O primeiro discute-se assim. — Parece que as virtudes não se recuperam pela penitência.
1. — Pois, as virtudes perdoadas pela penitência não se poderiam recuperar se a penitência não causasse as virtudes. Ora, a penitência, sendo uma virtude, não pode ser causa de todas; sobretudo por, serem certas virtudes, como a fé, a esperança e a caridade, conforme foi dito; naturalmente anteriores à penitência. Logo, não se recuperam pela penitência.
2. Demais. — A penitência consiste em certos atos do penitente. Ora, as virtudes gratuitas não são causadas pelos nossos atos; pois, como diz Agostinho, as virtudes Deus as faz nascerem em nós, sem nossa cooperação. Logo, parece que pela penitência não recuperamos as virtudes.
3. Demais. — O virtuoso pratica atos virtuosos sem dificuldades e com prazer; por isso diz o Filósofo, que não é justo quem não se compraz em atos justos. Ora, muitos penitentes ainda praticam com dificuldades atos virtuosos. Logo, pela penitência não recuperamos as virtudes.
Mas, em contrário, como lemos no Evangelho, o pai mandou ao filho penitente se lhe desse o seu primeiro vestido, que, segundo Ambrósio, representa o manto da sabedoria, que é acompanhada simultaneamente por todas as virtudes, segundo aquilo da Escritura: Ensina a temperança e a prudência e a justiça e a fortaleza, que é o mais útil que há na vida para os homens. Logo, pela penitência recuperamos todas as virtudes.
SOLUÇÃO. — Pela penitência, como dissemos, remitem-se os pecados. Ora, a remissão dos pecados não pode ser senão pela infusão da graça. Donde se conclui que pela penitência se nos infunde a graça. Ora, da graça resultam todas as virtudes gratuitas, assim como da essência da alma fluem todas as potências, conforme estabelecemos na Segunda Parte. Donde se conclui que pela penitência recuperamos todas as virtudes.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A penitência é a causa de recuperamos as virtudes do mesmo modo pelo qual é a causa da graça, como já dissemos. Ora, é causa da graça enquanto sacramento: pois, como virtude é, antes, efeito da graça. Por onde, não é necessário que a penitência, enquanto virtude, seja a causa de todas as outras virtudes; mas, que o hábito da penitência seja causado simultaneamente com os hábitos das outras virtudes pelo sacramento da penitência.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Os atos humanos constituem a matéria do sacramento da penitência; mas o princípio formal deste sacramento depende do poder das chaves. Por onde, o poder das chaves é o que causa efetivamente a graça e as virtudes; mas instrumentalmente. E o ato primeiro do penitente se comporta como disposição última para conseguir a graça, isto é, a contrição; ao passo que os outros atos consequentes à penitência já procedem da graça e das virtudes.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como dissemos, às vezes depois do primeiro ato da penitência, que é a contrição, permanecem certos resquícios dos pecados, isto é, disposições causadas pelos anteriores atos pecaminosos, donde resulta para o penitente uma certa dificuldade em praticar obras virtuosas. Mas, no concernente à inclinação mesma da caridade e das outras virtudes, o penitente pratica atos virtuosos com prazer e sem dificuldade. Assim, o homem virtuoso pode, por acidente, experimentar dificuldade na prática de atos virtuosos, por causa do sono ou de alguma disposição do corpo.