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Art. 1 — Se a satisfação é uma virtude ou um ato de virtude.

O primeiro discute-se assim. Parece que a satisfação não é uma virtude nem um ato de virtude.
 
1. Pois, todo ato virtuoso é meritório. Ora, segundo parece, a satisfação não é meritória; porque, sendo o mérito gratuito, a satisfação supre um débito. Logo, a satisfação não é um ato de virtude.
 
2. Demais. Todo ato de virtude é voluntário. Ora, às vezes se nos dá satisfação contra a nossa vontade; como quando é punido pelo juiz quem nos ofendeu. Logo, a satisfação não é ato virtuoso.
 
3. Demais. Segundo o Filósofo, na virtude moral a eleição é o principal. Ora, a satisfação, respeitando principalmente os atos externos, não se faz por eleição. Logo, não é um ato de virtude. Mas, em contrário. A satisfação faz parte da penitência. Ora, a penitência é uma virtude. Logo, também ato de virtude é a satisfação.
 
2. Demais. Nenhum ato, salvo o virtuoso, contribui para o perdão do pecado; pois, um contrário destrói o outro. Ora, pela satisfação o pecado fica totalmente delido. Logo, a satisfação não é um ato de virtude.
 
SOLUÇÃO. De dois modos pode um ato ser chamado virtuoso. Primeiro, materialmente. E assim, qualquer ato sem malícia implícita, ou falta da circunstância própria, pode ser chamado virtuoso; pois, qualquer ato tal como andar, falar e outros, pode a virtude empregar para o seu fim. De outro modo, dizemos ser um ato formalmente virtuoso quando a sua denominação implica implícita a forma e a essência da virtude; assim, sofrer com valentia se considera ato de fortaleza. Ora, a idéia de mediedade é o que toda virtude moral tem de formal. Portanto, todo ato que implica a idéia de mediedade é chamado formalmente um ato de virtude. E sendo a igualdade um meio termo, implicado pelo nome mesmo de satisfação — pois, não dizemos satisfeito senão o que implica proporção de igualdade com outra causa — resulta que a satisfação também formalmente é um ato de virtude.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. Embora a satisfação em si mesma seja um débito, contudo enquanto praticamos essa obra voluntariamente, por nossa parte o ato se apresenta como gratuito. Assim, fazemos da necessidade virtude. Pois, se o débito diminui o mérito é por implicar a necessidade, que contraria a vontade. Portanto, a vontade consentindo no necessário não exclui a idéia de mérito.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. O ato de virtude não implica o voluntário no paciente, mas no agente, por ser ato deste. Por onde, como aquele contra o qual o juiz exerce a vindita se comporta como paciente, quanto à satisfação, e não como agente, não é necessário seja a sua satisfação voluntária, senão só ao juiz agente.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — O principal na virtude pode ser considerado a dupla luz. Primeiro, como o principal nela, enquanto virtude. E assim, o elemento racional, ou o que mais se lhe aproxima, é o principal na virtude. De modo que a eleição e os atos inferiores, na virtude como tal, são o que há nela de principal. De outra maneira, podemos considerar o principal relativamente a uma determinada virtude. E então, o mais principal nela é o donde tira a sua determinação. Ora, em certas virtudes, os atos internos se determinam pelos externos; porque a eleição, comum a todas as virtudes, por isso mesmo que é a eleição de um tal ato, torna-se própria dessa virtude. E assim, os atos exteriores em certas virtudes são os mais principais. Tal é o caso também da satisfação.

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