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Art. 5 ─ Se o fogo do juízo consumirá os outros elementos.

O quinto discute-se assim. ─ Parece que o fogo do juízo consumirá os outros elementos.

1. ─ Pois, diz a Glosa de Beda: O fogo do juízo, o mais enérgico de todos, consumirá os quatro elementos de que consta o mundo. Mas não os consumirá a todos totalmente, senão só dois; os outros dois os fará passar a um estado mais perfeito. Logo, parece que pelo menos dois elementos serão totalmente destruídos por esse fogo.

2. Demais. ─ A Escritura diz: O primeiro céu e a primeira terra se foram e o mar já não é. Ora, pelo céu entende-se o ar, como Agostinho o explica; e o mar é a reunião das águas. Logo, parece que os três elementos referidos serão totalmente destruídos.

3. Demais. ─ O fogo não purifica senão porque a sua ação se exerce sobre outras matérias. Ora, para poder purificar os outros elementos é necessário sejam estes matéria sobre que possa ele exercer-se. Portanto, terão que se transformar em substância ígnea. Logo, a sua natureza será destruída.

4. Demais. ─ A forma do fogo é a nobilíssima das formas que possa adquirir a matéria elementar. Ora, a referida purificação levará todas as cousas ao seu estado mais nobre. Logo, os outros elementos se converterão totalmente em fogo.

Mas, em contrário, aquilo do Apóstolo ─ A figura deste mundo passa ─ diz a Glosa: Passará a beleza, mas não a substância deste mundo. Ora, é a substância mesma dos elementos a constitutiva da perfeição do mundo. Logo, não será consumida a substância deles.
 
2. Demais. ─ Essa purificação final pelo fogo corresponderá à primeira, pela água. Ora, esta não destruiu a substância dos elementos. Logo, nem do fogo a destruíra.

SOLUÇÃO. ─ Há muitas opiniões sobre esta questão. Uns dizem, que a matéria de todos os elementos subsistirá, mas sofrerá mudança a imperfeição deles. Assim, dois deles, o ar e a terra, conservarão a sua forma substancial própria; os outros dois, o fogo e a água, não conservarão a sua forma substancial, mas tomarão a forma do céu. De modo que o céu será constituído dos três elementos seguintes ─ o ar, o fogo e a água; embora o ar conserve a mesma forma substancial que agora tem e pela qual recebe atualmente o nome de céu. Por isso também a Escritura não menciona senão o céu e a terra, quando diz: Vi um céu novo e uma terra nova. ─ Mas esta opinião é totalmente absurda. Pois, repugna à filosofia, que nos impede admitir que os corpos celestes sejam susceptíveis da forma do céu, por não terem matéria comum nem serem contrários uns aos outros. Repugna também à teologia, pois tal opinião não poderia salvar a perfeição do universo, na integridade das suas partes, desde que o privou de dois dos seus elementos. Por onde, pela palavra céu se entende um quinto corpo; entendendo-se por terra todos os mais elementos, como quando a Escritura diz ─ Louvai ao Senhor, os que sois da terra; e ainda: O fogo, o granizo, a neve, a geada, etc.
 
Por isso outros ensinam, que todos os elementos subsistirão na sua substância mas privados das suas qualidades ativas e passivas. Assim como também ensinam que nos corpos mistos os elementos subsistem nas suas formas substanciais, sem conservarem as suas qualidades próprias; ficam assim num estado médio, e o meio não é nenhum dos extremos. E este parece também o sentir de Agostinho, quando escreve: A conflagração última do mundo destruirá totalmente, no seu ardor devorante, as qualidades dos elementos corruptíveis constitutivos dos nossos corpos corruptíveis; mas, por uma transformação maravilhosa, a substancia deles receberá as qualidades apropriadas a corpos imortais. ─ Esta opinião porém não parece provável. Porque, as qualidades próprias dos elementos, sendo efeitos das formas substanciais, enquanto estas subsistirem, não poderão as referidas qualidades transformar-se, senão por uma ação violenta temporária. Assim vemos a água aquecida recuperar, pela sua virtude específica própria, a frigidez que por ação do fogo perdeu, contanto que subsista a espécie da água. Além disso, essas qualidades elementares são, como paixões próprias dos elementos, as constitutivas da perfeição secundária deles. Nem é provável que nessa final perfeição dos seres percam os elementos nenhuma das suas perfeições naturais.
 
Por onde, devemos responder, que os elementos subsistirão na sua substância e qualidades próprias, purificados porém da contaminação contraída pelos pecados dos homens, e da impureza neles resultantes da sua ação e paixão mútuas. Pois, cessado o movimento do primeiro móvel, já não mais terão os elementos terrestres ação nem paixão mútua. E a isso chama Agostinho as qualidades dos elementos corruptíveis, i. é, disposições naturais que os colocam nos limites da corrupção.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÂO. ─ Dizemos que o fogo do juízo final consumirá os quatro elementos pelos de certo modo purificar. A expressão seguinte ─ dois serão totalmente consumidos ─ não significa que esses dois serão destruídos na sua substância; mas que serão os mais privados das propriedades que agora tem. Esses, dizem uns serem o fogo e a água, cuias qualidades ativas ─ o calor e o frio ─ são as mais enérgicas e os princípios que mais contribuem para a corrupção dos outros corpos. E como na época da conflagração final o fogo e água, elementos ativos por excelência, não mais atuarão, consideram-se como havendo, mais que todos os outros, sofrido mudança na virtude que agora tem. Outros autores porém pensam, que esses dois elementos serão o ar e a água, por causa dos vários movimentos deles, resultantes do movimento dos corpos celestes. E como esses movimentos não serão da natureza, do fluxo e do refluxo do mar, do curso dos ventos e semelhantes, por isso tais elementos serão os que maiores mudanças sofrerão nas suas propriedades atuais.

RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Como o interpreta Agostinho, na expressão ─ o mar já não é ─ por mar pode entender-se o século presente, de que antes no mesmo lugar se diz: E o mar deu os mortos que estavam nele. ─ Tomada porém a palavra mar literalmente, devemos então dizer, que duas causas por ele se entendem ─ a substância das águas e as suas propriedades salinas, com a agitação das suas ondas. E neste segundo sentido o mar não subsistirá; subsistirá porém no primeiro.

RESPOSTA À TERCEIRA. ─ O fogo da conflagração final, não exercerá a sua ação senão como instrumento da providência e do poder divinos. Assim, não na exercerá sobre os outros elementos para os consumir totalmente, mas só para os purificar. Nem importa que a matéria sobre a qual se exercer esse fogo fique totalmente privada da sua espécie própria; como se dá com o ferro rubro que, tirado do fogo, volta ao estado próprio e primitivo, por virtude da espécie que não perdeu. Assim também será com os elementos purificados pelo fogo.

RESPOSTA À QUARTA. ─ Nas partes dos elementos não devemos considerar só o que a cada uma convém tomada de per si, mas também o que lhes cabe relativamente ao todo. Ora, digo que, embora a água fosse mais nobre se tivesse a forma do fogo, como também a terra e o ar, contudo o universo seria mais imperfeito e a matéria total dos elementos recebesse a forma ígnea.

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