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Art. 2 – Se, da parte do homem, é necessária alguma preparação ou disposição para a graça.

 (Qu. Seq., a. 3; IV Sent., dist. XVII, a. 2, qª 1, 2; In Ion., cap. IV, lect. II; Ad Hebr., cap. XII, lect. III).


O segundo discute-se assim. – Parece que, da parte do homem, não é necessária nenhuma preparação ou disposição para a graça.

1. – Pois, como diz o Apóstolo, ao que obra, não se lhe conta o jornal por graça, mas por dívida. Ora, a preparação do homem pelo livre arbítrio só é possível por alguma operação. Logo, não há lugar para a graça.

2. Demais. – Quem se ataca no pecado não se prepara a receber a graça. Ora, a certos, que nele se atacam, foi dada a graça. Tal é o caso de Paulo, que a alcançou, respirando ainda ameaças e morte contra os discípulos do Senhor. Logo, da parte do homem, não é necessária nenhuma preparação para a graça.

3. Demais. – Um agente de poder infinito não precisa de matéria predisposta, pois nem dela, em si mesma, precisa, como o demonstra a criação, a que é comparado a infusão da graça, chamada nova criatura. Ora, só Deus, cujo poder é infinito, causa a graça, como se disse. Logo, da parte do homem, não é necessária nenhuma preparação para alcançar a graça.

Mas, em contrário, diz a Escritura: Prepara-te a saíres ao encontro do teu Deus; e: Preparai os vossos corações para o Senhor.

SOLUÇÃO. – Como já dissemos, a graça tem duas acepções; ora, significa o dom habitual de Deus; ora, o auxílio de Deus, que move a alma para o bem. – Na primeira acepção, exige de nós uma preparação, porque nenhuma forma pode existir senão na matéria já predisposta. – Na segunda, não exige, da parte do homem, nenhuma preparação, quase preveniente ao auxílio divino; antes, qualquer preparação, que possa existir no homem, provém do auxílio de Deus, que move a alma para o bem. E sendo assim, o próprio bom movimento do livre arbítrio, pelo qual nos preparamos a receber o dom da graça, é um ato procedente da moção divina. E neste sentido, diz-se que o homem se prepara, conforme a Escritura: Da parte do homem está o preparar a sua alma; essa preparação provem principalmente de Deus, que move o livre arbítrio. E em tal acepção, se diz que a vontade humana é preparada por Deus, e que Deus lhe dirige os passos.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Certa preparação do homem para ter a graça vai simultaneamente com a infusão mesma dela. E tal operação é, certo, meritória; não, da graça, já possuída, mas da glória, que ainda não o é. Há porem outra preparação, imperfeita, para a graça, que ás vezes precede o dom da graça santificante, e contudo provém da moção divina. Essa preparação, porém, não basta para o mérito, enquanto o homem não foi justificado pela graça; porque nenhum mérito pode provir a não ser dela, como a seguir se dirá.

RESPOSTA À SEGUNDA. – O homem não pode preparar-se para a graça ele chegue à preparação perfeita, súbita ou paulatinamente. Donde o dizer a Escritura: A Deus é fácil o enriquecer de repente ao pobre. Ora, acontece algumas vezes, que Deus move o homem a algum bem, mas não perfeito; e essa preparação precede á graça. Outras vezes, porém, rápida e perfeitamente, move-o para o bem e ele recebe a graça de súbito, conforme a Escritura: Todo aquele que do Pai ouviu e aprendeu vem a mim. Ora, isto deu-se com Paulo que, de súbito, quando mais se atascava no pecado, teve o coração perfeitamente movido por Deus, que o fez ouvir, aprender e vir; por isso, conseguiu, de súbito, a graça.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Um agente de poder infinito não exige qualquer matéria preexistente ou predisposta, quase um pressuposto, por ação de outra causa. Contudo é necessário, conforme à condição da coisa a ser criada, causar nela tanto a matéria como a disposição devida para a forma. Semelhantemente, para Deus infundir a graça na alma, nenhuma preparação há exigida, que Ele não realize.

 

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