacioso, pressupõe a esperança, assim e ao contrário, o desespero procede de algum temor. Mas não é forçoso que qualquer desespero proceda de qualquer temor, senão do que lhe corresponde  genericamente. Ora, o desespero oposto à esperança, concernindo a matéria divina, pertence a outro gênero que o do temor oposto à coragem, que concerne aos perigos de morte. Por isso, a objeção não colhe.

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